25.5.06

O Problema Amaral

Em permanente crescendo de semana para semana, as análises de Domingos Amaral no Diário Económico, estão a tornar-se imprescindíveis. É certo que ainda não suprem na íntegra a saudosa lauda semanal de Fernando Rosas, no Público, mas Domingos está a tentar, esforçadamente, ocupar o pedestal desabitado. Na crónica de hoje ontem, Domingos discorre sobre liberalismo, desemprego, estado, risco e Marques Mendes. O artigo chama-se 'O Problema Liberal', mas poderia chamar-se «Eu não faço ideia do que é o liberalismo, não percebo patavina dos mecanismos do mercado de trabalho e não dou uma para a caixa sobre as causas de desemprego, mas mesmo assim tenho iiiiimeeeeensas! coisas a comunicar sobre estes assuntos».
De entre as muitas coisas que o Domingos acha, seleccionei estes achamentos como particularmente interessantes:###

1. Os principais fundamentos do liberalismo são a facilitação dos despedimentos e o peso do estado.

2. Se o sector público não despede ninguém e o desemprego cresce, o problema está no sector privado, que despede à farta. Se lhes deram liberdade para despedir mais, onde é que vamos parar? Combate-se o desemprego impedindo os despedimentos.

3. O excesso do estado é uma bênção. Se o estado emagrecer, há mais desemprego.

4. Os eleitores não gostam do discurso liberal. Este ponto é crítico para Marques Mendes. Marques Mendes é liberal. Marques Mendes não deve dizer coisas liberais porque perde votos. Os liberais devem mentir aos eleitores, se querem ganhar eleições,

5. A globalização, os chineses, o euro e os países de leste são tudo realidades liberais que aumentam o risco das nossas vidas, algo que nós não queremos.
Ao Domingos, passa-lhe completamente ao lado que:

1. O desemprego, mais do que ocasionado nos despedimentos, prospera devido à não renovação de postos de trabalho. O atrofiado nascimento de empresas modernas é consequência das leis laborais rígidas, de sistemáticos bloqueios ao investimento, de uma carga fiscal asfixiante e muitas vezes suficiente para inibir decisões de investimento, do peso burocrático e dos ónus associados ao mau funcionamento da administração pública, da lentidão caracoliana da justiça, do instinto proteccionista do estado a quem já está instalado e das convicções de fé políticas de quem nos governa.

2. Risco e rendimento estão intimamente ligados. Se Domingos quer uma sociedade sem risco, pede uma sociedade que não aposta, timorata e com medo do futuro. Dessa sociedade só se pode esperar estagnação e atraso. A sociedade sem risco já foi várias vezes posta em prática e os países de leste foram um excelente exemplo, durante décadas. Pelo contrário, a geração de riqueza brota do gosto pelo risco e da expectativa de remuneração das apostas por quem não quer viver em hibernação. Uma sociedade que valoriza o risco, promove a livre iniciativa e protege os audazes é sempre uma sociedade mais interessante do que aquela que promove o imobilismo patrocinado pelo estado. Basta olhar para o mundo e ler.

3. A sociedade sem risco que o Domingos aplaude, destina-se apenas a trabalhadores da função pública e a empregados do sector privado. No sector público, o baixo risco para o funcionário é o alto risco do contribuinte. No sector privado o menor risco do empregado está associado um maior risco para o empregador. E quem compra produtos de alto risco no mercado, exige sempre o devido desconto, baixando as remunerações oferecidas. É por isso que os salários do sector privado já são 50% inferiores aos do sector público, onde o contribuinte paga e cala. Por outro lado, nem todos os actores do mercado de trabalho pretendem um risco nulo nas suas vidas. Há quem prefira mais risco a troco de mais salário mas é impedido pela legislação que o Domingos defende.

4. Um funcionário a mais no sector privado é apenas um desempregado mantido artificialmente no rol de salários duma empresa, que se substitui ao estado no pagamento do subsídio de desemprego, até à hora da falência. O excesso de funcionários na função pública são desempregados artificiais que não contam para as estatísticas de desemprego mas são igualmente suportados pelos contribuintes. Na lista do desemprego, pelo menos, ganha-se alguma motivação para o salto desejável para o sector criador de riqueza.

5. Domingos não se apercebeu da sua própria falácia quando escreveu "o desemprego nos últimos anos tem aumentado sempre e no entanto os liberais continuam a dizer que é preciso facilitar o despedimento" ? Então, Domingos, seguindo o seu pensamento, se as leis são rígidas, porque é que o desemprego cresce?

6. O Domingos não vê qualquer relação entre o nosso estado mastodôntico e o empobrecimento gradual a que temos assistido e diz que ninguém vota em quem proponha alterar o status quo porque ninguém quer aumentar o risco nas suas vidas. Pobrezinhos mas sossegados. Tal e qual como Salazar gostava.

Enfim, tal pai tal filho. Infelizmente ainda faltam 7 6 dias para a próxima crónica. Nos entretantos, temos o Inimigo Público na sexta feira, para nos entreter.