28.2.07

Liberdade ordenada


Uma vez eleito, o Papa exerce as suas funções de forma vitalícia e com um poder absoluto sobre a hierarquia da Igreja, sem estar sujeito a qualquer controlo, nem mesmo do colégio de cardeais que o elegeu. O poder do Papa é um "poder pleno, supremo e universal, que pode sempre livremente exercer" (Catecismo: 878). Não existe, e provavelmente nunca existiu, uma instituição que reconheça ao seu líder uma autoridade tão extraordinária como a Igreja Católica reconhece ao Papa. Na minha opinião, reside aqui um dos mais importantes segredos da sua longevidade milenar e do seu sucesso civilizacional. ###
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Não estando sujeito a nenhum controlo e não tendo de prestar contas a ninguém, dir-se-ia que o Papa reune todas as condições para se tornar um tirano. A verdade, porém, é que os tiranos foram a excepção na história da Igreja, não a regra. Na realidade, não estando o seu poder ameaçado por ninguém, o Papa pode dar liberdade plena a todos aqueles que, sob a sua autoridade, servem a Igreja - desde que essa liberdade não seja utilizada para abalar os alicerces da Igreja, de que ele é o guardião supremo.
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Ainda assim, dir-se-à, nada impediria o Papa de se tornar um tirano para com todos os homens que servem a Igreja. Tal não acontece porque só na aparência o Papa não está submetido ao controlo de ninguém e não presta contas a ninguém. Na realidade, ele presta contas a alguém, só que esse alguém não é deste mundo. Ele presta contas a Deus. E Deus não aprovaria que ele utilizasse o seu poder para oprimir os homens, em lugar de o libertar.
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A enorme liberdade de que goza o clero da Igreja Católica - e que permitiu à Igreja sobreviver a todas as dissidências - é uma consequência directa da autoridade absoluta do Papa. E esta autoridade torna-se o instrumento indispensável à liberdade - não uma liberdade qualquer, mas uma liberdade ordenada que permite tudo, excepto a destruição (da Casa de Deus).
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Resulta também do exposto que esta liberdade ordenada - a única que é valiosa, porque é uma liberdade não-destrutiva - não pode nunca existir sem um profundo sentimento religioso porque é este sentimento que permite retirar o Papa do controlo dos homens e pô-lo sob o controlo de Deus. Por isso, eu estou hoje muito convencido de que a verdadeira liberdade - a liberdade ordenada - nunca poderá prevalecer numa população constituída predominantemente por ateus e agnósticos.
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Sem o sentimento religioso, o Papa ficaria sujeito ao controlo dos homens, e não de Deus - por exemplo, do colégio de cardeais que o elegeu. E as ambições humanas rapidamente levariam cada um dos seus membros a ambicionar o lugar do Papa, desencadeando a intriga e a luta pelo poder que mais cedo ou mais tarde teriam convertido a Igreja no exemplo acabado da opressão - e que, há muito, teriam ditado a sua extinção.
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Por isso, liberdade - no sentido de liberdade ordenada ou não-destrutiva -, não existe sem autoridade. E a autoridade não existe sem religiosidade.

o partido não tem ementa!

Uma sugestão ao Dr. Portas, para a declaração de amanhã, atendendo à escassez que deve sentir-se pelo Caldas, em substituição do clássico «o partido não tem emenda».

Fumar sem inalar

Dentro da recente escola de pensamento do «crime sem pena» iniciada por MRS, agora o bastonário da Ordem dos Advogados lança a «suspensão de prazos que-não-é- férias».###

Aproveitando a genial inspiração dos Gatos, poderemos imaginar o seguinte diálogo, em hipotético vídeo explicativo:

- Então a suspensão dos prazos são férias?
- Não.
- Mas posso ir de férias?
- Pode
- Mas se os prazos estão suspensos, o que acontece?
- Nada.
- Mas não são férias?
- Não.
- Isso não é um bocadinho a mesma coisa?
- É.
- Mas porque não se diz então que são férias?
- Não pode.
- Mas há um suspensão?
- Há.
- Suspensão durante a qual nada acontece?
- Sim.
- E posso ir de férias.
- Pode.
- Mas não são férias?
- Não.
- Obrigado.

o «blasfémias» não faz hoje anos

O «Blasfémias» nasceu num ano bissexto, exactamente no dia 29 de Fevereiro de 2004, com um «post» de apresentação assinado pela Sara Muller (Sarita, onde andas tu, rapariga?). Ao contrário do que poderia pensar-se, não faz hoje anos, acontecimento que só ocorrerá no próximo ano. Mantemos, assim, ao invés dos nossos concorrentes, uma invejável e praticamente inesgotável juventude. Para evitar equívocos, aqui fica feito o aviso.

o partido ainda tem emenda? (act.)

Afinal, só o saberemos amanhã, às 20.00h. Qualquer actualização deste emocionante acontecimento, de desfecho imprevisível, será imediatamente aqui relatada.

poder pleno, supremo, universal e livre



"Em virtude do seu cargo de vigário de Cristo e pastor de toda a Igreja, o pontífice romano tem sobre a mesma Igreja um poder pleno, supremo e universal, que pode sempre livremente exercer"
(Catecismo da Igreja Católica: 878)
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Eu tenho apreciado o esforço que o João Miranda tem vindo a desenvolver com vista a uma teoria sobre a autoridade, especialmente no último post. Porém, segundo a sua tese, os Papas da Igreja Católica seriam os candidatos, por excelência, a tiranos.###
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Eu sou contemporâneo de, pelo menos, cinco Papas da Igreja. Nunca, no meu conhecimento, algum dos membros do clero sobre os quais o Papa exerce uma autoridade directa - e eles são às centenas de milhar -, nem sequer algum dos crentes católicos, sobre os quais o Papa exerce uma autoridade indirecta - e estes são aos milhões - acusou o Papa de ser um tirano.
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Alguma coisa falha na tese do João Miranda, e eu julgo saber o que é. A tese dele conduz, de facto, à tirania, mas não à tirania de um homem sobre os demais; conduz à tirania da multidão sobre cada homem.

Pedir mais autoridade é o caminho mais curto para a tirania

Nenhum sistema público pode funcionar bem sem um bom sistema de selecção e controlo dos dirigentes e funcionarios. E um bom sistema de controlo nunca pode ser gerido por aqueles que é suposto controlar. Nunca pode funcionar em pirâmide porque o topo da pirâmide nunca é controlado mas é o ponto que mais vulnerável e que mais necessita de controlo. É o ponto cujos erros têm as piores consequências mas é também o ponto que não precisa de dar satisfações a ninguém. É por isso extraordinário que quando um sistema piramidal de controlo e selecção produz maus resultados se peça "autoridade". Até porque o que na realidade o que se está a pedir é que se dê mais poder a quem está nos lugares mais elevados da pirâmide, fora de qualquer controlo, e não foi capaz de conquistar autoridade pelos seus méritos próprios. Note-se que, enquanto um incompetente sem poder é apenas um incompetente sem autoridade, um incompetente com poder é um tirano incompetente e sem autoridade.

o partido ainda tem emenda?

Logo à noite, pelas 20.00h, saberá, de novo, a resposta.

A grande questão da "autoridade do professor"

Esta diferença entre direita tradicional e liberalismo também ocorre nas ideias que cada uma das correntes tem para o ensino. A direita tradicional acredita que o principal problema do ensino é a falta de autoridade do professor. Para resolver este problema propõe a pior de todas as soluções. Confunde autoridade com poder e propõe-se dar poder aos professores pensando que assim lhes dá autoridade. Ora, como nesta questão a distinção importante não é entre professores com autoridade e professores com falta dela mas entre bons e maus professores, a solução tenderá a agravar o problema. Isto porque um mau professor com poder fica pior e um bom professor com poder fica igual. Um mau professor com poder não é respeitado por lhe ser reconhecida autoridade, é respeitado porque os alunos têm medo dele. Note-se que um idiota com poder continua a ser um idiota, mas é um idiota mais perigoso. Por outro lado, um bom professor verá a sua autoridade ser reconhecida desde que exista liberdade de escolha no sistema.
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A solução liberal é muito mais subtil. Os liberais não alegam saber qual é o problema do ensino, mas isso também não os impede de propor uma solução porque seja qual for o problema, a solução tem que passar pela liberdade de escolha. O problema da autoridade do professores não se resolve dando indiscriminadamente poder a todos os professores, resolve-se se os professores e as escolas tiverem que competir uns com os outros pelos alunos. Desta forma garante-se que só será reconhecido como autoridade quem de facto o merecer.

A maca*

O PSD e o PS, com o apoio e incentivo dos estatistas PCP e BE e do caritativo-beato CDS/PP, transformaram os portugueses de um povo abandonado pela ditadura num povo assistencializado na democracia. Não admira que as populações se revoltem quando lhes fecham as urgências: é a maca e não a liberdade, a competência ou a iniciativa que associam ao desenvolvimento e à democracia.###
Na verdade, o que todos os portugueses queriam era literalmente chegar à Madeira. Um local onde dinheiros públicos vindos não se sabe donde, mas aos quais se tem um inalienável direito, sustentem um modo de vida acima das possibilidades. Por ironia é na Madeira que vigora o que de mais próximo do estado social existe em Portugal. Como bem se vê o modelo é imbatível desde que, algures, uns mouros, o sustentem. O nosso problema, aqui no continente, é não arranjarmos uns mouros a quem acusemos de colonialistas e que, para evitarem tal opróbrio e destempero, nos passem uns cheques. Na Madeira, Alberto João ainda tem margem para se demitir. No continente já nem isso. Dos quatro últimos primeiros-ministros dois optaram por largar o barco a meio do mandato. O terceiro foi demitido num repente presidencial que não sendo democraticamente claro teve pelo menos o mérito de pôr fim àquela agonia. E o quarto e último apenas ganha nas conferências de imprensa. Ou seja, na apresentação teórica de planos e na aprovação de decretos que impõem cartões únicos, alvarás e listas disto e daquilo. Mas, tal como os anteriores primeiros-ministros, também Sócrates vê bloqueadas todas as iniciativas de reforma que, mesmo por linhas tortas, nos levassem a questionar o nosso modo de vida.
Não é por coincidência que os ministros que ontem eram dinâmicos se tornam hoje em figuras embaraçosas – a propósito o que é feito de Lurdes Rodrigues? – e que as estrelas das notícias não são executivas mas sim fiscalizadoras, como o director-geral de Impostos e os inspectores da ASAE. Quando não se pode governar, fiscaliza-se.

*Adaptado do PÚBLICO, 27 de Fevereiro

A desordem gera déspotas esclarecidos?

Na questão da autoridade, a diferença entre o liberalismo e a direita tradicional é que enquanto a direita tradicional acredita que sem autoridade não há nem liberdade nem ordem, o liberalismo pergunta como é possível que a desordem e a coerção possam gerar autoridades iluminadas capazes de criar ordem e liberdade. Milagre.

Parabéns

A Ciência do Aquecimento Global ganhou um Óscar.

Influência

Parece que a nova lei do aborto foi feita por acordo entre o PS, o PCP e o Bloco de Esquerda. Oooppss!!! A não-esquerda que votou SIM ficou de fora ... Serviu para ganhar os votos mas não serve para fazer leis.

O segredo está na penicilina

A performance económica do Estado Novo não pode ser comparada com a da democracia sem que se controle o efeito da estrutura demográfica das duas épocas. Ao contrário do que acontecia na década de 60, actualmente a população com mais de 65 anos representa uma fracção significativa da população e vive confortavelmente da delapidação da poupança "acumulada". Temos muito mais pessoas que desempenham exclusivamente o papel de consumidores e menos pessoas a desempenhar o papel de produtores de riqueza.

Há quem lhe chame estratégia


A estratégia ministerial de oferecer compensações a quem perde os SAP sem ser contemplado com uma urgência básica é francamente bem sucedida, como ficou patente pelos testemunhos de alguns presidentes de câmara municipal. Para os recalcitrantes ficou a alternativa: ou entram em negociações e obtêm alguma contrapartida, ou prosseguem a contestação e ficam sem nada...(Vital Moreira)

não é flôr que se cheire


Quando, recentemente, elaborei uma série de posts sobre o Estado Novo, e procurei documentar a supremacia da sua performance económica, eu tinha em vista salientar que alguns dos princípios económicos em que assentou o Estado Novo representam regras permanentes e eternas de boa gestão económica e social - e que podem igualmente ser praticadas em democracia.
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E, quando, hoje, alarguei o âmbito dos meus posts ao período do Liberalismo, eu pretendi ilustrar que o liberalismo português, tal como foi praticado no século XIX, não é flôr que se cheire. Na realidade, ele representa, nos dois últimos séculos, o período em que Portugal mais se atrasou em relação à Europa.###
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E eu fiz tudo isto, porque estou convencido que Portugal está à beira de viver a maior recessão económica de que há memória desde a década de 70. Os primeiros sinais - se é que não há já outros, como a enorme subida do desemprego nos últimos meses - podem ter sido dados hoje.
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A Bolsa de Nova Iorque caíu hoje como já não caía há quase seis anos, desde Setembro de 2001. E as Bolsas europeias foram atrás. A queda foi desencadeada na China, cuja Bolsa desceu 9% em resultado de notícias que sugerem um abrandamento significativo do crescimento da economia chinesa. Ao mesmo tempo, o ex-Presidente da Reserva Federal americana, Alan Greenspan, veio dizer em público que prevê para o final do ano uma recessão nos EUA.
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As recessões, hoje em dia - em resultado da globalização dos mercados -, tendem a ser globais, e sendo desencadeadas simultaneamente pelos EUA e pela China, então, é certo que ninguém lhes escapa. Portugal, certamente, não vai escapar. E o problema é que Portugal não tem nenhuma capacidade para amortecer uma recessão importada, que venha juntar-se a uma recessão que já existe internamente e que dura há, pelo menos, seis anos (o crescimento médio da economia portuguesa tem sido de 0.5% ao ano, quando um crescimento normal teria sido de 3%).
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Sem a política cambial e sem a política monetária, que desapareceram com o euro, a única possibilidade para amortecer a recessão seria a política orçamental, reduzindo os impostos ou aumentando a despesa pública. Porém, com uma despesa pública que já representa quase metade da economia nacional, e sob grande pressão da UE para reduzir o défice orçamental - redução que implica o aumento dos impostos e a redução da despesa pública - o país apanhará com as duas recessões em cima, sem qualquer possibilidade de reagir.
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Os subsídios que Portugal recebeu ao longo dos últimos vinte anos tinham em vista aproximar o nível de vida dos portugueses à média europeia, ao mesmo tempo que permitiriam conter as despesas públicas por forma a deixar uma folga que pudesse servir de amortecedor, em caso de uma recessão. Não só não houve qualquer progresso na aproximação do país à média comunitária, como as despesas públicas não deixaram de aumentar a ponto de atingirem 48% do PIB em 2005.
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Apesar dos esforços meritórios deste Governo, os resultados - se forem conseguidos, o que é pouco provável - serão marginais, colocando a despesa pública em 46.3% do PIB em 2006 e 45.4% em 2007. E é pouco provável porque, numa recessão, os impostos tendem a cair face às previsões orçamentais e as despesas tendem a aumentar - especialmente as despesas sociais, como os subsídios de desemprego.
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Estaremos nós preparados para lidar com a crise económica e social que, na minha opinião, está em vias de acontecer? A minha resposta é, claramente, não. Pois se nós não conseguimos sequer lidar com o passado, reconhecendo, por exemplo, as soluções económicas do Estado Novo ou os erros económicos e sociais (principalmente, estes) do Liberalismo, como é que vamos ser capazes de lidar com o presente e, sobretudo, com o futuro?
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E não vale sequer a pena remeter a culpa para o Estado e para os governantes, desculpando amavelmente a chamada sociedade civil. Porque, numa democracia, os governantes - todos os governantes, deste governo e dos governos anteriores - são uma emanação da sociedade civil.

27.2.07

Notas Soltas depois de Alguns Minutos na Blogosfera.

1. "Os tempos hoje são outros: os liberais já reconhecem que devem ser tolerantes e que precisam de ser religiosos". Os tempos hoje são outros: a relação entre tolerância e religião precisa de um novo vigor. E há religiões e religiões.

2. Ser liberal também é, primeiro que tudo, não impor a outros as nossas normas de conduta e os nossos valores morais. A esquerda não sabe fazê-lo. As ditaduras, por mais benignas que nos pareçam, também não.

3. 48 anos de Estado Novo e chegamos ao 25 de Abril com o país mais pobre e mais retrógrado da Europa Ocidental. Bastaram 20 para a Irlanda se tornar num dos países mais ricos da UE.

4. O que é que o liberalismo tem a ver com a refundação da direita? A direita é liberal?

5. O Insurgente faz 2 anos. É o outro blogue que abro todos os dias, quando ligo o computador.

6. José Afonso era mesmo assim tão bom. Provavelmente o melhor de sempre. Politicamente, era indigente. Mas isso é outra música.

dois anos insurgentes

O Insurgente faz hoje dois anos. Dois anos na blogosfera é muito tempo, e O Insurgente está, ao fim dessa eternidade, cheio de vitalidade. Nele colaboram vinte e duas pessoas, o que faz dele, segundo creio, o maior colectivo da blogosfera portuguesa (no 31 da Armada só são vinte e um...). Pelo menos, da blogosfera liberal é-o certamente, demonstrando, assim, que, às vezes, o «colectivismo» e o liberalismo conseguem conviver. Demonstram, também, nestes dois anos de idade, que um blogue pode crescer para além dos limites da normalidade, sem explodir ou implodir. Parabéns a todos, camaradas e, já agora, até à manhã, como dizia o outro.

O douto Parecer (do não menos douto Magistrado)

Atente-se no extraordinário, mas deveras sintomático, parecer do digníssimo magistrado do Ministério Público:
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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:04608/04 - VISEU
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/08/2007
Relator:Moisés Rodrigues
Descritores:OMISSÃO/EXCESSO DE PRONÚNCIA – RECLAMAÇÃO COMISSÃO REVISÃO – CONDIÇÃO IMPUGNABILIDADE
Sumário:I - Nos termos dos artigos 668.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil e 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário, a sentença ou acórdão, em suma, a decisão, é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar, ou conhece questão de que não podia tomar conhecimento, o que está em correspondência directa com o dever e a proibição que lhe são impostos – cfr. art. 660.º, n.º 2 daquele primeiro diploma legal -, de resolver todas as questões que tiverem sido submetidas à sua apreciação, exceptuadas apenas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e de se ocupar de questões que as partes não tenham suscitado, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso.
II - Pese embora a impugnação com fundamento em erro na quantificação da matéria tributável esteja dependente do prévio pedido de revisão, o certo é que essa condição de impugnabilidade já não funciona se na impugnação, como no caso sub judice, forem invocados outros fundamentos que não aquele.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte

I
Entrac , Ldª (adiante Recorrente), pessoa colectiva nº , não se conformando com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou procedente uma excepção dilatória e, em consequência, absolveu desta instância de impugnação judicial a entidade impugnada, dela veio recorrer, concluindo, em sede de alegações:
a) A sentença é nula, porquanto não conheceu das seguintes questões, que a recorrente alegou:
a. A decisão para alterar o método directo, para o indirecto, conforme Art.° 51° do CIRC;
b. A inconstitucionalidade do Art.° 41°, n.° 2, do CIRC, ao Art.° 104°, n.° 2, da CRP;
c. A errónea quantificação dos juros compensatórios, nos termos do Art.° 80° do CIRC.
b) A sentença é nula, porquanto se excede na questão, da errónea quantificação, abrangida pelo Art.° 84° do CPT, que a recorrente não alegou.
Nestes termos; Deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que elimine o indeferimento liminar e que aprecie os vícios e erros alegados, com efeitos na anulação da liquidação impugnada e com todas as consequências legais, para que assim se faça JUSTIÇA.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O magistrado do Mº Público neste TCAN emitiu o seguinte parecer: “Esgotando-se hoje o prazo para o MP emitir parecer e passando já das 18 horas, abstenho-me de o fazer.”

Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.
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conflito e cooperação

1. O Estado com que Thomas Hobbes sonhou, baseado num poder tão forte quanto a agressividade e a conflitualidade humana, a seu ver, exigiam para as domesticar, existiu e teve expressão histórica nos regimes do despotismo esclarecido. Se, como pensava, a sociedade se encontra numa permanente guerra de «todos contra todos», então só um poder superior ainda mais forte e, se necessário, mais violento do que essa violência social poderia impor ordem e garantir a vida aos cidadãos. Dos vários despotismos esclarecidos que dominaram a Europa setencentista e oitocentista, resultariam as reacções revolucionárias do fim desse ciclo, que ficaram historicamente conhecidas, nem sempre com rigorosa exactidão, como «revoluções liberais».###
2. Por sua vez, o «bom-selvagem» de Jean-Jacques Rousseau possuía somente uma dimensão inicial e simbólica, quase bíblica, à semelhança do Adão e da Eva do Paraíso, anteriores ao pecado original que lhes haveria de conferir dimensão social e verdadeiramente humana. Se a vida social desgraça a bondade natural do homem, há que discipliná-la. No caso, através de um poder soberano ilimitado, produto da adição inevitável e paradoxalmente indestrutível, das soberanias individuais. Bem vistas as coisas, nem os pressupostos, menos ainda os resultados, do que pensam Hobbes e Rousseau são muito distintos. Diria, até, que são exactamente iguais.

3. Ora, conceber a vida social como um permanente estado de conflitualidade é um equívoco perigoso. Pelo menos, é-o do ponto de vista liberal, já que o liberalismo assenta na convicção de que o princípio da cooperação racional entre os indivíduos prevalece sobre as suas naturais desavenças. Por essa razão, os liberais preferem a liberdade contratual ao dirigismo estatista, a livre escolha individual à intervenção dos poderes públicos.

4. Da observação científica, nomeadamente aquela a que procederam os etólogos que estudam o comportamento animal, nele se incluindo o comportamento humano, como Lorenz e Eibesfeldt, a racionalidade e a cooperação existem a par da agressividade natural, sendo ambas importantes pulsões sociais. Segundo a perspectiva do consumidor racional, os homens, na sua generalidade, preferem o que lhes é mais vantajoso àquilo que lhes pode trazer mais prejuízo. Desse modo, o conflito traz mais inconvenientes do que a paz, e a dissenção mais prejuízo do que um acordo. Não por acaso, é voz corrente de que vale mãos um mau acordo do que uma boa guerra. O equilíbrio ameaçador da guerra-fria demonstrou-o bem durante muitas décadas.

5. A este propósito, John Locke distinguia o «estado de natureza» do «estado de guerra», considerando este último como uma excepção ao primeiro. Obviamente, como as excepções têm de ser consideradas, os homens abdicaram do seu «estado de natureza» para as tentar eliminar, ou reduzir ao mínimo possível. Daí resultaram um conjunto de poderes públicos, entre eles, e sobretudo, o poder dos magistrados que administram o direito e a justiça, corporizados sob a forma de uma organização política à qual, por conveniência, poderemos denominar por «Estado».

6. Se, de facto, por este último conceito entendermos a organização política da sociedade, ele encontra-se presente em todas as comunidades humanas ao longo da história. Varia na forma, na extensão das funções e competências, e no exercício dos poderes, mas, no essencial – a proclamação de poderes públicos organizados, é constante. Os períodos de excepção em que os poderes públicos são afectados ao ponto de atingirem a quase inexistência, não correspondem a momentos da normal vida em sociedade, mas a estados de guerra quase sempre provocados pelos poderes públicos e não por indivíduos despojados de imperium.

7. Sendo, assim, absolutamente certo que se um indivíduo pode oferecer perigo para a sociedade, subscrevendo parcialmente a perspectiva hobbesiana, então, se esse indivíduo estiver munido de poder público, o perigo que poderá constituir poderá ser infinitamente maior. Efectivamente, se os tribunais estão cheios de criminosos, a História não o estará menos. Os efeitos e as consequências dos actos de uns e de outros é que são incomensuravelmente distintos. Por isso, o liberalismo pugna por um Estado mínimo: por não confiar absolutamente na bondade humana, menos ainda quando ela pode assumir facetas particularmente desagradáveis em função do poder que lhe está confiado.

8. Mínimo, mas Estado, de facto. Ou, se o nome for particularmente incomodativo, digamos antes que o liberalismo não prescinde de uma organização política da sociedade, tão controlada quanto a própria sociedade for capaz de a controlar.

Decisões políticas com consequências a longo prazo

Estão de parabéns os 3 (três) senhorios que conseguiram descongelar as casas que tinham alugadas.

Grandes liberais, grandes desiludidos


Almeida Garrett:
"O chamado liberalismo reduz-se a duas coisas: duvidar e destruir por princípio, adquirir e enriquecer por fim; é uma seita toda material em que a carne domina e o espírito serve; tem uma força para o mal; bem verdadeiro, real e perdurável, não o pode fazer. Curar com uma revolução liberal um país estragado (...) é sangrar um tísico (...)" (Frei Dinis, Viagens na Minha Terra)
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Alexandre Herculano:
"O sonho da liberdade, o sonho da minha juventude, esta fonte de poesia e acções generosas, converteu-se para mim num pesadelo cansado."
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Ainda Garrett, procurando serenar a população, depois de um violento surto de intolerância religiosa e anti-clericalismo radical:
"(...) Os tempos hoje são outros: os liberais já reconhecem que devem ser tolerantes e que precisam de ser religiosos. A religião de Cristo é a mãe da liberdade, a religião do patriotismo a sua companheira. O que não respeita os templos (...) é um mau inimigo da liberdade, desonra-a, deixa-a em desamparo (...)".

O mito do país rural (1930-70)

Percentagem da Agricultura no PIB:

1930: 30%
1940: 29%
1950: 31%
1960: 20%
1970: 12%

Portugal: inflação (1836-2007)

A taxa média de inflação anual para diferentes períodos da história portuguesa dos últimos 170 anos foi a seguinte:
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1836-50.......1851-90.......1891-1910.......1911-25.......1926-73.......1974-2007
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-1.0%............1.1%...............0.4%...........23.8%...........2.4%.............11.2%
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O século XIX foi um período de relativa estabilidade dos preços. A primeira grande inflação da era moderna em Portugal ocorreu durante a I República, com uma subida média anual dos preços de 23.8%. Entre 1910 e 1925, os preços subiram 23 vezes, significando que o custava 10 em 1910 custava 230 em 1925. O período do Estado novo reduziu drasticamente a inflação para uma média anual de 2.4% ao ano. A inflação voltou a aumentar em Portugal a partir de 1974 e manteve-se elevada até ao início dos anos noventa. A média anual de subida dos preços desde 1974 até à actualidade é de 11.2%
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(Fonte dos dados: ibid.)

Salazar foi o primeiro responsável pelo PREC

Porque é que se haveria de considerar que a responsabilidade dos dirigentes do Estado Novo termina a 24 de Abril de 1974? Foi o país que eles moldaram que desembocou no PREC. Por comparação, o país moldado por Franco desembocou na transição pacífica espanhola. A principal diferença é que, enquanto os dirigentes do Estado Novo conduziram o país para um beco sem saída, dando dessa forma o poder de bandeja à extrema esquerda, os dirigentes da ditadura espanhola conseguiram uma transição viável. Salazar foi o primeiro, e se calhar o principal, responsável pelo PREC e pelo colapso económico e social que se lhe seguiu, quer aqui, quer nas ex-colónias. Se se considera que o Estado Novo é responsável pelo crescimento asiático da década de 60 e início dos anos 70 também terá que se considerar que tem grandes responsabilidades no colapso que se lhe seguiu. Caso em que se terá que aceitar que o crescimento asiático afinal não passou de uma bolha de curto prazo completamente insustentável pela realidade. Na verdade, o regime tentava viver num mundo que já não existia, o que acabou por ter consequências.

Re:Portugal: PIB per capita (1836-2007)

Claro que o único segredo do sucesso económico da ditadura quando comparado com a performance económica da democracia é o atraso relativo do país. É o atraso relativo do país que permite que a economia cresça, não graças às características do respectivo regime, mas ao simples facto de um país atrasado poder crescer pela imitação, pela importação de capital e de inovação e pelo comércio. Está hoje a acontecer o mesmo com alguns regimes cleptocráticos africanos.

Portugal: PIB per capita (1836-2007)


A taxa de crescimento do PIB per capita, medido a preços constantes, é o principal indicador que os economistas utilizam para medir o progresso económico de um país. Trata-se de uma medida do crescimento do rendimento por habitante, depois de descontado o efeito da inflação.
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A taxa de crescimento média anual do PIB per capita foi a seguinte para diferentes períodos da história de Portugal, de 1836 até à actualidade.
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1836-50.......1851-1890.......1891-1910.......1911-25.......1926-73.......1974-2007
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1.2%...............1.0%.................1.0% ............-1.8% .........4.0%..............2.7%.
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Período 1836-50. É o período que vai da Revolução de Setembro de 1836 até à Regeneração (coincidente, em parte, com o chamado II Liberalismo, 1832-50). O rendimento médio de cada cidadão português cresceu à taxa média anual de 1.2% ao ano.###
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Período 1851-90. É o período da Regeneração (III Liberalismo). Neste período de 40 anos, manteve-se o crescimento modesto de 1.0% ao ano, tendo o nível de vida dos portugueses aumentado cerca de 56% no período.
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Período 1891-1910. É o período do declínio da Monarquia. Manteve-se o ritmo de crescimento anterior. Nestes 20 anos, o nível de vida dos portugueses cresceu 14%.
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Período 1911-25. Primeira República, o período mais negro da nossa histórica económica recente. O PIB per capita caíu à taxa média anual de 1.8%. Nestes 15 anos, o nível médio de vida dos portugueses diminuiu 25%.
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Período 1926-73. É o período do Estado Novo. Apesar de incluir duas Guerras, foi o período de maior brilhantismo económico. O PIB per capita subiu à taxa média anual de 4% e, nestes 48 anos, o nível de vida médio da população portuguesa aumentou cerca de 6.5 vezes.
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Período 1974-2007. Corresponde ao regime actual. A taxa média de crescimento anual do PIB per capita foi 2.7% (da qual, na minha estimativa, cerca de 1.5% foi devida aos subsídios comunitários). Neste período de 33 anos, o nível médio de vida em Portugal aumentou cerca de 2.5 vezes.
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(Fonte dos dados: Eugénia Mata e Nuno Valério, História Económica de Portugal: Uma Perspectiva Global, Lisboa: Editorial Presença, 2a. Edição, pp. 254-57; e estimativas pelo autor.)

O Estado, condição sine qua non do Liberalismo.

1. Para Thomas Hobbes, "A natureza fez os homens tão iguais, quanto às faculdades do corpo e do espírito..." que "Desta igualdade quanto à capacidade deriva a igualdade quanto à esperança de atingirmos os nossos fins".

Para o mesmo autor, "durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capaz de os manter a todos em respeito, eles se encontram naquela condição a que se chama guerra; e uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens" pelo que, na ausência do referido poder comum "a vida do homem é solitária, pobre, sórdida, selvagem e curta".

Pelo seu lado, Jean-Jacques Rousseau, criticando Hobbes, mantinha que "a piedade é um sentimento natural, que, moderando em cada indivíduo a actividade do amor de si próprio, concorre para a conservação mútua de toda a espécie".
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Hamilton e Dawkins, já no século XX, ajudaram-nos a tornar compatíveis as duas perspectivas. A perspectiva evolucionista, colocando em relevo o que poderia ser o mecanismo biológico fundamental – a conservação, não apenas do indivíduo, mas sobretudo dos genes, oferece uma visão integrada para a questão da relação entre egoísmo e altruísmo. A conservação dos genes pode exigir, num momento, egoísmo, e noutro momento, altruísmo, que são tudo menos incompatíveis - pelo menos no que respeita a grande parte das pessoas.

2. A visão de T. Hobbes, inspirada pelos relatos das sociedades sem Estado encontradas pelos europeus na América, é certamente compatível com observações contemporâneas da quebra da autoridade estatal, seja de forma temporária, por exemplo na sequência de catástrofes naturais, seja de forma prolongada (nos chamados failed states).

A passagem do furacão Katrina por New Orleans, em 2005, e a falência temporária da acção do Estado, associou-se, tal como em numerosos outros relatos similares, a sordidez e a selvajaria. Sem Estado, não há civilização.

3. É possível a vida humana sem Estado, a sociedade sem Estado. Nesta, existe a liberdade do mais forte – por exemplo, a liberdade para cometer homicídio. Tal sociedade e tal liberdade, contudo, nada têm a ver com o Liberalismo.

O Liberalismo, pelo contrário, representa a evolução da organização social na dependência de um Estado. O Liberalismo representa uma forma elaborada e historicamente evoluída do estatismo. Não existe Liberalismo sem estatismo, sem a existência de Estado. Sem Estado, não existe o Liberalismo, mas poderá existir uma vida "solitária, pobre, sórdida, selvagem e curta".

A liberdade individual, entendida como a liberdade da generalidade dos indivíduos, no contexto de uma dada civilização, não é incompatível com a existência de um Estado. Muito pelo contrário, a existência de um Estado é uma condição sine qua non para a liberdade individual (mas certamente não é condição suficiente). O facto de muitos Estados terem optado pela via do totalitarismo, ou seja, a frequente existência de Estados iliberais, não estabelece, nem o Liberalismo como doutrina contrária à existência de Estado, nem o Estado, como entidade incompatível com o Liberalismo.

José Pedro Lopes Nunes

26.2.07

A ler:

«Jornalismo de Estado», por JPH

Acantonados

Alguns senhores magistrados estão muito ofendidos com uma jornalista que num seu artigo de opinião, entendeu referir em termos pouco abonatórios os magistrados de forma genérica. Foi abusiva tal generalização? Não creio. As posições que a autora critica tinham sido expressas por um membro da direcção da Associação Sindical e noutro caso por um membro do Conselho Superior de Magistratura. Na medida em que os magistrados citados ou as posições criticadas emanam e são proferidas enquanto membros de órgãos representativos da classe dos magistrados, a generalização usada pela autora parece-me compreensível.
Vai daí, um dos visados pretendeu exercer o direito de resposta, com um texto que foi objecto de recusa de publicação, pelo então director do DN, António José Teixeira. Face ao tom, teor e extensão da carta, de acordo com a lei, que se deveria supor que o autor a conhecesse, parece-me a decisão de AJT perfeitamente adequada.

Mas o sumo da coisa são mesmo as reacções de alguns dos magistrados face aos eventos, indignados pela não-publicação. Um exemplo significativo é o de Francisco Bruto da Costa: «Nos tempos actuais, os jornalistas perderam o monopólio da informação (e da propaganda...) - a World Wide Web e a sua componente Blogosfera permitem actualmente que os cidadãos saibam em tempo quase real de todas as perversões informativas dolosas, culposas ou simplesmente "ignorantosas"»
Sim, sim, até poderá ser. Mas, já agora, só faltará mesmo é os cidadãos poderem também aceder, pela «www. e sua componente blogosfera» a todas as «perversões [jurídicas] dolosas, culposas ou simplesmente "ignorantosas"» eventualmente praticados pelos senhores magistrados. Ou não?

Nota: vale a pena ler todos os comentários presentes no último link indicado. São muito esclarecedores.
(via CF&A)

comunidade

O recente debate no «Blasfémias» em torno do Estado, da sua autoridade própria ou do autoritarismo que lhe pode ser emprestado por quem circunstancialmente o dirige, suscita um outro problema bem mais importante do ponto de vista liberal: o de saber como se pode oferecer resistência a um poder, o poder do Estado, que é, por natureza e definição, como lembrava Bertrand de Jouvenel, sempre expansivo.
Uma das constatações mais preocupantes da nossa época é a de que os instrumentos mais recentes de individualização social estão, ao contrário do que seria legítimo há umas décadas supor, a enfraquecer a soberania individual e a tornar o Estado mais forte. Esta é, se bem interpreto, a grande preocupação de alguns liberais, como Pedro Arroja, colocados perante a aparente contradição entre a individualização social crescente, e a perda de liberdade individual em favor do reforço do Estado.###
Em bom rigor, nada disto é exactamente novo. Orwell, no seu «1984», previu-o, ou melhor, aceitou como tendência provável o reforço do «Big Brother» pelo domínio e pela manipulação de uma tecnologia aparentemente benéfica para os homens. Outros autores de ficção científica, entre eles o já falecido liberal Robert Heilein, têm tratado reiteradamente o tema em muitas das suas obras. O problema é, pois, real e facilmente perceptível. Deve ter, contudo, uma outra ponderação, pelo menos para os liberais, que não seja pedir ao Estado que ele mesmo limite o seu próprio poder e o torne sensato e civilizado. Um liberal clássico, a meu ver, nunca admitirá semelhante possibilidade.
A questão é que entre a ideia de indivíduo e Estado existe, ou deve existir, uma outra: a de comunidade. Tratando-se, naturalmente, de uma ideia difícil de definir, sempre poderemos dizer que ela pode ser entendida como a ordenação natural, isto é, não política, dos indivíduos em sociedade. Obviamente que só em comunidades fortes, constituídas por indivíduos livres e com uma esfera de direitos robusta, poderemos encontrar Estados civilizados, ou seja, de poder contido. Como verdadeiros vasos comunicantes que são, quando o poder de uma dessas duas partes diminui, transfere-se para a outra. O poder, isto é, a faculdade de decidir e escolher, não paira no vácuo, não desaparece, nem encolhe: transfigura-se e muda de mãos; ou pertence aos indivíduos e às suas formas comunitárias de organização, ou pertence ao Estado, isto é, à forma política de organização dessa mesma comunidade.
Deste modo, numa época que pôs à disposição dos indivíduos – e do Estado, uma imensa tecnologia de informação e de comunicação, que lhes permite estreitar distâncias, mas, também, invadir privacidades, o que parece ser tarefa essencial para o reforço das liberdades e para a contenção do Estado é exactamente a ideia de comunidade. O seu fortalecimento só será possível se feito em torno de um conjunto de ideias, princípios e valores que obtenham um consenso relativamente generalizado entre os cidadãos. Como encontrá-los e como os tornar convincentes? Essa é, em minha opinião, a tarefa que cabe aos liberais e, sobretudo, a quem queira imaginar um programa político liberal para as próximas décadas.

Autoridade II

Imprescindível ler

O texto de Llewellyn H. Rockwell, Jr., "The Republicans and their Doomed Ideology".
No dia seguinte após a minha reacção contra o esforço da velha direita conservadora lusa em se travestir de liberal, o diagnóstico sobre a direita conservadora norte-americana, através de caminhos diferentes, não parece alcançar conclusões muito distintas. Curiosamente.
Um breve excerto: «But these days we see all around us how liberty generates order and how this order is self-sustaining. We live in private communities. We see the glorious world of the web. We benefit daily, hourly, minute-by-minute, from an order that is not imposed from without but rather generated from within, by that remarkable capacity we have for pursuing self-interest while benefiting the whole. Here are the great mystery and majesty of social order, expressed so well in the act of economic exchange.
Republicans by contrast live intellectually in a world long past, a world of warring states and societies made up of fixed classes that fought over ever-dwindling resources, a world unleavened by enterprise and individual initiative. They imagine themselves to be the class of rulers, the aristocrats, the philosopher kings, the high clerics, the landowners, and to keep that power, they gladly fuel the basest of human instincts: nationalism, jingoism, and hate. Keeping them at bay means keeping the world of their imaginations at bay, and that is a very good and important thing for the sake of civilization
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Transparência na apologia do totalitarismo:

«Derrotada pela traição interna e pelo cerco imperialista, da democracia soviética, a mais perfeita até hoje alcançada pela humanidade, restam poucos focos no mundo que resistem. Mas outros se levantam

Leandro Martins, Avante, 22.02.2007 (via insurgente)


Autoridade

In politics, authority (Latin auctoritas, used in Roman law as opposed to potestas and imperium) is often used interchangeably with the term "power". However, their meanings differ. "Power" refers to the ability to achieve certain ends, 'authority' refers to the legitimacy, justification and right to exercise that power. For example whilst a mob has the power to punish a criminal, such as through lynching, only the courts have the authority to order capital punishment.

O que dá vida a Jardim e a Sócrates?

Alberto João Jardim resolveu demitir-se não propriamente por ter razão - e na Lei das Finanças Regionais tem alguma - mas sobretudo porque duma assentada mata vários coelhos. Na campanha que se avizinha é provável que o PS local fique reduzido a uma pálida sombra da sombra que já é. Simultaneamente refreia os entusiasmos daqueles que já se viam seus sucessores. E sobretudo garante a sua presença na política activa até 2011, o que quer dizer que se fará ouvir nas próximas presidenciais, autárquicas, legislativas e ainda na revisão constitucional.###
Mas para além dessas outra razão existe: Alberto João tem pela primeira vez em Lisboa alguém com quem se identifica. Tirem o ar boçal e alguns anos a Alberto João, vistam-no melhor, anulem-lhe o sotaque e eis o que sobra: um homem que detesta que o confrontem e um líder que gosta de se ver como um animal feroz. Ou seja José Sócrates, um homem que como Jardim é feito pelo poder. Não se imagina Alberto João a fazer oposição, arrastando-se anos pelo parlamento, fosse ele regional ou nacional. Quanto a José Sócrates, convém recordar que não só foi um mau líder de oposição como apenas ganhou as eleições porque Santana as perdeu. Mas o poder deu-lhe o carisma que não tinha. Afinal o exercício do poder que desgasta os outros líderes é o que dá forma e estrutura a homens como Sócrates e Jardim.

*PÚBLICO, 21 de Fevereiro

Tavira

Domingo de Carnaval, pela manhã. Mais, aqui.

Ao Ganso
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Garça

Gaivota

Minuto Verde

Tora Tora Tora


Mará Baixa


O novo arranjo urbanístico da Praça da República. Teremos que esperar alguns anos para que as novas árvores crescam.

autoritário ou com autoridade?

O Estado Novo era um Estado com autoridade ou um Estado autoritário? Por outras palavras, dispunha ele de instituições sólidas, com legitimidade própria e respeitadas por isso, autónomas entre si e no seu funcionamento, capazes de suportarem, por elas mesmas, a crítica, a censura e a opinião pública, ou, ao invés, tudo girava em torno da inegável autoridade pessoal de um homem, da sua vontade, do seu poder, da sua decisão? Afinal, o Estado Novo manda, ou quem manda, quem manda, quem manda é António de Oliveira Salazar? É que, bem vistas as coisas, caro Pedro, um Estado com autoridade dificilmente tolera um poder autoritário.

25.2.07

Autoridade


O Vasco Pulido Valente, depois de denunciar hoje no Público o "liberalismo diletante e teórico, que por aí anda (...)", conclui: "Os velhos vícios portugueses não se curam com exortações. Se por acaso são curáveis, são curáveis com uma boa dose de liberdade e responsabilidade (...)".
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O apelo à responsabilidade - porque é, na realidade, de um apelo que se trata - é uma exortação. E a fórmula da "liberdade e responsabilidade" é um diletantismo: tomem lá a fórmula que eu vos dou e agora apliquem-na.##
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Nós reconhecemos liberdade às pessoas para que elas cumpram as suas responsabilidades. O problema é que muitas delas utilizam a liberdade, não para cumprirem as suas responsabilidades, mas para as evadirem e, se puderem, para as passar para cima dos outros - e o crescimento do Estado-Providência, que é a fonte das maiores dificuldades da sociedade portuguesa actual, está aí para servir de testemunho.
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A solução não está, portanto, na fórmula "liberdade e responsabilidade" porque essa é, na realidade, não a solução, mas a causa de todos os problemas. Todos querem a liberdade, mas muito poucos querem a segunda parte da equação- a responsabilidade. A questão está em como assegurar que cada homem assume a sua responsabilidade de viver.
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Num post recente, em resposta a uma solicitação de um comentador, enumerei dez factores que, na minha opinião, tinham feito do regime do Estado Novo um período de grande progresso económico e social. Esses dez factores poderiam existir sob um regime ditatorial - como foi o regime de Salazar - ou sob um regime democrático, e eu ainda alimento a esperança, embora cada vez menor, que possam existir sob um regime democrático.
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Entre esses dez factores, indiquei o sentido de Estado dos governantes, bem como o respeito que as instituições do Estado recebiam da generalidade da população. Salientei, também, o facto de o Estado Novo ser uma pessoa de bem nas suas relações económicas e contratuais, e a forma como o seu exemplo tinha passado a toda a população sob a forma de uma verdadeira cultura.
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Nessa enumeração, evitei sempre utilizar uma palavra que eu sabia ser impopular, mas que resumiria muito do que então escrevi - autoridade. Utilizo-a agora. O Estado Novo foi um Estado forte, ainda que pequeno, e sob ele Portugal prosperou como em poucos períodos da sua história, porque transpirava autoridade, a começar pela própria pessoa de Salazar.
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Como procurei argumentar noutro post, o ideal de uma sociedade liberal é aquele em que todas as pessoas cumprem as suas responsabilidades para com os outros e para consigo próprias. Como não é difícil imaginar, esta sociedade seria imensamente próspera do ponto de vista económico, teria poucas desigualdades sociais e seria abundantemente pacífica.
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Mas enquanto não atingimos esse ideal - o de que todas as pessoas cumpram as suas obrigações para com os outros e para consigo próprias -, aquilo de que nós precisamos não é de mais liberdade e de mais exortações à responsabilidade, como sugere o VPV. Aquilo de que nós mais precisamos é desse meio - a mais importante tecnologia - que permite realizar a liberdade: a autoridade. E para não parecer diletante, eu tenho de confessar que não sei como restaurar o valor da autoridade na nossa sociedade democrática.

o regresso de paulo portas 2

Há uma pergunta inevitável a fazer a Paulo Portas, neste seu anunciado regresso ao CDS, para muitos, evidente desde que se demitiu: o que é que ele pode trazer de diferente à direita, ao partido, à política e ao país, que não lhes tenha já dado quando por lá esteve?

Uma pergunta

O Cartão do Cidadão implica ou não cruzamento de bases de dados?

o regresso de paulo portas

Sobre o anunciado regresso de Paulo Portas à política e ao CDS, há, desde já, uma constatação a fazer: só se regressa aonde se deixou de estar, o que não é decididamente o caso. A demonstração desta evidência ficará a cargo dos actuais titulares do partido do Caldas, como certamente veremos ao longo dos próximos meses.

Delírios graniticamente conservadores

Num panegírico encimado com um retrato de Paulo Portas, Henrique Raposo, cujos textos até costumo apreciar, escreveu esta coisa espantosa:
«A subversão, o espírito crítico, o sabor a liberdade só podem vir da direita. Aqui e agora, em 2007 e em Portugal, a direita liberal significa ousadia, golpe de asa, irreverência; uma irreverência que não existe em mais lado nenhum. Nós, liberais conservadores, somos os únicos desempoeirados num país ainda coberto pelo ácaros do século XX».
Está Raposo excessivamente equivocado. Tanto que até assusta.
A direita portuguesa não é, nem nunca foi, «subversiva» - para o seu tipo normativo comum, a palavra até possui algo de pejorativo; a direita portuguesa prefere a ordem, a imutabilidade, i.e. a inalterabilidade genérica das coisas, dos homens e dos valores.
A direita portuguesa não sabe o que é o «espírito crítico»; mas julga os parcos contornos que percebe do conceito como sinónimo de "traição" ou coisa pior.
A direita portuguesa desdenha o «sabor a liberdade»; hoje, bem como ontem - e temo bem que amanhã -, a direita conservadora nacional não gosta de nenhum dos paladares da liberdade; julga-a um luxo ou um perigoso resvalamento para o afrouxamento dos valores seguros e reconhecidos nas suas rotinas existenciais.
E depois, em Portugal, não há «direita liberal». Há, sim, meia-dúzia de bem intencionados (entre os quais, também, me incluo), carregadinhos de wishful thinking, mais ou menos inconsequentes e desejosos que essa miragem se possa concretizar. Mas estão, inapelavelmente, perdidos num imenso mar de conservadores imobilistas, proteccionistas e, para meu próprio espanto recente, de salazaristas mal camuflados - como se pode ver numa breve passagem pelas discussões de alguns blogues nacionais que gostam de se auto-intitular de "liberais", por exemplo, muito infelizmente, no Blasfémias.

Mas o que me parece bastante mais indesculpável é Henrique Raposo depositar toda a sua confiança na fundação da «direita liberal» em alguém como Paulo Portas - aliás, insuportavelmente idolatrado em todo o texto.
O Paulo Portas de que agora, sebasticamente, se diz que vai "regressar", não renasceu politicamente de geração espontânea - é o mesmo que foi ministro e vice-primeiro-ministro de um governo de que Barroso fazia gáudio em dizer "que não tinha nenhum liberal entre os seus membros". É o mesmo Paulo Portas que verberou o liberalismo e os seus princípios até mais não, garantindo, a propósito, que "Aveiro não é Chicago e Portugal não é os Estados Unidos" (?!). É o mesmo Paulo Portas que desmentiu o liberalismo em todas as acções do seu governo durante três anos e meio.
O que é que este Paulo Portas tem de diferente daquele senhor com o mesmo nome que foi um péssimo ministro de dois maus governos até há 2 anos? Quem é que o acompanha agora que já não tenha estado ao seu lado em todas as lutas que travou nos últimos 10 anos? Digam-me lá onde é que Paulo Portas teve a sua Estrada de Damasco liberal, intelectual, competencial ou funcional, porque, sinceramente, não a consigo enxergar...
Este não é o emergir, muito menos o regresso, de nenhuma "direita liberal" mas sim o reaparecimento da velhíssima direita conservadora que nunca saiu daqui, nunca se reciclou nem conseguiu, sequer, perceber essa indesmentível precisão. E, falar de «... ousadia golpe de asa e irreverência...» a propósito de gente que já nasceu irremediavelmente velha, acomodada e que nem sonha em poder mudar, confesso, até me pareceria risível se não fosse trágico.

como é bom de ver

"É que, como é bom de ver, o interesse prevalecente da investigação e eventual punição, por parte do Estado, é manifestamente superior ao dos potenciais ofendidos com a compressão de alguns dos seus direitos, ainda que com expressa garantia constitucional, designadamente os atinentes à vida privada, como são seguramente os constantes de documentos seus (originariamente pessoais ou não)".
(De um acordão do Tribunal da Relação de Coimbra, in http://doportugalprofundo.blogspot...m-espinhos.html)