2.6.04

POSTA DA SAUDADE QUE JÁ FERE

ADEUS, TREINADOR!

Não quero só dizer a canção da despedida. Pretendo prestar um tributo a quem soube ser vencedor sem deixar de permanecer igual a si mesmo ainda que sempre incompreendido.

É quase incrível que alguém que subjugou os seus adversários, que provou repetidamente ser melhor, saia do país numa bruma opaca de críticas e de malquerenças não disfarçadas. Mesmo por parte dos adeptos do clube que retirou da mediocridade dos últimos anos - depois das nefastas épocas de Santos e Octávio - e soube elevar até firmamentos há muito não navegados.

Mas se reflectirmos bem, Mourinho foi sempre malquisto. Sempre tivemos a percepção que ele não era bem como nós.

Mourinho queria vencer e gostava de vencer. Era competitivo. Sabia que era o melhor e não o disfarçava. Guardava a sua exposição de afectos para as sedes apropriadas e não as exibia impudicamente.

Os portugueses não gostam disso. Gostam de quem é humilde (Bem Aventurados os...) ainda que prenhes de falsas modéstias. Gostam de quem finge, a torto e a direito, as emoções que não sentem e dos que se vangloriam dos sentimentos que nunca experimentaram.

Os portugueses não apreciam quem vence inapelavelmente. Preferem a vitória do consenso abrangente, que não magoa ninguém e em que todos, aparentemente, também ganharam um bocadinho.

Os portugueses aprovam os hipócritas, sobretudo se a sua arte for de cariz pública.
Não aplaudem quem diz o que pensa e quem faz o que diz.
Não gostam de quem vence, gostam de quem herda.
Estimam mais os "espertos" que lucram por truques e por saberem a que portas hão-de bater do que daqueles que obtêm sucesso por mérito próprio.

E, sobretudo, adoram os simpáticos. Os tipos porreiros. Ainda que sejam incompetentes, mesmo que estejam próximos da idiotia sem retorno, desde que apresentem as celebradas qualidades de, no fundo, serem bons rapazes tudo o resto se torna secundário.

Mourinho não era nada disso. Não herdou, fez-se à sua custa, apostava no seu mérito, arriscava, não fingia, era desassombrado no que dizia, não era humilde e nunca quis ser simpático.

Mourinho era um líder, um homem atípico, um português fora do tempo e do espaço, deslocado da nossa subcultura miserabilista, estatista e compadrista - um exemplo daquilo que podíamos ser se não fossemos aquilo que somos.

Mas foi o melhor treinador de futebol que já passou por Portugal. Fez excelentes os jogadores bons, e fez bons dos que eram medianos. Não gostava dos medíocres, dentro e fora do campo.

E estes nunca lhe perdoaram.

A mim, isso não me importa. Não quero saber se o profissional que cumpre e que vence, sabe ou não celebrar. Não quero saber se o treinador do meu clube é um tipo porreiro - quero é que seja competente!

Não me importam as simpatias e a demonstração de afectos - gosto é que o meu clube ganhe, limpamente.

Por isso, já estou em saudade de José Mourinho.

Porque, angustiadamente, ainda me lembro dos dois treinadores que o antecederam e o estado execrando como a equipa então jogava.

Por isso também me doeu que gente do meu clube resvalasse para as velhas tácticas de donos de prostíbulos - pelos vistos nunca esquecidas, apesar dos supostos enobrecimentos adquiridos ao se juntarem a políticos, celebridades e outros pavões -, usando ameaças e venenos brasileiros com nomes eslavos [CORRIGIDO] de terceira categoria, atacando o homem na sua mais restrita intimidade.

E não percebendo que o melhor treinador do mundo merecia ter saído daqui a bem e em bem, levado em agradecidos ombros, em vez de rodeado por seguranças contratados.