6.3.04

AZIMUTES DA ALMA

Tive uma boa tarde na Foz, hoje, dia bonito e de sol que se pôs. A neura de ontem já se compôs um bocadinho e, nem o facto de ter passado à porta do velhinho Twin's (que saudades) a ouvir uma canção charoposa do Ronan Keating (o rapaz é foleirote, mas não canta mal) me pôs outra vez down.
Sentei-me à frente do computador e, não resisti, lá visitei o Blasfémias. Os rapazes têm andado inactivos. Quem tem famílias tem obrigações e nem sempre se passa os trinta (infelizmente), como é o meu caso, sem essas obrigações. A vida, por vezes, parece-me vazia e, à falta de melhor, este espaço pode compensar muitas ausências.

A caixa de mensagens não estava muito cheia (qual é a mulher que não adora ter muitas mensagens à sua espera!?). Mas sempre lá havia uma do meu querido colega blasfemo LR, a avisar-me que um blogue que eu ainda não conhecia (sou novata nestas coisas), me «desfazia de alto a baixo». O dito blogue é o Azimutes e Inês é quem o escreve.

Li, li atentamente, e meditei naquilo que ela me quis dizer. Em primeiro lugar, querido LR, é preciso não compreender nada da natureza feminina para se concluir que o que a Inês disse sobre mim foi «desancar-me». A Inês (permita-me que a trate assim) é uma pessoa sensível, feminina, muito feminina, preocupada com o sofrimento dos outros e, deixe-me dizer-lho, com o dela também. Achei o tom geral da sua escrita, muito boa por sinal, um pouco sofredor. Não será por acaso que ela refere Freud e Lakan e as suas teorias sobre o prazer que, por vezes, o sofrimento nos trás. Como achei, também, um pouco tristes os comentários que fez à nossa Charlotte, quando diz: «não gostaria que a senhora soubesse sequer que este blog existe, contudo sei que o lê».

Acho, minha cara Inês, que não há necessidade de utilizarmos tanto «peso existencial» no que escrevemos nos nossos blogues. Este é, na minha opinião, um meio que nos pode ajudar a esquecer um pouco os problemas do dia-a-dia e, porque não, para trocarmos civilizadamente, uns com os outros, pontos de vista e opiniões. Sem que isso constitua um drama, um conflito, uma tragédia, no caso de nem sempre estarmos, como você diz, «do mesmo lado». Por isso, fiquei um bocadinho ferida quando a vi dizer que eu atiraria pedras fosse a quem fosse, e que queria incutir problemas de consciência nos outros, sobre a questão do aborto. Nunca tal me passou pelo espírito e, creia-me, não é essa a minha forma de estar na vida. O drama do aborto é suficientemente forte e imenso para nele não existirem «lados». Nem contra nem a favor. Disseram-no, com clareza assustadora o António Filipe (PCP) e o Fernando Rosas (BE) (não, não são das minhas simpatias políticas) no debate televisivo da RTP com o Pires de Lima (que fraca figura!...): ninguém está a favor do aborto! O que se trata é de saber como lidar com as mulheres que já o fizeram ou que o farão inevitavelmente, quer o Estado proíba ou autorize! Essa é, para mim, a questão.

Posto isto, cara Inês, acho que devemos aproveitar a sua sugestão de nos conhecermos e trocarmos «de forma lúcida e serena», como quase sempre o fazem as mulheres, algumas ideias. Quem sabe, um destes dias.