14.3.07

Informação é poder*

Ao primeiro-ministro vão passar a reportar o secretário-geral para a Segurança Interna que tem acesso a toda a informação da PSP, GNR, PJ e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. A isto há que juntar o Serviço de Informações da República Portuguesa, o Serviço de Informações de Segurança e o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa já tutelados por Sócrates.
Ao ser confrontado com estas mudanças um ex-director da PJ, Santos Cabral, declarou ao 'Diário de Notícias': «Há que criar um mecanismo de compensação para este novo modelo, porque há muita informação nas mãos de uma só pessoa e, hoje em dia, informação é poder».###
Não é apenas hoje em dia. Já o era no tempo do intendente Pina Manique. Aliás por triste ironia muita da discussão em torno dos serviços de segurança e sobretudo muitos dos temores acerca da promiscuidade entre o poder político e o poder judicial conduzem-nos à Casa Pia, a mais emblemática obra desse intendente. O processo Casa Pia revelou teias de cumplicidades e silêncios e confirmou que, de facto, 'informação é poder'.
Em que medida é que quem está no Governo, na Procuradoria, na Assembleia da República e nos serviços de informações usa o seu poder não apenas para fazer o seu trabalho mas também para impedir investigações que lhe sejam inconvenientes? Ou para obter informações que podem ser usadas contra aliados ou inimigos? Ou para coagir testemunhas? E se toda essa informação for concentrada numa pessoa? Estas são perguntas naturalmente feitas em voz alta nas democracias mas que em Portugal têm uma particular e infeliz ressonância.
Mas se acerca das consequências perversas da concentração dos serviços de informações apenas podemos e devemos levantar questões noutros campos já temos certezas. E a primeira delas respeita à relação do PS com a autoridade. Quando está na oposição o PS dá largas à sua costela radical e em toda e qualquer medida vê um regresso à ditadura. O mais grave é que à iconografia da grilheta junta o PS uma prática irresponsável que o levou, por exemplo, a participar no bloqueio da ponte 25 de Abril ou a apoiar reivindicações sindicais por parte das forças policiais. Uma vez chegado ao governo, o mesmo PS vira costas à rua que tão bem utilizou e descobre-se um apóstolo da lei e da ordem. Passa então a legislar não apenas como quem está no poder mas sobretudo como quem acredita que lá vai ficar eternamente. Daí que nem sequer equacione o uso que outros podem vir a fazer da legislação que aprova. Quem não se recorda da fúria de alguns dirigentes socialistas quando descobriram que os seus telefones estavam sob escuta? Esqueciam que a legislação que tal permitiu fora da sua iniciativa. Pode ser que ao voltar à oposição o PS descubra não só as potenciais perversidades da concentração de serviços de informações na figura do primeiro-ministro mas também o autoritarismo implícito em algumas das suas actuais bandeiras como o cartão único, a investigação da situação fiscal dos funcionários públicos e a divulgação da lista dos devedores ao fisco.


*PÚBLICO, 13 de Março