Há dois anos, após um resultado eleitoral que considerou uma derrota pessoal, Paulo Portas demitiu-se da liderança do CDS. Não consta que ninguém lhe tenha imposto a saída, ou sequer sugerido que o fizesse. Foi, portanto, uma decisão livremente tomada, em consciência própria.
Sem líder, derrotado nas eleições e afastado de uma experiência governativa fracassada por demérito próprio dos partidos da coligação, o CDS arranjou uma solução simpática e surpreendente, porque contrária às expectativas dominantes. Mas, fosse qual ela fosse, o líder demissionário não poderia de a deixar de aceitar senão com gratidão.
Ao longo dos dois anos que levava essa liderança, os seus responsáveis não fizeram nem mais nem menos do que fariam quaisquer outros em iguais circunstâncias, como partido minoritário na oposição a um governo que dispõe de maioria absoluta na Assembleia da República, com mandato para governar quatro anos e meio.
Ao longo desses dois anos, seguindo uma velha tradição do CDS, o pessoal do grupo parlamentar, afecto à direcção derrotada, arvorou-se em oposição interna à direcção em exercício de funções. Fê-lo de forma malcriada, por vezes roçando a canalhice, de modo muito pouco próprio para um partido conservador, democrata-cristão, defensor de valores, legalista e ordeiro, como durante anos Paulo Portas não se cansou de pregar. O desrespeito público pelo líder eleito, o mesmo é dizer, pelas legítimas deliberações dos órgãos do partido, atingiu foros intoleráveis de ordinarice basofeira, com direito a desafios mediáticos e a desrespeitos televisivos.
No essencial, mais do que a muitas vezes proclamada «visão para o partido» diferente da que tem a direcção, está uma ânsia pelo poder que o partido ainda pode dispor em eleições vindouras. A conversa de que «o partido não aguenta muito mais tempo assim» é para enganar tolos: Paulo Portas chegou a ter 2% de intenções de voto dois meses ou três antes de chegar ao governo. Obviamente, só depois de eleições legislativas seria lícito retirar essa ou outra conclusão.
Ao longo desses dois anos, Paulo Portas disse-se sempre afastado das movimentações internas do partido que dirigiu. Manteve uma intervenção pública discreta e muito distante do seu melhor, na televisão e na imprensa semanal. Esperava-se, contudo, que aproveitasse a sabática para aprender alguma coisa. Para melhorar o seu curriculum, quem sabe, com estudos no estrangeiro, dois ou três livros escritos sobre política, algumas intervenções de fundo sobre temas de substância. Numa palavra, que seguisse o caminho de quem, nos últimos anos, demonstrou saber da coisa: Aníbal Cavaco Silva e Durão Barroso.
Só seguindo esta via, ou por outra que fosse bastante semelhante, Paulo Portas poderia assumir a pretensão legítima de surgir aos olhos do país como um político diferente daquele que fora derrotado nas eleições legislativas de 2002, disposto a aprender com os erros do passado, a melhorar, tornando-se mais credível. Só por esta via, Paulo Portas poderia aspirar a um destino que, embora difícil, estava ao seu alcance e esteve sempre nas suas ambições: liderar a direita portuguesa e retirar protagonismo e votos ao PSD. Infelizmente, Paulo Portas deixou-se incendiar pelas paixões fugazes das quezílias partidárias. Pelo vício das disputas internas, das conspirações, dos telefonemas até de madrugada, do «contar espingardas».
Este regresso intempestivo de Paulo Portas, sustentado na ficção de que só ele poderia unir um partido desavindo a caminho do fim, tem o resultado bem à mostra, e, até agora, contradiz ponto por ponto, as razões enunciadas do seu regresso: evitar quezílias, resolver conflitos, unir o partido. Se essas fossem as suas verdadeiras intenções e se Portas fosse politicamente responsável tinha mais do que argumentos para renunciar, por agora, à corrida à liderança.
Lamentavelmente, não o fez e não o fará. O homem que levou, em 2002, um partido afastado do poder há vinte anos ao governo de Portugal, diminui-se. Ao contrário do que fez em 1998, quando desdenhou a baixa política do partido para nele regressar pela porta grande, entrou agora pela porta pequena da intriga, da conspiração, da precipitação que só a cegueira voraz do vício do poder justifica. Ao invés de 1998, quando se intuía a naturalidade da sua liderança, esta terá de ser agora resultado de um golpe de força no interior do partido, que está a desagradar a todo o país.
O seu tempo não era ainda este. O seu modo não poderia ser nunca este.
Infelizmente, foram. E, com essa precipitação, Paulo Portas poderá ter irremediavelmente comprometido o seu futuro político, e transformado o partido que certamente assaltará com sucesso, numa associação de companhia indesejável, sem credibilidade para regressar ao poder. É que, ao invés do que afirma a literatura especializada, em política também se pode morrer.
Sem líder, derrotado nas eleições e afastado de uma experiência governativa fracassada por demérito próprio dos partidos da coligação, o CDS arranjou uma solução simpática e surpreendente, porque contrária às expectativas dominantes. Mas, fosse qual ela fosse, o líder demissionário não poderia de a deixar de aceitar senão com gratidão.
Ao longo dos dois anos que levava essa liderança, os seus responsáveis não fizeram nem mais nem menos do que fariam quaisquer outros em iguais circunstâncias, como partido minoritário na oposição a um governo que dispõe de maioria absoluta na Assembleia da República, com mandato para governar quatro anos e meio.
Ao longo desses dois anos, seguindo uma velha tradição do CDS, o pessoal do grupo parlamentar, afecto à direcção derrotada, arvorou-se em oposição interna à direcção em exercício de funções. Fê-lo de forma malcriada, por vezes roçando a canalhice, de modo muito pouco próprio para um partido conservador, democrata-cristão, defensor de valores, legalista e ordeiro, como durante anos Paulo Portas não se cansou de pregar. O desrespeito público pelo líder eleito, o mesmo é dizer, pelas legítimas deliberações dos órgãos do partido, atingiu foros intoleráveis de ordinarice basofeira, com direito a desafios mediáticos e a desrespeitos televisivos.
No essencial, mais do que a muitas vezes proclamada «visão para o partido» diferente da que tem a direcção, está uma ânsia pelo poder que o partido ainda pode dispor em eleições vindouras. A conversa de que «o partido não aguenta muito mais tempo assim» é para enganar tolos: Paulo Portas chegou a ter 2% de intenções de voto dois meses ou três antes de chegar ao governo. Obviamente, só depois de eleições legislativas seria lícito retirar essa ou outra conclusão.
Ao longo desses dois anos, Paulo Portas disse-se sempre afastado das movimentações internas do partido que dirigiu. Manteve uma intervenção pública discreta e muito distante do seu melhor, na televisão e na imprensa semanal. Esperava-se, contudo, que aproveitasse a sabática para aprender alguma coisa. Para melhorar o seu curriculum, quem sabe, com estudos no estrangeiro, dois ou três livros escritos sobre política, algumas intervenções de fundo sobre temas de substância. Numa palavra, que seguisse o caminho de quem, nos últimos anos, demonstrou saber da coisa: Aníbal Cavaco Silva e Durão Barroso.
Só seguindo esta via, ou por outra que fosse bastante semelhante, Paulo Portas poderia assumir a pretensão legítima de surgir aos olhos do país como um político diferente daquele que fora derrotado nas eleições legislativas de 2002, disposto a aprender com os erros do passado, a melhorar, tornando-se mais credível. Só por esta via, Paulo Portas poderia aspirar a um destino que, embora difícil, estava ao seu alcance e esteve sempre nas suas ambições: liderar a direita portuguesa e retirar protagonismo e votos ao PSD. Infelizmente, Paulo Portas deixou-se incendiar pelas paixões fugazes das quezílias partidárias. Pelo vício das disputas internas, das conspirações, dos telefonemas até de madrugada, do «contar espingardas».
Este regresso intempestivo de Paulo Portas, sustentado na ficção de que só ele poderia unir um partido desavindo a caminho do fim, tem o resultado bem à mostra, e, até agora, contradiz ponto por ponto, as razões enunciadas do seu regresso: evitar quezílias, resolver conflitos, unir o partido. Se essas fossem as suas verdadeiras intenções e se Portas fosse politicamente responsável tinha mais do que argumentos para renunciar, por agora, à corrida à liderança.
Lamentavelmente, não o fez e não o fará. O homem que levou, em 2002, um partido afastado do poder há vinte anos ao governo de Portugal, diminui-se. Ao contrário do que fez em 1998, quando desdenhou a baixa política do partido para nele regressar pela porta grande, entrou agora pela porta pequena da intriga, da conspiração, da precipitação que só a cegueira voraz do vício do poder justifica. Ao invés de 1998, quando se intuía a naturalidade da sua liderança, esta terá de ser agora resultado de um golpe de força no interior do partido, que está a desagradar a todo o país.
O seu tempo não era ainda este. O seu modo não poderia ser nunca este.
Infelizmente, foram. E, com essa precipitação, Paulo Portas poderá ter irremediavelmente comprometido o seu futuro político, e transformado o partido que certamente assaltará com sucesso, numa associação de companhia indesejável, sem credibilidade para regressar ao poder. É que, ao invés do que afirma a literatura especializada, em política também se pode morrer.