Áreas temáticas prioritárias nos termos do nº1 do Artigo 12º do Regulamento para a Concessão de Licença Sabática (RCLS/ Despacho Normativo 31/98 de 17 de Abril) são:
A - Reorganização do Ensino Básico e Reforma do Ensino Secundário. Organização e Gestão Curricular, Prática Pedagógica e Didácticas Específicas; B - Avaliação do Processo de Ensino-Aprendizagem e do Sistema Educativo; C - Educação para a Cidadania e para os Desafios da Sociedade da Informação e do Conhecimento; D - Qualificação Profissional, Formação ao Longo da Vida e Empregabilidade; E - Modalidades Especiais de Educação e Reforma do Ensino Especial; F - Autonomia, Administração e Gestão dos Estabelecimentos de Educação e Ensino e Regime de Financiamento; G - Formação de Professores: Modelos e Estratégias; H - Estratégias de Combate ao Insucesso e ao Abandono Escolar.
Esta lista acompanhava este texto, recebido por e-mail, enviado por Gabriel Mithá Ribeiro. ###
NOTAS SOBRE O CONCURSO DE ATRIBUIÇÃO, PELO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, DE LICENÇAS SABÁTICAS PARA O ANO LECTIVO DE 2006-2007 A DOCENTES DO PRÉ-ESCOLAR, DO ENSINO BÁSICO E DO ENSINO SECUNDÁRIO (Julho de 2006)
O concurso interno do Ministério da Educação (ME) para a atribuição de licenças sabáticas (Despacho Normativo 31/98 de 17 de Abril) para o ano lectivo de 2006-2007, cujos candidatos são professores do pré-escolar, do ensino básico e do ensino secundário, suscita questões que devem ser publicamente esclarecidas o mais rapidamente possível.
Estão em causa decisões da Direcção Geral dos Recursos Humanos da Educação (DGRHE), cuja tutela compete ao Secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, directamente envolvido no processo de candidatura.
O Secretário de Estado em causa elaborou um despacho datado de 20.06.2006 que dava acordo a um parecer exarado na Infº nº 453/DSGRH/2006 de 19.06.2006, cujo teor é:
«Nos termos do artº 8.º do Regulamento para a Concessão da Licença Sabática foi definido para o ano escolar de 2006/2007, um contingente máximo de 130. A fim de clarificar os termos deste contingente máximo e, tendo presente o teor do despacho do Senhor Secretário de Estado sobre um processo similar, Equiparação a Bolseiro, sou de entendimento que dentro deste contingente sejam consideradas as seguintes situações:
1 - as candidaturas com classificação igual ou superior a 13,5 valores, inseridas nas áreas B, D, E e H, face à sua relevância para o sistema educativo;
2 - as candidaturas que sejam nas restantes áreas temáticas, A, C, F e G com classificação igual ou superior a 16 valores.
Na primeira situação integram-se 31 candidaturas e na segunda 40 candidaturas, perfazendo um total de 71.
À consideração superior
19.06.2006
Idalete Gonçalves
(Subdirectora-Geral)».
O concurso suscita as seguintes observações:
1) As licenças sabáticas para os docentes do ensino não superior visam, essencialmente, que os professores durante um ano lectivo estejam dispensados da actividade docente para concluírem ou preparem projectos de mestrado, doutoramento ou outras investigações. A actividade a realizar deve ser fundamentada no processo de candidatura e cabalmente justificada aos serviços do ME após o usufruto da licença sabática, sob pena de reposição dos salários auferidos durante esses 12 meses. Considerando que as dispensas anuais para serviço sindical (450) são muito superiores ao número de licenças sabáticas (130), também que as sabáticas constituem um meio importante no reforço da qualificação científica e académica do corpo docente do ensino não superior, e se é positivo que o actual governo regularize a relação entre o ME e os sindicatos (embora seja menos positivo que isso não se alargue a outros serviços), pelo que se constata com o concurso a licenças sabáticas para 2006-2007 não só não se reforçam as condições para a melhoria das competências do corpo docente, como há determinadas posturas que as enfraquecem.
2) As 326 candidaturas para o próximo ano lectivo (contendo formulário; curriculum vitae; projecto de formação pessoal; plano de trabalho; pareceres de orientadores/responsáveis académicos; comprovativos de instituições; outros comprovativos e mais documentação anexa) foram entregues até ao prazo limite de 31.12.2005 e a legislação obrigava a resposta da DGRHE no prazo de 90 dias. Contados apenas os dias úteis, a capacidade dos Serviços para proferir decisão prescreveu a 12.05.2006. Os despachos a que se reportam as decisões sobre o concurso, a saber, do Secretário de Estado da Educação e dos responsáveis da DGRHE que tutelam e decidem sobre o assunto, são datados de 19.06.2006, 20.06.2006 e 27.06.2006 (a última a data refere-se ao despacho do Director-Geral da DGRHE que comunicava aos candidatos a decisão de autorização e não autorização de licenças sabáticas). Deixaram-se prescrever prazos em mais de um mês.
3) Em Fevereiro último, por despacho do Secretário de Estado da Educação, foi estabelecido o limite máximo de 130 vagas para licenças sabáticas em 2006-2007.
4) Aquando das candidaturas as áreas temáticas definidas - A, B, C, D, E, F, G e H - em que os candidatos podiam apresentar as candidaturas foram apresentadas, sem excepções, como prioritárias. Foi em função dessa informação que os docentes que estavam em condições e interessados em se candidatar prepararam os seus projectos de candidatura.
5) Em Junho, tendo os serviços da DGRHE na sua posse a lista de 326 candidatos e as condições em que se apresentavam ao concurso, o Secretário de Estado da Educação, o Director-Geral e a Subdirectora-Geral da DGRHE decidiram introduzir ou anuir a um novo critério que distorcia grosseiramente o critério inicial (que considerava todas as áreas prioritárias em igualdade de circunstâncias): passaram a exigir 13,5 valores mínimos para as candidaturas das áreas prioritárias B, D, E e H e 16 valores mínimos para as áreas prioritárias A, C, F e G. Com o prazo prescrito, introduzindo regras da mais pura arbitrariedade a posteriori, foi com esse enquadramento que se tomaram as decisões sobre quais os docentes que iriam ou não beneficiar de licença sabática em 2006-2007.
6) Se estavam em causa correcções de opções ao nível da política de formação de professores, das duas uma: ou isso devia ser planificado antes da abertura do concurso como compete a uma administração responsável; ou, detectadas insuficiências em alguns domínios já com o concurso em andamento, a nova planificação valeria apenas para o concurso do ano seguinte. Não estavam em causa opções de formação para resultados instantâneos. O que imediatamente fica em causa é a concepção do Estado como entidade de bem.
7) O despacho do Secretário de Estado da Educação de 20.06.2006, bem como a Infº nº 453/DSGRH/2006 de 19.06.2006 e ainda o despacho do Director-Geral de 27.06.2006, indiciam violar princípios constitucionais de igualdade e do dever de imparcialidade da Administração Pública. Uma série de altos responsáveis do ME não parece ter dado por isso, nem parece que se tenha preocupado em esclarecer juridicamente a situação.
8) Entre a abertura oficial do concurso a 1 de Setembro de 2005; o prazo limite de entrega das candidaturas a 31 de Dezembro de 2005; e mais 90 dias para decidir, esses altos funcionários do ME tiveram todo o tempo do mundo. Estavam obrigados a fazer muito melhor. Nem sequer havia a desculpa da necessidade de decidir depressa como aconteceu com os exames de Química e Física em Julho. Parecem muito mais indícios de uma relação leviana com as normas da Administração Pública. Um poder com maioria absoluta jamais pode justificar tais práticas.
9) O modo de actuação do Secretário de Estado da Educação e dos responsáveis da DGRHE abre precedentes perigosos: 1º) a definição de regras para concursos públicos posterior à data limite de apresentação de candidaturas, quando os serviços já têm em sua posse a identidade dos candidatos e as condições em que se apresentam a concurso; 2º) se de hoje para amanhã um Secretário de Estado da Educação entender, passa a exigir uma nota para cada uma das oito áreas prioritárias (ou cria tantas quantas ele entender) e se numa delas estiver uma pessoa ou conjunto de pessoas que se suspeita que ele não gosta (como, por exemplo, alguém que critique o «sistema»), a atitude terá, inevitavelmente, contornos de acto persecutório; 3º) as candidaturas em causa a licença sabática são projectos e não produtos em áreas de investigação muito próximas, interdisciplinares e transdisciplinares: não é possível, por exemplo, garantir que um projecto da área «C - Educação para a cidadania e para os desafios da sociedade da informação e do conhecimento» (16 valores mínimos exigíveis para «discriminar negativamente») não resulte, uma vez implementado, numa consequência da área «H - Estratégias de combate ao insucesso e ao abandono escolar» (13,5 valores exigíveis para «discriminar positivamente»). Essa é também uma das razões sólidas que recomenda a adopção de critérios universais, aplicáveis a todas as candidaturas, como é próprio de um serviço da Administração Pública num Estado de Direito e Democrático.
10) No plano político, não se terá esquecido o Secretário de Estado da Educação da relevância da «sociedade da informação e do conhecimento» que tanto preocupa o Senhor Primeiro-Ministro? Não é também por aí que aponta a estratégia do Governo de combate à exclusão social? Ou será retórica que não terá entrado na cabeça de um «pragmático» membro do núcleo duro do Governo?
11) O Secretário de Estado da Educação e os responsáveis da DGRHE indiciam uma perigosa arbitrariedade para quem tem elevadas responsabilidades no Estado. Não se conhecem, na democracia portuguesa, tantos exemplos sucessivos de pouco cuidado e de pouca competência num único sector directamente dependente do Governo.
12) Uma norma da DGRHE que chega às escolas [cuja fonte não foi possível precisar, dado aparecer em documento avulso] refere «Autorizar a Licença Sabática aos candidatos que obtiveram classificação igual ou superior a 13,5 valores na apreciação do processo de candidatura, no pressuposto de assegurar o mérito do projecto de formação, atento o disposto nos parâmetros fixados no nº2 do Artigo 12.º, até ao limite de vagas do contingente a fixar para o próximo ano escolar». Havia várias candidaturas com classificação superior a 15 valores que nem sequer foram ponderadas pelos serviços da DGRHE, cujo Director-Geral não manifestou atenção a essa situação, pois obrigatoriamente, no âmbito das suas competências, estava certamente inteirado do que se passava.
13) "O Manual das condições de trabalho e da carreira do pessoal docente" elaborado pela actual equipa ministerial, actualizado a 24.05.2006, determina «Cabe ao Director-Geral dos Recursos Humanos da Educação autorizar os pedidos de licenças sabáticas até ao limite de vagas estabelecidas pelo contingente anual?» (Lisboa, DGRHE, 15.12.2005, p.35): 1º) foi definido um limite máximo de 130 vagas para 2006-2007; 2º) apenas 71 candidaturas obedeciam aos critérios estipulados (31 nas áreas B, D, E e H - 13,5 valores mínimos; 40 nas áreas A, C, F e G - 16 valores mínimos); 3º) ficaram por ocupar 59 vagas, isto é, pouco menos de metade das vagas para o concurso; 4º) existiam professores-candidatos em número suficiente e com condições legítimas para ocuparem as vagas de acordo com as regras existentes aquando da apresentação das candidaturas; 5º) por muito que existam conflitos entre as administrações e os funcionários públicos, conflitos de interesses próprios das democracias e que têm de obedecer a regras, cujo exemplo deve partir de quem tem poder de decisão, não é legítimo que se desconsidere desta maneira pessoas que, quase sempre, dão o melhor de si para servir os interesses do Estado. Mais a mais tratando-se de funcionários qualificados numa sociedade onde, infelizmente, essa é mais a excepção do que a regra.
14) Se o Director-Geral da DGRHE cumprisse com as suas obrigações, teria ao menos evitado que projectos de candidatura classificados entre 14,03 e 15,05 valores preterissem outros com classificação superior. Nesse intervalo de classificações, as 59 vagas que ficaram por ocupar praticamente resolveriam o problema da injustiça criada pelos próprios Serviços. Nem a isso o Director-Geral da DGRHE deu resposta, algo que não parece ter preocupado o Secretário de Estado da Educação. Era importante que o Director-Geral da DGRHE cumprisse com aquilo que ele próprio estipulou.
15) Será que a intenção era apenas a de anunciar um determinado número de vagas, simular que ficaram por ocupar quase metade, poupando no orçamento da pior maneira? Se assim é, trata-se de um sintoma preocupante de quem finge que reforma o Estado, mas não altera nada de essencial, recorrendo a truques de comunicação que julga eternamente eficazes. Assim é relativamente fácil o milagre de haver mais funcionários públicos com menos despesa: tendo muitos, mas desqualificando-os e desvalorizando-os socialmente. Por esta via, nem menos Estado, nem melhor Estado. Quem actua desse modo será o último a atirar aos outros a crítica dos cortes cegos na Administração Pública.
16) Note-se que a relação entre o número total de candidaturas (326) e o número máximo de vagas disponíveis (130) não constituía embaraço que justificasse um tão radical «aperto de critérios». O número de candidatos é, aliás, sintoma já de si preocupante do fraco investimento autónomo do corpo docente na sua qualificação, num grupo profissional que ascenderá a mais de 150 mil, salvo erro. Isso não parece preocupação na agenda política da Secretaria de Estado da Educação. Uma parte das candidaturas para 2006-2007, como obteve classificação inferior a 13,5 valores, ficava automaticamente excluída, como tem acontecido noutros anos. Tudo isso facilitava a tomada de decisões justas para os professores, pois permitia praticamente contemplar todos aqueles que apresentaram projectos de candidatura de nível «Bom». O problema de fundo parece ser a persistente, e já doentia, preocupação de achincalhar os professores.
17) Recorde-se que, num passado recente, o PSD, nomeadamente o seu ex-Ministro da Educação, David Justino, foi duramente criticado por questões relacionadas também com um concurso de professores. O ex-Ministro e o PSD foram democraticamente penalizados por isso. Mas a verdade é que, nessa altura, trataram-se de erros essencialmente técnicos da responsabilidade de uma entidade exterior ao ME. O próprio ME na altura fez o que estava ao seu alcance para corrigir os problemas e, com todas as dificuldades, introduziu melhorias de grande amplitude no concurso de professores, situação da qual resultaram claras melhorias administrativas de longo prazo. No caso da concessão de licenças sabáticas para o próximo ano lectivo de 2006-2007 tudo se passou no interior dos próprios Serviços do ME, envolvendo apenas e sobretudo cargos de natureza política ou directamente associados a ela, e num concurso, pelo número de candidatos e pelo que implicava, muitíssimo mais simples do que o concurso de professores para provimento dos lugares de docência nas escolas. Estamos a falar de uma diferença de pouco mais de 300 candidatos contra mais de 100.000.
18) Com todos estes erros no concurso para atribuição de licenças sabáticas para o ano lectivo de 2006-2007, o ME optou pelo salto tecnológico: a interposição de recurso hierárquico à Ministra da Educação pelos professores que se sintam lesados nos seus direitos pelas decisões do Secretário de Estado da Educação e da DGRHE é apenas por via electrónica (o que é de aplaudir), até ao dia 28 de Agosto, mas com um limite máximo de 5.600 caracteres e sem possibilidade de se recorrer a meios de contestação hierárquica não judiciais alternativos. Será que os responsáveis do ME se inteiraram da legalidade de mais essa decisão?