13.2.07

MARIA DE LURDES PINTASILGO

... há quase 30 anos, entre nós, foi a representante mais ilustre de uma extraordinária moda (não chegou, sequer, a corrente) que tentou fazer a ligação de conceitos opostos, i.e. a integração coerente entre o marxismo e o cristianismo de raiz católica. Este esforço, que obteve algum êxito pontual no final dos anos 70, designadamente por parte daqueles marxistas, na sua maioria cinicamente desprovidos de qualquer laivo de fé no sobrenatural (não era o caso de MLP), mas que entendiam ser impossível a tomada democrática do poder político nos países em que a maioria da população professava o catolicismo sem esta peregrina demonstração de síntese dos contrários. Por isso, torceram o marxismo até ao ponto deste deixar de o ser; e, também, encaracolaram totalmente a ideia de catolicismo, ultrapassando todos os limites da decência cristã. Sem surpresa, o resultado desta tentativa impossível de união não só se revelou mais complexo do que cada um dos seus elementos integradores como, pior, estes são plenamente desmentidos por aquele. Não se tratava de uma nova filosofia política; nem sequer de um avanço teológico ou de outra compreensão da ética católica - pura e simplesmente, resumia-se a oportunismo político feito de um marketing à medida daquele tempo que pretendia vender o marxismo no mercado relevante da religião. Por meros intuitos de poder e, não o esqueçamos, de melhorar os índices de sociabilidade dos seus protagonistas (embora alguns fossem mesmo crentes, como, repito, era o caso de MLP).
Hoje já quase ninguém se lembra desse disparate datado. Mas é bom lembrar que esforços semelhantes estão hoje a ser ensaiados - desta vez, o produto a feirar é uma versão meia esdrúxula de liberalismo travestido em ridículas roupagens de sobrenatural. As intenções da operação são as mesmas. As dos protagonistas também. O resultado, antevejo, ainda conseguirá ser mais patusco e precário do que a experiência em que se filiou.