28.8.04

BREVES NOTAS BREVES SOBRE O «BARCO DO ABORTO»

1. A livre circulação de pessoas dentro do espaço comunitário aplica-se em Portugal em virtude do Acordo de Adesão à Convenção de Schengen, assinado pelo nosso Estado em 25 de Junho de 1991, bem como pela sua incorporação no direito comunitário através do Tratado de Amesterdão de 1997, mais precisamente, pelo «Protocolo que integra o Acervo de Schengen no âmbito da União Europeia» anexo a esse tratado.
2. Em virtude destes factos, o Tratado da Comunidade Europeia e o Tratado da União Europeia estatuiram essa liberdade, entre outros, nos artigos 18º TCE e 2º TUE.
3. A liberdade de circulação e permanência em território da União não desobriga os seus beneficiários de se furtarem ao cumprimento da lei nacional dos Estados comunitários onde se encontrem. No caso vertente, da criminalização de práticas abortivas.
4. Não existe qualquer contradição do direito comunitário, nem violação das suas normas, pelo facto de não se autorizar a entrada em território nacional de quem venha expressamente promover a prática de crimes contemplados na legislação portuguesa. O princípio do primado do direito comunitário sobre o direito nacional aplica-se no âmbito do primeiro pilar da UE (TCE) e não no segundo e terceiros. Por outro lado, não existe qualquer disposição normativa comunitária sobre a prática do aborto, nem poderia existir no estado actual de integração. A soberania portuguesa ainda faculta às autoridades nacionais os poderes suficientes para tomarem todas as medidas que evitem a previsível prática de crimes em território português, sob a forma tentada ou consumada. A posição do governo português é, por conseguinte, legal à luz do direito interno e do direito comunitário.
5. Coisa distinta é a substância do assunto. Por mais que possa chocar a ideia de uma clínica de abortos flutuante, só por cegueira ou hipocrisia, se poderá considerá-la um exemplo sem paralelo. Basta ler os nossos jornais diários para, todos os dias, nas secções de publicidade, encontrarmos os já «célebres anúncios amarelos» de clínicas fronteiriças espanholas onde se promove o « Tratamento Voluntário da Gravidez». Esses anúncios incluem moradas, números de telefone espanhóis e portugueses, e publicam-se, repita-se, todos os dias na imprensa portuguesa que, recentemente, noticiou que, só em duas dessas clínicas, no ano passado, abortaram duas mil mulheres portuguesas. Não consta que as nossas autoridades tenham tomado qualquer diligência junto das clínicas, do Estado espanhol, dos jornais que publicam os anúncios, ou dos portadores dos telefones indicados.
6. Há, por isso, que aproveitar o balanço da patrótica medida tomada hoje pelo governo português, e começar a proibir a deslocação a Badajoz e a Vigo de meninas e senhoras que tenham o ciclo menstrual em atraso. Para o efeito, todas elas deveriam ser devidamente fiscalizadas por GNR's de serviço e competentes laboratórios de análises fronteiriços.