Sarkozy, Blair ou Lisboa? Rui Tavares falou de tudo isto no seu texto de ontem e eu proponho que, por agora, fiquemos por Lisboa.
Eu sou uma espécie de autarquico-céptica. Em teoria defendo os municípios, a sua importância e os seus poderes. Na prática faço uma apreciação negativa daquilo que tem sido o papel das autarquias. Dir-se-á que uma coisa não é impeditiva da outra mas as duas juntas levam a que me sinta particularmente tranquila desde que sei que Lisboa está entregue a uma comissão administrativa.
Uma entidade que de facto administrasse a cidade surge-me como um bonançoso momento de alívio num quotidiano de endividamento, licenciamentos obscuros e multiplicação de empresas municipais. A isto junta-se que uma comissão administrativa também nos poupa ao discurso do amor à capital. Há décadas que Lisboa é amada pelos seus autarcas ou candidatos a tal. O que teria sido de Lisboa se eles a odiassem?
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Por fim há ainda um outro e crucial argumento para explicar esta minha simpatia pela figura da comissão administrativa: Ana Sara Brito é uma das pessoas indicadas pelo PS para essa comissão. Se os partidos tivessem dado mais ouvidos e protagonismo a pessoas como Ana Sara Brito o poder autárquico teria certamente outro saldo neste país.
Infelizmente a comissão administrativa terá uma mandato muito breve e iremos para eleições. E nesta fase em que os andores ainda nem sequer chegaram ao adro tudo indica que a procissão vai sair torta.
Comecemos pela data das eleições. Se estas, como determinou a governadora civil, acontecerem a 1 de Julho, fica comprometida a possibilidade de apresentação de candidaturas independentes. Helena Roseta seria uma má presidente da CML, como Carmona o foi, mas não é por isso que podemos assobiar para o lado quando os independentes são empurrados para fora desta campanha.
Não esqueçamos também as razões pessoais. Fernando Seara invocou-as para recusar ser candidato, pelo PSD. As razões por que Fernando Seara não deve ser candidato em Lisboa nada deviam ter de pessoal mas sim de político: Seara foi eleito em Sintra e a sua vinda, a meio do mandato, para Lisboa representa uma enorme falta de respeito por quem, votando nele ou não, participou naquelas eleições, em Sintra. Aliás, o que neste caso se viu de pessoal de Seara não abona a seu favor: não resistiu a dizer que tinha sido convidado e que não tinha aceite. Não é uma atitude muito leal para com o líder do PSD nem para com aquele que vier a ser o candidato desse partido à autarquia de Lisboa.
Para o fim deixemos as coligações. Ia a guiar quando ouvi Ruben Carvalho declarar que o PCP já tinha reunido com os parceiros de coligação e que esta se mantinha. O facto de ir a guiar não é irrelevante pois é impossível não desatar a rir – e logo fazer uma condução arriscada – quando se ouve o PCP falar sobre os parceiros da coligação. Quem são esses parceiros? A CDU é um faz de conta administrativo que traz alguns benefícios ao PCP e daí até nem vem grande mal ao mundo. Já doutra natureza é o facto de o calendário adoptado para estas eleições ter também inviabilizado outras coligações, nomeadamente aquelas que os candidatos independentes quisessem estabelecer. Nestas autárquicas o tempo pode ser uma arma.
PÚBLICO, 16 de Maio