21.7.05

2006: MUDANÇA DE REGIME



A queda de um governo recém nomeado e com uma confortável maioria parlamentar, a crise evidente do que o substituiu, também este com maioria absoluta na Assembleia, ao fim de escassos três meses e meio de mandato, a profunda crise económica sem fim à vista e a generalizada desconfiança do eleitorado nas instituições representativas, demonstram à saciedade que o actual regime, em vigor desde 1975, se esgotou e precisa de ser urgentemente modificado.
Neste particular aspecto, o gesto presidencial de dissolução da Assembleia da República sem motivo formalmente válido, abriu a caixa de Pandora que poderá conter a solução transformadora do regime. Na verdade, o protagonismo que a Constituição da República reserva ao Chefe de Estado é bem superior às interpretações minimalistas e sonolentas que os dois mandatos de Mário Soares e o primeiro e parte do segundo, de Jorge Sampaio fizeram acreditar. Nesse compasso de tempo, passaram vinte anos e, durante eles, gerou-se uma cultura de minimalismo presidencial, em que o Chefe de Estado pouco mais era do que um moderador, quando, na verdade, ele é, com o Parlamento, um dos dois sustentáculos do sistema de governo e da legitimidade de quem exerce funções governativas.
Ora, essa pequena subtileza não terá passado despercebida ao Professor Aníbal Cavaco Silva, que não é certamente um homem vocacionado para ser a «Rainha de Inglaterra» dos nossos próximos dez anos. Nem, tão pouco, é isso que o eleitorado espera dele. De resto, as anormais percentagens de possíveis votantes na sua candidatura presidencial, significam um largo descontentamento com o que se tem passado no país e a convicção de que o homem que o pôs «na ordem» durante dez anos, o volte a fazer, desta vez, a partir de Belém e não de S. Bento. Isso, muito provavelmente, corresponderá também às intenções do Professor, sendo, de resto, que elas encontram pleno suporte constitucional.
Por isso, o PS, o PSD e o CDS, ou seja, os partidos do chamado «arco governativo», que se cuidem. Com a eleição presidencial de Cavaco Silva terminará o ciclo do regime em que o poder governativo lhes estava inteiramente confiado. Bem diz Freitas do Amaral, certamente lembrando-se do gaulismo que, em tempos, tanto admirou, que tudo se encaminha para que a próxima eleição presidencial seja um plebiscito aos poderes do novo presidente. Dentro de pouco tempo, começará um novo ciclo da III República Portuguesa, com pendor fortemente presidencial. E o seu protagonista chamar-se-á Aníbal Cavaco Silva.