16.12.04

Racionalidades Imobiliárias

Indigna-se Vital Moreira a propósito da possível venda dos edifícios onde estão sedeados o Instituto Camões, o Instituto da Vinha e do Vinho e o Instituto dos Vinhos do Porto e do Douro:

É revoltante! Que racionalidade pode justificar tal alienação, tratando-se, como se trata, de edifícos públicos de grande qualidade arquitectónica e de grande simbolismo para os respectivos sectores (nomeadamente os relacionados com o vinho)? E porquê esses edifícios e não outros, menos simbólicos? Sendo edifícios necessários para o funcionamento dos organismos públicos neles sedeados, quanto não vai o Estado ter de pagar em rendas no futuro para manter esses organismos nos mesmos edifícios ou noutros?
Maldito défice, mais a incompetência de quem se colocou na situação de ter de recorrer a tais medidas para o respeitar!

Claro que existe racionalidade! O negócio do vinho, como aliás qualquer outro, não vive da qualidade arquitectónica ou do grande simbolismo dos imóveis onde estiverem sedeadas as suas entidades reguladoras. Vive da qualidade dos seus produtos, da satisfação que estes proporcionam aos seus consumidores e da racionalização dos seus custos de actividade, entre os quais se contam as taxas a pagar aos Institutos reguladores.
E se o Estado vender esses imóveis e não outros menos simbólicos é porque existirá alguém capaz de rentabilizar o simbolismo. O que, diga-se, é normal. Qualquer património imobiliário em mãos privadas é uma potencial fonte de receita. O mesmo património, nas mãos do Estado, é sempre uma fonte de despesa.

Também não me parece chocante que o Estado pague rendas pelos edifícios que ocupa. É uma forma daquele funcionar a custos de mercado e conhecer mais facilmente os seus reais custos de funcionamento. Sousa Franco tinha aliás esse objectivo, quando foi ministro das finanças. Sempre que um dos custos relevantes e indispensáveis para qualquer actividade como os custos de instalação, assumem valor nulo ou quase, o resultado será inevitavelmente o desperdício de recursos em consumos desnecessários e muitas vezes extravagantes. No caso em apreço, teríamos provavelmente, e a título de exemplo, pessoal excedentário nos Institutos apenas para mostrar que se dá uso a um edifício simbólico. Este, seria decerto muito mais bem aproveitado e preservado se acolhesse uma cadeia retalhista de referência ou um hotel de charme, criando-se assim riqueza e empregos em actividades produtivas. Ou seja, há custos escondidos e que toda a comunidade paga com a ocupação pelo Estado dos tais edifícios simbólicos e de grande qualidade arquitectónica: o seu não aproveitamento em actividades alternativas e geradoras de riqueza.

Os burocratas dos Institutos (se é que uns e outros fazem falta, mas isso é outra questão), poderiam ficar muito dignamente instalados num edifício de escritórios situado algures na Régua, no vale do Dão, no Alentejo ou em qualquer outro sítio onde se desenvolvesse a actividade que pretendem regular. A renda deveria ser duramente negociada com o senhorio (o Estado é - deve ser - o melhor pagador, portanto constitui um inquilino de risco nulo) e os burocratas deveriam estar sempre disponíveis para se mudarem para o edifício ao lado ou noutro qualquer vale vinícola, caso a renda fosse mais favorável.

Já agora, o défice também resulta em grande medida destas coisas que se foram acumulando ao longo dos anos - Institutos que não se sabe para que servem a ocuparem edifícios faustosos e outras extravagâncias do género.