4.7.07

MIL (II)

O último ponto do manifesto, reza assim: «os jornalistas profissionais abaixo assinados manifestam publicamente a sua total disponibilidade para assumir essa autoregulação e esse controlo, desenvolvendo para tal, desde já, todos os esforços necessários nesse sentido, em articulação com todos os profissionais e com as instâncias também empenhadas em garantir o direito fundamental de informar com liberdade

Antes de mais, numa sociedade livre, as únicas «instâncias também empenhadas em garantir o direito fundamental de informar com liberdade» que são aceitáveis são os tribunais. Nada mais.

Em segundo lugar, os signatários em vez de apenas proclamarem que desejam «assumir essa autor-regulação», deveriam assumi-la mesmo. E não pretender que «alguém» lhe dê esse poder. O que seria ilegítimo e perigoso (porquê a estes e não a outros?).

Assim, deveriam desde logo:###
1. criar um código de conduta;
2. criar um quadro sancionatório das violações do mesmo;
3. criar um comissão de aplicação dessas sanções (preferencialmente constituída por não-jornalistas).
4. Abrir à adesão por parte de todo e qualquer profissional, podendo fixar condições mínimas para a aceitação de membros.

Uma vez que de entre os signatários existem suficientes bons e prestigados profissionais, certamente a adopção daquelas medidas criaria uma autoridade própria e exerceria o necessário poder de atracção junto dos restantes profissionais que não desejariam ser excluídos.
O poder formal e informal de regulação seria grande.
Quem seria o profissional que tendo voluntariamente aderido a tal grupo, se arriscaria a ter comportamentos que bem saberia arriscar a ser sancionado por normas e regras que ele mesmo aceitara?
Evidentemente tal modelo poderia perfeitamente funcionar.
Mais.
Certamente ao fim de algum tempo surgiriam outros grupos com diferentes códigos e diferentes critérios de exigência, que por sua vez se agrupariam num qualquer outro organismo de classe. Dessa forma, se estabeleceria uma saudável concorrência, que permitiria a criação de diferentes padronizações, soluções diferenciadas e plurais e enquadrar em regimes de auto-regulação, se não toda, certamente a esmagadora maioria da classe.

Se o sistema fosse (e dependeria apenas dos próprios), na prática, exigente e cumpridor, quem no futuro pretenderia contratar um profissional que não pertencesse a um desses órgãos dotados de certos princípios fundamentais deontológicos e sujeito a avaliação pelos seus pares? Quem seria o profissional que arriscaria não aderir a um qualquer forma de auto-regulação?

Uma nota final: o desejo manifestado de se disporem a exercerem o «controlo do acesso e do exercício da profissão» é que me parece totalmente deslocado e ilegítimo. Não devem os cidadãos verem o acesso a este tipo de profissão impedido por regras e condicionalismo criados pelos profissionais que já estão no activo. Seria a mais despudorada forma de controle sobre os seus potenciais concorrentes, uma óbvia restrição à liberdade profissional e ao próprio exercício do direito de informar. Tal pretensão não tem qualquer cabimento nem existem razões de interesse público que a suportem.