3.3.07

A «estrita neutralidade» que não existiu

O Estado, se tem poderes de interferência numa empresa e não os usa, porque os têm?
Se os tem e os utiliza, porque razão não assume tal facto e explica qual o objectivo?
E porquê e para que fins o Estado mantêm a pretensão de continuar a condicionar e interferir na actuação das empresas e dos mercados?###

O Estado, vá lá saber-se porquê e para quê, detêm um poder incomensuravelmente superior às 500 acções que possuiu no capital da PT: certas decisões tem de ter o seu acordo e tem direito indicar gestores, entre os quais o presidente do CA.
Ora, se detêm tal poder, é com alguma intencionalidade, visando assegurar objectivos políticos e não económicos.

Assim, ao se ter abstido numa importante votação, o Estado estaria a dizer que nem era a favor do projecto económico assumido por um minoria de accionistas, liderados pelo BES, nem a favor do projecto económico proposto pela Sonae.
Ou seja, tal «imparcialidade» configuraria uma situação anómala: o accionista político/económico Estado não tem posição face a dois projectos divergentes para o futuro da empresa. Então, se assim for, se lhe é indiferente, o que está lá fazer? E porque pretende continuar a condicionar o seu futuro se o mesmo lhe é indiferente?

Em segundo lugar, tal pretensa «imparcialidade» é totalmente furada, pelo facto de o accionista Estado ser detentor simultaneamente de uma importante fatia do capital por intermédio do grupo CGD. O qual, supostamente teria votado em favor das pretensões do BES, atendendo apenas a questões financeiras. Ora, a CGD não é um simples grupo financeiro. É uma entidade financeira ao serviço das políticas do Estado emanadas do governo. Caso a mesma fosse gerida atendendo apenas a critérios financeiros e de mercado, não se justificaria a sua posse e propriedade pelo Estado. Em último caso, os verdadeiros accionistas, na ausência de indicações do governo, seriam os seus gestores. Ora, sabendo-se que os mesmos são nomeados atendendo a critérios político/pessoais, a confirmar-se a inexistência de indicações políticas por parte do governo, e a autonomia dos gestores na tomada de decisão de tão relevante decisão, apenas se poderá concluir que os ditos gestores agiram na defesa de interesses que não são nem claros, nem precisos e pior de tudo, são desconhecidos.

Esclareço que não sendo accionista de nenhuma empresa (nem destas nem de qualquer outra), me é indiferente quem seja o seu proprietário. Há muito que deixei de ser cliente de qualquer uma das empresas do grupo PT e não pretendo voltar a sê-lo, seja em que condição for. Apenas tenho interesse que o mercado funcione mais livremente, acabando-se o mais rápido possível com os monopólios e situações de domínio abusivo do mercado. Defendo a saída do Estado do capital de todas as empresas, seja da PT, da Galp, EDP, da Compal ou do Autódromo Fernanda Pires da Silva, e a venda total da CGD por esta interferir politicamente na livre actuação do mercado, desvirtuando-o e tornando-o mais ineficiente. Por último, e a título de comentário, julgo que a decisão de autorizar a junção numa mesma empresa das duas principais operadoras de comunicações móveis (TMN e Optimus) é extraordinária e incompreensível por parte de uma dita «autoridade» que supostamente deveria assegurar algo que se chama «concorrência» e não aceitar posições que configurariam, para o consumidor, a sua efectiva diminuição ou mesmo supressão.