Não deixa de ser irónico que o Campo de Tiro de Alcochete se configure neste momento como uma séria alternativa à Ota e às outras localizações possíveis para o novo aeroporto. Há dezassete anos, o PCP apostou forte no ambiente para contestar politicamente a ampliação deste campo militar. Municípios liderados pelo PCP e entidades fantasma que lhe eram afectas como o Secretariado Permanente do Movimento Zonas Livres de Armas Nucleares organizaram um cordão humano e fretaram um autocarro "da paz e da solidariedade" que rumou a Estrasburgo para explicar aos eurodeputados que "as aves não têm passaporte" e que o dito campo de tiro teria um impacto desastroso na vida quer das aves quer dos humanos habitantes de Alcochete. ###
Quase duas décadas depois, constata-se que as aves se deram bem com os tiros e a posse militar dos terrenos acabou a ser encarada como um mal menor já que evitou a sua urbanização. O PCP sempre soube que o campo de tiro acabaria por ser ampliado mas a pressão a que sujeitou o executivo de Cavaco Silva rendeu-lhe dividendos políticos. (Já outros que lhe tentam seguir a estratégia podem dar-se mal: em Lisboa, José Sá Fernandes perde votos de cada vez que um automobilista atravessa o túnel do Marquês.)
Actualmente são o PP e o BE os partidos que publicamente declaram estar interessados em apostar naquilo que entendem por Ambiente. O momento não poderia ser mais adequado: o ministro do Ambiente está reduzido a uma espécie de arauto que não só anuncia como legitima algumas das mais questionáveis decisões deste governo. Por exemplo, a forma como esta equipa ministerial relançou o processo de incineração de resíduos, dispensando-o de estudo de impacto ambiental, é uma vergonha apenas ultrapassada pelo comportamento do ministro na questão da localização do novo aeroporto. Nunes Correia tem todo o direito de apoiar a opção Ota mas não pode transformar o ambiente numa espécie de regime do arbitrário, onde à falta de melhor argumento existe sempre uma ave que justifica a opção que se está a tomar.
Mas o declarado interesse do BE e do PP pelo ambiente não iria além das respectivas agendas caso as associações de ambiente tivessem um discurso próprio. Em 1990 tinham-no. Em 2007 não têm. Sigam-se os comunicados da QUERCUS sobre a Ota ou da LPN sobre a barragem de Odelouca e percebe-se que estas associações não se conseguiram renovar desde que alguns dos seus mais activos dirigentes se tornaram membros do staff socialista. O PP e sobretudo o BE são os verdes que se seguem.
*PUBLICO, 13 de Junho