11.12.06

ABC dos Grande Números

Artigo publicado na Dia D, Público, em 8 de Dezembro de 2006

Para muitos portugueses, qualquer número acima de um milhão, cai na categoria das quantidades transcendentes. Este artigo pretende trazer alguma luz sobre as escalas dos números grandes. Números como, por exemplo, 20.000.000. Vinte milhões. Este é o valor estimado em euros para o investimento no Túnel do Marquês, antes de derrapagens (aD) e antes de Sá Fernandes (aSF). Apesar da grandeza aparente do número, nem chega a ser ¼ do custo do funcionamento anual da Assembleia da República, orçamentado em 85.000.000 de euros.

Subindo para os 9 dígitos, aparece-nos o custo da Casa da Música, depois de derrapagens, 112.000.000 de euros. Cerca do triplo da estimativa aD. Ou seja, esperava-se que a Casa custasse 1,8 túneis (aD, aSF) mas ficou por 5,6. Derrapagem normal, para Portugal. ###
Logo a seguir deparamos com 130 milhões, montante com que se poderia comprar um computador a cada aluno do 2º ciclo do ensino básico, e que representa também a dívida total da lista pública de devedores ao fisco.

O gigantismo dos números começa a esmagar-nos quando lemos na imprensa que os créditos recuperados pela Segurança Social em 2006, por acção do Super-Cobrador, atingiram o valor recorde de 200 milhões de euros. 10 túneis (aD, aSF) recuperados num só ano. Quase o Rendimento Social de Inserção para 2007, o que equivale a 13 túneis (aD, aSF), 3 Assembleias da República ou 2 listas de devedores ao fisco. São 260.000.000 euros, o mesmo que o Euro 2004 bebeu nos cofres do estado.

3 Casas da Música ou 18,5 Túneis (aD,aSF), é o valor total das receitas arrecadadas em 2005 pela CP e pelos Metros de Lisboa e do Porto, 370 milhões de euros. Subindo mais um pouco nesta viagem aos grandes números ignorando os 500 milhões do PIB de Cabo Verde, chegamos a outro interessante montante ferroviário, o valor dos prejuízos e subsídios anuais da CP e da Refer, 600 milhões de euros. Com o que estas duas empresas custam aos contribuintes, poderíamos construir nada menos que 30 túneis (aD, aSF) ou 5 Casas da Música, todos os anos.

A caminho dos 10 dígitos, passamos pela única grande obra pública portuguesa sem derrapagens. A maior ponte da Europa, à data da inauguração, custou 900 milhões de euros, cerca de 1/6 do que já poupámos para ajudar a garantir as nossas reformas. O valor total do Fundo de Capitalização da Segurança Social no fim de 2004 era de 5.813.615.814 euros, isto é, aproximadamente 290 túneis (aD, aSF), 52 Casas da Música, 44 listas de devedores ou 12 PIBs de Cabo de Verde.

Foram precisos 10 longos anos para conseguir tamanha poupança, mas este valor é, curiosamente, muito semelhante à estimativa do famigerado défice das contas públicas só para 2007. Num só ano, o que o nosso estado gasta a mais do que o que pode, é igual ao que poupou e capitalizou numa década. Auspicioso.

Subindo mais alguns degraus, entramos nos números de 11 dígitos. Por exemplo, 10.856.104.494. Estes 542 túneis (aD, aSF), 83 listas de devedores ou 42 anos de Rendimento Social de Inserção, são o resultado da nossa aposta estratégica na ferrovia. Rrepresenta o passivo acumulado das empresas Refer, CP, Metropolitano de Lisboa e Metro do Porto, no fim de 2004. Quase onze mil milhões de euros, ou onze biliões para os americanos.

Termino esta viagem com outra gigantesca cifra. 14.000.000.000, por extenso, catorze mil milhões de euros. Este competidor na esfera galáctica dos grandes números corresponde a 700 túneis (aD, aSF) e seria suficiente para prolongar a controversa obra desde o Marquês até Biarritz. É também equivalente a 108 listas de devedores ao fisco, 83 orçamentos do Ministério da Cultura, 56 campeonatos da Europa de Futebol, 38 anos de facturação da CP e dos Metros, 28 anos do PIB de Cabo Verde e 2,5 vezes a poupança de uma década da Segurança Social. Também seria suficiente para comprar um milhão e meio de carros utilitários, 100.000 apartamentos em Benidorm, 100 milhões de viagens de avião a várias capitais europeias ou 140 grandes hospitais e é equivalente a 60 vezes o montante que o casal Bill e Melinda Gates disponibilizaram para o combate à Sida e que fez capa de várias revistas globais.

Este número, corresponde ao valor estimado para a OTA e para o TGV. E é um número aD e aSF, o que quer dizer que, se tivermos sorte, fica no dobro.