5.3.04
O PAÍS DAS MARAVILHAS OU CUIDADO COM OS CÕES
Acabado de chegar à minha casa de fim-de-semana, no distrito de Aveiro, deparo-me, entre a correspondência acumulada, com uma soturna carta do Ministério da Agricultura, mais propriamente de uma coisa designada DRABL, que é a Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral.
Eu estivera em contacto com essa vetusta repartição há muitos meses atrás, a pretexto de dois cachorros que levara com a família de férias para o estrangeiro. A minha mãe não passa sem os cachoros, o miúdo (agora, os miúdos) gosta, a minha mulher não se importa e, por mim, a canzoada tem sempre lugar. Dito isto, não se imagina a burocracia que é necessário vencer para se levar connosco a bicharada: vacinas, documentos, carimbos, taxas e, tudo isto, tem um prazo limite de validade de dez dias. Findo esse período de tempo, tudo volta ao começo, não vão os bichos ter contraído novas e tenebrosas doenças.
A carta continha um ofício que dizia o seguinte:
«Levantamento de Sequestro - Quarentena: Informo V. Exª que, em virtude de nada de anormal se ter verificado durante a quarentena a que foi submetido o seu canídeo a partir desta data, fica sem efeito a notificação nº... de 03/07/2003, que lhe foi passada para manter o sequestro. Com os melhores cumprimentos, (fulano), Chefe de Divisão».
Ora, eu que pensava que um período de quarentena correspondia a quarenta dias sucessivos, acabei de perceber que, para a nossa Administração Pública, eles podem ser intercalados por várias semanas, ao ponto de atingirem oito meses. Como, também, descobri que levara ao estrangeiro apenas um e não dois animais de quatro patas (a quem pertenceria o raio do outro rafeiro?) e que, não obstante toda a papelada exibida à veterinária do aeroporto à entrada de Portugal, os cachorros tinham sido postos de quarentena, o que ignorei até ao dia de hoje. Da mesma forma que desconhecia que zelosos funcionários públicos os tinham mantido sob rigorosa observação ao longo deste tempo, de modo a terem-me garantido «nada se anormal se ter verificado».
Graças a Deus, ou ao Chefe de Divisão que assinou o ofício e cujo ordenado, em parte, é pago pelos meus canídeos, eles ficaram livres do poder público do Estado português, ao fim de oito meses de quarentena. Vou já abrir-lhes a porta de casa e deixá-los arejar.