30.6.05

AUTO-ESTIMA

Os enfermeiros, os polícias e os professores estão em greve. Os transportes públicos também. A função pública, sem excepção, quer parar. Mais tarde ou mais cedo, a greve geral será inevitável.
No sector privado as coisas não estão muito melhor para o governo: patrões e sindicatos, por razões diametralmente opostas, contestam as suas decisões; os empresários queixam-se da sobrecarga fiscal e os consumidores da carestia de vida e dos baixos salários. Até a banca, importunada sucessivamente pelo Dr. Jorge Coelho, pelo Sr. Presidente da República e pelo Ministro António Costa, ameaçou com o fim dos cheques, esse idóneo meio de pagamento de quem não tem dinheiro para pagar o que compra.
Subitamente, parece que o governo está no fim de uma longa e desgastante legislatura. Na melhor das hipóteses, os mais perspicazes concluíram já que entre este e os anteriores as diferenças são de pouca monta, mais de estilo do que de conteúdo, e que, no fim de contas, governem uns ou outros, parecemos condenados às mesmíssimas medidas impopulares.
Tanta contestação mereceria alguma reflexão. Talvez fosse bom perguntarmo-nos porque estranha razão têm os políticos, uma vez no governo, esta desagradável mania de fazerem tudo ao contrário do que nos prometeram e irem-nos aos bolsos em vez de os encherem de ouro e jóias.
Seria, porém, uma pergunta de retórica e todos nós, mais consciente ou inconscientemente, sabemos disso. Na verdade, Portugal é um país pobre, com décadas sucessivas sem uma estratégia nacional que lhe dê um rumo, que tem vivido à míngua das gordas esmolas de Bruxelas. Estas estão a acabar e valha a verdade, enquanto duraram, também não nos serviram de muito, porque as não soubemos aproveitar. O país não tem riqueza própria e não a produz, logo, vive a gastar o que não tem. Não fora a União Europeia e estaríamos há muito com panelas e tachos na mão, no meio das ruas, aos urros e aos berros, como recentemente sucedeu na Argentina. Se a União fraquejar, como se prevê, esse cenário será uma fatalidade. Com este governo ou com outro qualquer.
Sirva ao menos tudo isto para que os políticos compreendam que não podem continuar a vender ilusões que antecipadamente sabem não poder cumprir. Se isso for possível durante esta legislatura, já não daremos o tempo inteiramente por perdido e, quem sabe, poderemos ao fim de tantos anos aspirar a alguma seriedade. O que faria bem à nossa auto-estima e levaria a que lá fora nos começassem a olhar com algum respeito.