12.3.07

autoridade livre


Os países católicos do sul da Europa e os seus descendentes na América Latina nunca conseguiram viver duradouramente em democracia. Esse parece ser um segredo dos países pedominantemente protestantes do norte da Europa e dos seus descendentes na América do Norte (Canadá, EUA) e noutros continentes (v.g., Austrália, Nova Zelândia).###
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Num regime de liberdade política, os países protestantes parecem ser capazes de gerar uma ordem social espontânea que lhes assegura o funcionamento regular das instituições e a prosperidade. Pelo contrário, os países católicos, sob as mesmas condições de liberdade política, tendem a gerar uma certa desordem que lhes corrompe as instituições e lhes inibe a prosperidade.
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Em ambos os casos, existe liberdade de expressão e associação; em ambos os casos, os governantes são eleitos por vontade expressa da maioria dos cidadãos; em ambos os casos, os cidadãos são livres dentro do respeito pela lei. Em ambos os casos existe a autoridade do Estado com as suas polícias e tribunais. E, no entanto, parece existir nos países protestantes um respeito pelo cumprimento da lei democráticae das convenções sociais que não é igualado nos países católicos.
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A razão é que, para além da autoridade institucional - o Estado -, existe nos países protestantes uma outra forma de autoridade que actua de forma permanente na sociedade e em todas as situações da vida social, e que não está presente nos países católicos. Refiro-me à autoridade de cada cidadão.
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Como argumentei num post anterior, o homem protestante é uma autoridade livre. Quando, numa sociedade de cultura protestante, um homem utiliza a sua liberdade para abusar a lei ou as regras de convivência social, qualquer um dos seus concidadãos possui a autoridade para lhe chamar a atenção, o repreender e, em última instância, o denunciar às autoridades institucionais.
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Pelo contrário, o homem católico é um sujeito livre - a sua liberdade depende da sua sujeição a uma autoridade terrena de nível superior a ele. Quando, em democracia, ele próprio passa a ser a autoridade, este homem não está preparado para a exercer, porque ele sempre se viu a si próprio, e a todos os seus concidadãos, como um sujeito, nunca como uma autoridade.
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Num país católico em regime de liberdade política, então, qualquer transgressão à lei ou às regras de convivência social por parte de um homem, tende a ser aceite como uma prerrogativa do exercício da sua liberdade, e nenhum cidadão sente a autoridade necessária para o impedir, para o repreender ou para o denunciar às autoridades institucionais. E, ainda que sentisse, o mais provável é que o transgressor não lhe reconhecesse qualquer autoridade para esse efeito.
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O resultado é que, enquanto nos países protestantes, a liberdade de cada homem - incluindo a dos governantes e demais funcionários do Estado - é contida em primeiro lugar pela autoridade de todos os outros homens e só em última instância pela autoridade do Estado, nos países católicos a liberdade de cada homem só encontra limite na autoridade do Estado. E, no caso em que o homem católico, por designação ou eleição, actua na esfera do Estado, então, neste caso, a sua liberdade não conhece quaisquer limites. O potencial que um homem assim possui para produzir dano às instituições e as desacreditar é incalculável.
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Nos países católicos, a democracia nunca conseguiu vingar por virtude do desprestígio das instituições do Estado e dos abusos cometidos sobre elas e em seu nome, e isso foi, em geral, acompanhado por uma certa desorganização da sociedade.