8.3.04

REGRESSO AO PASSADO - PARTE II



É difícil conseguir, num só dia, escrever duas postas com o mesmo nome e logo com o nome destas. Mas, a sessão de espíritismo político que foi o lançamento do II volume (e último, por enquanto...) das memórias de Cavaco, não me permite outra saída.

Deixando de lado questões de importância secundária, no essencial a sessão permitiu tirar duas conclusões:
1ª - O homem está mortinho por voltar à política e, em rigor, já voltou. Se é por vício, vaidade, necessidade ou, pior hipótese, por estar convencido que faz mesmo falta ao país e que tem ainda uma missão histórica a cumprir, não sei. Agora, que é por demais evidente que, desta vez, «nem que Cristo desça à Terra», ele será candidato a Belém, lá isso, julgo que já ninguém duvida;
2ª Ele está igualzinho ao que era há dez anos: nos tiques, na voz autoritária e imperativa, na convicção de que é um estadista de primeira apanha a quem o país tanto deve, e até na estafada técnica do tabu que faz gala em manter e que nos seus últimos anos do seu governo se tornou insuportável.

Em face de tanta disponibilidade, algum PSD está radiante, o Dr. Monteiro dá pulos de corça, o Dr. Soares anda feliz e satisfeito, enquanto que os Drs. Barroso e Portas não sabem exactamente o que fazer à vida. O Presidente da Câmara de Lisboa, esse, há-de ter entrado em profunda depressão política. Nada que um cruzeiro pelas Caraíbas, de lenço vermelho na testa, não seja capaz de curar.

A situação é, porém politicamente mais alarmante do que parece, pelo menos para os partidos da coligação governamental. É que, o Dr. Cavaco que os porugueses conhecem e que algum PSD tanto ambiciona ver regressar, não é um homem equidistante e contemplativo, sensível a uma função de equilíbrio institucional e de exercício do poder moderador, características que devem imperar no modelo constitucional actual para o inquilino do Palácio de Belém. O Dr. Cavaco foi, é e será sempre, o «homem da Figueira», o D. Sebastião social-democrata, que há-de surgir do nevoeiro para «pôr o país na ordem». Não quer ser, naturalmente, um Presidente de um regime parlamentar, mas, pelo menos, de um sistema semipresidencialista. A nossa Constituição, como é sabido, bem o permite e a autoridade que tem sobre o «povo laranja» fará o resto. Por isso, Barroso acha que ainda é cedo para se pronunciar sobre o homem de quem, durante anos, foi o delfim e Portas anda mudo e calado.
Já o Dr. Soares, que sabe bem que o Dr. Cavaco em Belém fará mais pelo Partido Socialista, num ano, do que o Engº Guterres faria, se lá chegasse, em dez, anda contente. Ele conseguirá vingar, duma só penada, as insolências de Guterres, Portas e Santana. Como todos iremos assistir.