13.3.06

OPAs, contra-OPAs e centros de decisão

A OPA lançada pela Sonae sobre a PT tem dado azo a variadíssimas especulações, quer sobre a dita, quer a propósito de outras que se estariam a preparar tendo como alvo empresas nacionais "expostas". Daí a agitar-se o espantalho da perda dos sacralizados centros de decisão, vai um passo.

Mas porque existem OPAs? Elas mais não são do que um efeito da existência de mercados de capitais abertos. No seu móbil figuram sempre o crescimento, a racionalização e, obviamente, relações de poder pessoal dos gestores que lideram o raid. Elas surgem porque quem as lança detecta ineficiências nas empresas-alvo as quais, por várias razões em que se destaca a gestão ineficaz, têm as suas acções cotadas a desconto face ao seu valor potencial. O raider que arrisca pagar um prémio face à cotação do mercado, acredita poder implementar uma determinada estratégia que lhe rentabilizará o investimento. É dos livros que a estratégia passa geralmente pelo "retalhar" da empresa ou grupo adquirido, alienando "lastro" e metendo "combustível" que será utilizado na racionalização daquilo que para o raider são os negócios core. No caso da OPA sobre a PT e tendo em conta o que já foi tornado público, a Sonae está fundamentalmente interessada no negócio das redes móveis e pretenderá alienar a rede fixa e a operação no Brasil, esta demasiado predadora de capitais. A venda de partes isoladas terá um valor acrescido para alguns interessados e permitirá financiar parte da OPA sobre o grupo PT. Deste "baralhar e voltar a dar", resultam ganhos imediatos para os accionistas das empresas-alvo, prováveis ganhos a prazo na eficiência de todo um sector e riscos para os accionistas da empresa oferente, que podem ver as suas acções desvalorizadas se a estratégia implementada não se revelar a mais correcta.

Para a economia como um todo, pode haver ganhos induzidos muito significativos pelo acréscimo de capitais decorrentes de uma OPA e que são distribuídos de imediato pelos accionistas das empresas-alvo. O acréscimo de capitais será maior e mais perene se o oferente for uma entidade estrangeira. Neste caso, o mercado será sempre condicionado pelo proteccionismo dos poderes públicos relativamente aos lobbies que os influenciam ou dominam.

Imaginemos, por hipótese académica, que uma entidade estrangeira lançava uma OPA sobre 100% do capital da EDP. Considerando um prémio de 20% sobre as cotações actuais, tal implicaria a entrada em Portugal de qualquer coisa como 11 mil milhões de euros, mais do que todas as ajudas comunitárias que o país recebe num ano. Para os defensores dos "centros de decisão nacionais" seria um enorme trauma e tudo fariam para que o governo bloqueasse a sua concretização, o que aconteceria com grande probabilidade. O efeito imediato seria o atraso na racionalização do sector energético e a continuação de um monopólio que penaliza todos os consumidores. Entretanto, a 800.000 accionistas da EDP ficaria vedado o acesso a capitais frescos, grande parte dos quais poderiam ser reinvestidos de forma descentralizada em diferentes sectores de actividade. Não tenho dúvidas que os efeitos para a economia de tais reinvestimentos seriam bem mais benéficos do que os de quaisquer planos tecnológicos ou discursos de confiança. Seria, no fundo,
uma forma não socialista de pensar o mercado.