Aplicar justiça implica, como o léxico especializado evidencia, julgar alguém. Ora, entre seres humanos que se presumem essencialmente iguais na sua natureza e, por isso, na sua dignidade, um julgamento é um juízo de valor feito por um (ou mais) homem sobre o comportamento de outro. Convém, assim que esse julgamento seja feito por quem tem autoridade moral para o fazer e tenha um resultado final que o comum das pessoas reconheça como justo. É por isso que, do ponto de vista liberal, as regras do direito, sobretudo do direito estatal, devem ser tão reduzidas quanto o possível, e circunscreverem-se àquilo que é essencial para garantir a convivência humana em sociedade, em vez de contribuirem para agravar os já muitos factores de desagregação. O Estado português, à semelhança dos outros Estados contemporâneos, legisla demais, julga demais e interfere demais na vida privada dos indivíduos. Com uma reduzidíssima autoridade moral em grande parte dos casos, diga-se de passagem. Como bem argumentam os defensores do «não» ao aborto, ao dizerem que, nessa matéria, «o Estado se demitiu das suas incumbências.»