2.1.07

os meus votos para 2007

Agora que, ao que parece, decorreu já o tempo suficiente para a prescrição da validade do primeiro referendo sobre o aborto, não seria mal pensado, apelando a esse precedente, fazer o mesmo com o da regionalização. Na verdade, desde esse já longínquo ano de 1998, o mesmo do referendo ao aborto que se vai agora repetir, nada parece ter beneficiado a ideia então vencedora do Estado unitário e centralizado numa capital política e administrativa. Pelo contrário, o país perdeu, na generalidade, poder, e, com excepção de Lisboa, o produto interno das grandes cidades portuguesas tem vindo a diminuir. O facto da capital continuar a ser o centro político e administrativo do país, tem resultado numa concentração excessiva de recursos e de pessoas na cidade, muito para além das suas próprias capacidades naturais, prejudicando-a a prazo, em vez de a beneficiar. Por outro lado, isso provocou a desertificação das soit disant elites (embirro com o termo e com o seu habitualmente pretendido significado) nacionais, já que quem quer ascender em Portugal tem, quase inevitavelmente, que ir parar a Lisboa, ou passar longos períodos de tempo por lá. Tome-se por exemplo a cidade do Porto, centro histórico de protagonistas social e politicamente influentes, e veja-se quem nos últimos trinta anos teve, na cidade, um projecto de poder local, ainda que módico.Talvez Fernando Gomes, Pinto da Costa, Valentim Loureiro, Narciso Miranda, Vieira de Carvalho e, francamente, não me vem mais nenhum à cabeça. O balanço, convenhamos, não é exactamente brilhante e as novas «elites» da cidade não se conseguem vislumbrar, nem à lupa. Como o poder está em Lisboa, as «elites» portuenses pelam-se por ter um lugar, como dizem, na «Assembleia», um apartamento na «Linha» e uma namorada loira platinada, às quintas, na «Kapital». A regionalização seria, por isso, um bom argumento para obrigar os portugueses a repensarem o país e a repensarem-se a si mesmos. Se o termo for politicamente inconveniente, arranje-se outro. Por exemplo, autonomizar ou federalizar o país. Bem sei que não temos, em Portugal, uma tradição federalista, mas, como dizia o outro, «a tradição já não é o que era». Se nos conseguíssemos ver livres das nossas mais recentes tradições políticas, éramos capazes de sair todos a ganhar.