8.10.06

CORRUPÇÃO



Um dos temas da semana foi, sem dúvida, o da corrupção.
Em grande medida, reentrou, novamente, na ordem do dia da discussão política pela mão do PR que, no seu discurso do "5 de Outubro", pediu, designadamente, "o empenhamento de todos os portugueses no combate à doença que mina a democracia (a corrupção), e, em particular, aos detentores de cargos públicos e poderes judiciais, para que travem a batalha da moralização da vida pública (...)".
Em resumo, mais um discurso, em parte, redondo, a propósito da corrupção, referida como uma espécie de conceito geral e abstracto... .
É caso para se dizer, queirosianamente, que ele há coisas terríveis: o pauperismo, a prostituição e também...a corrupção!

###Sucede que seria importante esclarecer o conceito de corrupção. Haverá aquela que todos identificamos como sendo, antes de tudo, um caso de polícia, quer entre políticos, no seio das instituições e dos serviços públicos, nos municípios, no futebol, etc., etc., etc. Aquela em que alguém tira, directa e pessoalmente, partido do suborno, das "luvas", do "incentivo", dos favores prestados e cobrados. Com prejuízo visível e quantificável para a res publica.

Mas há também outras formas mais difusas de para-corrupção ou quase-corrupção. Aquelas que são sobretudo praticadas entre os "sargentos", nunca entre os "generais"!
Aquelas que até nem se traduzem necessariamente, de modo directo, em vantagens imediatas a favor de alguém, claramente ilícitas. Aquelas formas de corrupção ("corrupçãozinha") que são mais uma espécie de "simpatia intelectual", dificilmente susceptível de ser judicialmente provada. Aquela espécie de "jeitinho" que se faz até mesmo por simpatia, se bem que á espera de favores futuros; aquelas espécies de "cunhas" que se metem ou, mais do que isso, que se insinuam, simplesmente porque se é conhecido, amigo de alguém, de um dos "nossos"; a parcialidade clubística que ultrapassa os apitos de qualquer cor ... enfim, esse estado e essas práticas muito portuguesas de nos ajudarmos porque sim, porque é dos nossos, porque é conhecido, por deferência social, porque me farão também um favor, logo que precise!

Ora esta cultura da cunha que medra no défice generalizado de transparência que, a todos os níveis, existe na sociedade portuguesa (a começar pela gestão pública e política e pelo funcionamento das instituições do Estado), é, naturalmente, a base, o ponto de partida, para as outras formas mais assumidas e mediáticas de corrupção.

Por isso, será um pouco improfícuo pedir "a todos os portugueses" que se empenhem no combate contra a corrupção, porque o seu substrato (a tal cultura da "simpatia intelectual"), é ainda uma questão de mentalidade, um produto genuinamente português!

P.S. -. Hoje mesmo, António Barreto, na sua crónica dominical, no "Público" (link não disponível) abordou também - com muito mais mestria e com outro desenvolvimento - uma temática que acaba por ser parcialmente coincidente, seguindo, também, em sentido análogo...