18.9.06

No melhor pano cai a nódoa (ou a "regionalização" e o futebol)

João Gonçalves, do Portugal dos Pequeninos não gosta do presidente do FCP. Suspeito bastante que também detesta o próprio Futebol Clube do Porto. E que nunca sentiria simpatia por um presidente desse clube, fosse quem fosse. Mas posso estar enganado.
De qualquer modo, João Gonçalves está no seu pleno direito. E no seu exercício concreto resolveu desancar as últimas declarações de Pinto da Costa a propósito da "Justiça". O que até não estaria mal, não fossem as confusões desmesuradas e os chavões requentados em que incorre.
A certo passo, JG faz a seguinte classificação logo seguida de um tremendo agouro: "... a regionalização, essa desgraça inaudita que reproduziria "pintos da costa" em miniatura por esse país fora...".
É de deixar qualquer um perplexo. ###
Cuidava eu que Pinto da Costa era presidente de um clube de futebol. Muito importante, sem dúvida, mas, ainda assim, um simples clube desportivo. Não é nem nunca foi autarca. Nem nunca se candidatou a tal lugar.
Julgava, ainda, que a regionalização se resumia à transferência de atribuições do Estado-Governo para outras entidades administrativas dotadas de autonomia (administrativa e política), situadas em plano intermédio entre as actuais autarquias locais e o Estado central e que passam a deter o verdadeiro poder de decisão nessas matérias descentralizadas dentro das circunscrições territoriais a que pertencem. Modelo organizativo da administração pública que existe, pacatamente, há várias décadas na esmagadora maioria dos países europeus e naqueles outros com os quais tanto gostamos de nos comparar.
Mas o João Gonçalves atarantou-me. Afinal a coisa tem a ver com futebol. A regionalização reduz-se à multiplicação de presidentes do FCP em escala liliputiana. Então, está bem, começo a perceber toda esta resistência em manter a nossa Administração num modelo que fez furor nos saudosos anos 30 do século passado...
Mas, mesmo que se queira conceder alguma lógica à argumentação de JG na sua relação entre a divisão administrativa do território e as glórias e desventuras do dirigismo desportivo, permanecem sempre certas dificuldades.
É que andava eu ciente, até agora, que a ascensão de Pinto da Costa e todos os seus inúmeros sucessos desportivos tinham acontecido neste bastião da centralização mais convicta, nesta espécie de último e teimoso enclave de resistência centralista - tipo Coreia do Norte face à Democracia - que é Portugal. De facto, Pinto da Costa vivificou aqui, neste sistema, neste status quo centralizado.
Não será, até, exagerado dizer que é um produto do país que temos: i.e., o lugar mais centralizado da Europa. Ou mesmo, que sem a mentalidade reclusa e com desagradáveis ressonâncias totalitárias que é apanágio dos defensores do centralismo, Pinto da Costa nunca seria o que é hoje neste país.
Portanto, João Gonçalves, pergunto-lhe - não estará a misturar planos distintos? Desde logo, a confundir as consequências com as causas? E a vaticinar para a mudança os defeitos que pertencem inteirinhos ao que está? Qualquer coisa como que a dizer: "não podemos ir por aí senão ainda ficamos onde estamos"...?