10.6.04

ONU continua a apoiar presença americana no Iraque II

Isto está tudo muito dividido.

Segundo o Público:

Resolução da ONU Legitima Ocupação do Iraque

Resolução da ONU Legaliza Ocupação do Iraque

É mentira. A ocupação foi legitimada, supondo-se que a ONU é uma fonte de legitimidade, pela resolução 1511 de 8 de Outubro de 2003 , onde se pode ler textualmente:

[The Security Council,] AUTHORIZES a multinational force under unified command to take all necessary measures to contribute to the maintenance of security and stability in Iraq


A mesma resolução autoriza a presença da GNR portuguesa:

[The Security Council,] member states to contribute assistance under this United Nations mandate, including military forces, to the multinational force referred to in paragraph 13 above;


Esta resolução tem 9 meses durante os quais ouvimos os críticos da guerra do Iraque dizerem:


  • que a ocupação é ilegal;
  • a presença da GNR no Iraque é ilegal;
  • e que a as forças americanas deviam ser substituídas por forças da ONU (vindas de Marte, supõe-se).


Vital Moreira diz que a resolução de 8 de Junho de 2004 não legitima a ocupação, pretende é acabar com ela.

Pois, mas o ocupante fica. Não é um bom método.

Entretanto, recebemos uma carta de Londres, onde se pode ler:

A honesta blasfémia continua previsivelmente a pregar a peta de que as sucessivas resoluções da ONU sobre o Iraque legitimam inequivocamente e unanimemente a guerra e a ocupação.


O Bruno Reis deve ser dos que, como eu, pensam que a ONU não tem legitimidade para coisa nenhuma. Mas vamos fingir que tem.

Ninguém disse que a ONU legitimou a guerra. Mas é certo que a ONU não condenou a guerra, como era a sua obrigação.

Mas se não legitimou guerra, já não é certo que não tenha legitimado a ocupação. Afinal, porque é que a resolução 1511 autoriza a permanência da força multinacional e convida os estados membros a enviarem forças militares para o Iraque?

O Bruno Reis diz ainda:

O que o Conselho de Segurança da ONU e as suas agências têm feito, em resposta a apelos cada vez mais patéticos dos EUA que antes os tinham remetido para o caixote de lixo da história, é lidar o melhor possível com mais uma ameaça grave para a segurança internacional, desta feita criada por um país que antes geralmente ajudava a resolvê-las. Esta última resolução é mais um reconhecimento da falência da política norte-americana de confronto com a ONU e com muitos dos seus aliados tradicionais.


Não me lembro de os EUA terem remetido a ONU para o caixote do lixo da história. Mas podemos fingir que sim. Estou por tudo. Podemos até fingir que os EUA tinham os objectivos que o Bruno lhes atribui (os processos de intenção valem o que valem) e até podemos fingir, e agora vou mesmo perder a cabeça, que a França é (era) um aliado dos EUA e que os membros do Conselho de Segurança estão preocupados com a segurança internacional. Nesse caso, a conclusão que o Bruno tira até pode estar correcta.

Mas há duas coisas que eu não percebi: o Iraque foi ocupado, Saddam foi deposto e capturado, a ONU não condenou a invasão e parece que até sancionou a ocupação e o processo de estabelecimento do novo regime está sob controlo americano. Se isto é uma derrota, o que é uma vitória? E se o que se passa no Iraque é um ameaça grave para a segurança internacional, o que é uma ameaça moderada ou uma pequena ameaça para a segurança internacional?

O Bruno acrescenta:

A ironia é que se em Abril de 2003 os EUA tivessem entregue a administração do Iraque à ONU, talvez ainda pudessem ter conseguido a legitimidade e as tropas que hoje, com a confusão instalada, não irão obter, com ou sem resoluções.


Talvez ..., ou talvez as coisas tivessem corrido muito pior. As maravilhosas propriedades legitimadoras da ONU estão por provar. Se os atentados contra as tropas americanas são um sinal de hostilidade em relação aos americanos, então o atentado contra a ONU em Bagdad tem que ser visto como um sinal de hostildade em relação à ONU. Ou não? E com que forças, com que dinheiro e com que recursos é que a ONU iria administrar o Iraque? E para que é que um país toma outro, se depois não controla o processo político? Se a ONU passasse a administrar o Iraque o Bruno não seria o primeiro a dizer que os EUA foram estrondosamente derrotados?

Aliás, a teoria de que tudo isto é uma derrota da ONU é muito melhor do que a teoria de que tudo isto é uma derrota dos EUA. Ora vejamos:

- a ONU não conseguiu inspecionar as instalações militares iraquianas;
- As sanções da ONU provocaram no Iraque uma das maiores taxas de mortalidade infantil do mundo;
- a ONU trocou petróleo por palácios;
- a ONU não conseguiu evitar a guerra;
- a ONU viu morrer o seu representante e fugiu do Iraque;
- o Conselho de Segurança não condenou a invasão de um país membro por outro;
- o Conselho de Segurança foi forçado a legitimar uma ocupação considerada ilegal por muitos;

Se isto não é uma derrota, o que é uma derrota?