28.3.06

VIOLAÇÃO DE SIGILO - FORMAL OU MATERIAL?

Na edição de ontem do Público (sem link) surge um artigo intitulado "O Político Ascendente", da autoria do psiquiatra Jaime Milheiro.
O texto contém 3 pontos. Nos dois primeiros o autor narra uma história acerca das fraquezas pessoais e debilidades familiares de um político. Este nunca é identificado. Mas os dados oferecidos são tão abundantes e circunstanciados que não parece ser excessivamente difícil o pleno reconhecimento da personagem aí descrita, caso a situação não seja apenas figurada - e tudo, no tom expositivo e exemplificativo do texto, parece indicar que se tratam de factos reais.
Resta saber se o autor deles teve conhecimento acidental ou profissionalmente. Na segunda hipótese, que - insista-se -, é aquela que o texto parece querer induzir no leitor mais descomprometido, podem colocar-se gravíssimas questões de violação de sigilo profissional.
Mas se este psiquiatra tiver tido conhecimento das situações, que entendeu por bem apregoar nas páginas de um jornal nacional, através de fonte particular, por exemplo por intermédio de um colega, poderemos, ainda, estar diante de uma grosseira violação ética das relações de confiança entre médico psiquiatra e um paciente. Directa ou indirectamente.

O ponto 3 parece ser mais complicado. Fala concretamente de Sá Carneiro. Descreve conversas entre este e o autor. Confissões que o político lhe terá feito "num momento depressivo".
Apenas restam dois tipos de conclusões:
- Ou Sá Carneiro o consultou profissionalmente e terá sido nesse âmbito que produziu as afirmações agora citadas - nesse caso, a violação do sigilo profissional torna-se evidente e não deverá ser atenuada pela morte do paciente;
- Ou, então, essas confidências em momento depressivo foram feitas no contexto de uma amizade entendida como suficientemente profunda para fundamentar essa abertura de estado de alma. Subentendem confiança pessoal e um tipo especial de recato que o tempo não apaga. E, se assim tiver sido, a única violação presente no texto é a do conteúdo daquilo que mais claramente pressupõe uma amizade.
E, dessa forma, o gesto nada mais será do que uma simples pulhice...