16.3.07

Quer queiras quer não queiras, tens que ser um cidadão protegido

A nova moda governamental politicamente correcta é a protecção do cidadão indefeso perante as arbitrariedades malignas do universo capitalista e globalizado em que vivemos. Ontem foi um dia de protecção. Protegeram-nos de tudo. Dos terríveis carapaus a que faltava meio centímetro, das venenosas padarias sem preços afixados, da nebulosa manipulação de preços das companhias de avião, das malvadezas arredondatárias da banca e, a cereja no topo do bolo, dos tenebrosos isqueiros descartáveis que podem matar os nossos filhos. Ontem foi um rodopio de ASAEs, ministros e Serrasqueiros a toda a hora. E, diga-se de passagem, sem BICs, Portugal é um país muito mais seguro. O sol, hoje, brilha forte.

Mas ainda faltam algumas coisas que considero importantíssimas, ao nível do isqueiro, ou ainda piores. São só meia dúzia de chamadas de atenção.

1. Há cidadãos que atravessam a rua fora das passadeiras. Julgo que deveriam ser proibidas as ruas sem gradeamentos. As cidades ficariam muito mais seguras se houvesse uma impossibilidade física de atravessamento fora dos locais determinados pelo governo. Este é um daqueles casos em que a estética não se deve sobrepor à segurança dos cidadãos. ###

2. Já se sabe que as empresas de distribuição de água vão ser proibidas de cobrar pelos contadores. Os cidadãos milionários com várias casas espalhadas pelo país e os estrangeiros com casas de Verão em Portugal agradecem a oferta do secretário Serrasqueiro. Mas há mais coisas destas que não nos podemos esquecer. Não é só a água que não se consome. Por exemplo, quem vive em casa arrendada não deve pagar pelo período não utilizado. É a mesma lógica do contador. Só se deve pagar pelo que se consome. Todos os senhorios devem ser obrigados a colocar um contador de presença nos imóveis (gratuito) e só poderão cobrar pelo tempo em que estiver alguém em casa. Tal e qual como na água. O serviço está disponível mas só se paga a utilização. A mesma coisa com os ALDs automóveis. Porque é que alguém deve pagar pelo carro, por exemplo, à noite, quando não o está a utilizar? Pagar até quando se dorme? Parece-me um escândalo.

3. A Hertz e a Avis têm uma modalidade de aluguer automóvel em que se paga um fixo por dia mais 'x' por quilómetro. Fixo? Soa-me a espoliação do consumidor. O consumidor só deve pagar pelos quilómetros que anda.

4. Também não percebo porque é que os isqueiros são perigosos e os fósforos não. Não seria boa ideia proibir as caixinhas de amorfos?

5. Essa história da Euribor andar sempre a mexer é muito pouco transparente. A solução ideal está no governo, que deve decretar a Euribor por despacho governamental, todos os anos.

6. A Clix, a Netcabo e essas empresas de internet andam a cobrar valores fixos pelo acesso. Que falta de transparência. Isto tem que ser como os contadores da água. Só se paga o que se consome. Como é que o senhor secretário de estado se esqueceu desta? O que nos vale é que os deputados do PSD estão atentos. Parece que também vão exigir qualquer coisa boa para nos proteger.

7. Já viu bem os saca-rolhas de rosca? Aquela ponta bicuda é um perigo. Pode cegar uma criança. Que tal rolhas de plástico em todas as garrafas de vinho? Até porque a rolha fácil não só protege o consumidor como torna o acesso ao néctar mais fácil, estimulando o consumo. E não há como uma boa garrafa de vinho para nos dar meia dúzia de novas brilhantes ideias para proteger os consumidores.

Estas são apenas algumas sugestões. Há mais. Julgo que, se todos desejarmos, podemos fazer de Portugal um país muito mais seguro, mais transparente, menos transgressor. Um país limpinho. Um país ASAE, um país Serrasqueiro. Que coisa bonita.