28.9.04

MARAVILHAS E PRODÍGIOS

Com a franqueza que lhe é habitualmente reconhecida, o meu amigo CAA, em «post» anterior editado neste «blogue», manifestou algum entusiasmo pela vitória do Engº José Sócrates nas eleições internas do PS, chegando mesmo a dizer que os socialistas eram menos hipócritas do que os social-democratas e democratas-cristãos na arte de governar Portugal. Por conseguinte, conclui, para um liberal acaba por ser preferível ter os primeiros à frente do governo do que os segundos, poupando-se assim certos desgostos e mal-entendidos.
Ultrapassando a questão, cada vez mais formal (reconheço), do paradoxo da governação socialista poder agradar a um liberal, eu diria apenas que, quanto ao Engº Sócrates tudo, ou quase tudo, está politicamente em aberto.
E isto porque, de facto, pelo que se viu e ouviu da campanha no interior do PS, não se lhe conseguiu perceber uma única ideia para o País, qualquer que fosse o assunto tratado. De resto, diga-se em homenagem à verdade, que nem ao Engº Sócrates nem a nehum dos outros dois candidatos. Mesmo num daqueles mapas sinópticos sobre as posições relativas dos candidatos em relação a assuntos da actualidade nacional publicado num jornal qualquer, as respostas não ultrapassavam uns lacónicos «sim» e «não» («É a favor ou contra a interrupção voluntária da gravidez?»; todos em coro: «SIM!»; «é a favor da guerra no Iraque?», todos em coro: «NÃO!») Pior ainda: com nuances quase indetectáveis, todos respondiam invariavelmente o mesmo, não se entendendo, de facto, porque se apresentavam em separado à liderança do partido.
A verdade é que assistimos a uma luta interna para tomar o poder no PS, aliás, respatabilíssima, e à marcação de territórios próprios. O Engº Sócrates ganhou folgado, o Dr. Alegre conquistou uma razoável quota no mercado socialista (que lhe permite almejar a paragens presidenciais com que nunca antes sonhara) e o Dr. Soares espatifou um pequenino, mas influente, pecúlio político-partidário que durante anos acumulara. Quanto ao mais e ao resto, o que contou para a decisão foi a capacidade que os militantes e dirigentes socialistas intuiram em Sócrates para arrebanhar eleitorado e ganhar eleições, agora que um novo ciclo eleitoral vai começar a sério. O homem, ao contrário dos outros, sai bem na televisão, e isso é o que conta, hoje em dia, nesta nossa «democracia» mediatizada. O resto, concretamente o que fará ou deixará de fazer se e quando chegar ao poder, logo veremos. Mas, numa coisa julgo que estamos de acordo: não são de esperar maravilhas nem prodígios, pelo menos, muito diferentes daquilo a que estamos habituados.