*Corrigido
A notícia referida nesta posta da Helena Matos parece, de facto sensacionalista. Como referiram vários leitores nos comentários, a penhora de créditos é uma pratica antiga, usada quer nas cobranças de créditos fiscais, quer nas cobranças de créditos particulares.###
Basta ler a actual redacção do artigo 224 do CPPT. O que a proposta de LOE2008 faz é revogar as alíneas a) e e) daquele artigo, que rezam assim:
A penhora de créditos faz-se por meio de auto (...)
a) Do auto constará se o devedor reconhece a obrigação, a data em que se vence, as garantias que a acompanham e quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução;
e) Se negar a obrigação, no todo ou em parte, será o crédito considerado litigioso, na parte não reconhecida, e, como tal, será posto à venda por três quartas partes do seu valor.
A eliminação da primeira alínea dá a entender que o contribuinte deixa de poder negar o crédito, isto é, de poder afirmar que nada deve ao contribuinte faltoso. Tal, porém, não é verdade, já que a redacção do corpo do n.º 1 também foi alterada (cf. art.º 81.º da proposta de LOE), remetendo agora para o código de processo civil, onde a matéria é tratada com mais detalhe (art.ºs 856.º e ss.), reproduzindo, quase na íntegra, as alíneas agora revogadas, com duas diferenças: 1) a declaração da inexistência da dívida pode ser nos dez dias subsequentes; Deixa de ter de sr feita no "auto de penhora" porque o auto também desaparece, dada a nova redacção do artigo 215.º do CPPT. O objectivo parece ser o usar com mais intensidade os meios electrónicos, eliminando-se certos actos em papel, como o tal "auto de penhora". 2) o crédito litigioso (quando se declare que a dívida não existe) pode ser posto à venda por menos de 3/4 do seu valor. Ou seja, a alteração pouco adianta face à situação actual, no que respeita à posição do terceiro colocado nesta situação.
Assim, aparentemente, o parágrafo final da notícia não tem qualquer fundamento. Porém, em matéria de direito fiscal, é sempre muito complicado adiantar interpretações...
Porém, a proposta acrescenta uma nova alínea ao artigo 224.º:
f) Inexistindo o crédito ou sendo o seu valor insuficiente para garantir a dívida exequenda e acrescido, o órgão da execução fiscal pode notificar o devedor da penhora de créditos futuros até àquele valor, mantendo-se válida a notificação por período não superior a um ano, sem prejuízo de renovação.
Provavelmente, era a este aditamento e não às alíneas revogadas que se referia a notícia. A penhora de créditos futuros não é propriamente uma novidade. Já acontecia, por exemplo, com salários ou rendas futuras. Mas com esta extensão aparente, sem a exigência de que se trate de rendimentos periódicos, pode, de facto levantar algumas dificuldades e permitir, até alguma má-fé pelos operadores económicos. Uma empresa, notificada nestes termos, pode, por exemplo, proceder a uma encomenda de mercadorias sabendo, de antemão, que não vai pagar directamente ao fornecedor, mas entregar antes o preço ao fisco.
Bem mais perigosa é a possibilidade de as citações e notificações em processos de natureza fiscal poderem passar a ser feitas por meios electrónicos, em termos a definir por Portaria, resultante das alterações aos artigos 38.º e 191.º do CPPT, permitindo-se que tais notificações sejam equiparadas a cartas registadas com aviso de recepção. Dependendo daquilo que constar da tal Portaria, podem ser sacrificados intensamente os interesses dos contribuintes, que poderão ter grandes dificuldades em provar que não receberam as notificações do fisco. Por exemplo, se uma empresa que seja notificada por meios electrónicos da penhora de um crédito de um seu cliente nada disser no prazo de dez dias (porque a comunicação electrónica "se perdeu"), o fisco passa a considerar, para todos os efeitos, que a dívida existe, deixando a empresa de poder, depois, provar que nada devia ao contribuinte faltoso, o que pode ter consequências inesperadas no mercado.