13.7.05

Café Blasfémias - por um tal de João Miranda

O liberalismo é uma filosofia política e não uma lista de receitas para governar. Como filosofia política, o liberalismo procura responder à pergunta: quem tem legitimidade para decidir o quê? A resposta que o liberalismo dá: o indivíduo é a fonte de toda a legitimidade. A legitimidade dos agentes do estado devia ser legitimidade que lhes é delegada pelos indivíduos para a realização de um conjunto mínimo de funções relacionadas com a vida em comum. Os indivíduos deviam preservar as restantes competências, precisamente aquelas que dizem respeito à sua esfera de liberdade. O que foi acontecendo ao longo dos últimos 100-200 anos foi a apropriação da legitimidade individual por parte de um estado central a quem a maioria das pessoas, sem saber muito bem porquê, reconhece uma legitimidade própria. Ou seja, as vítimas passaram a reconhecer como sendo do estado uma legitimidade que lhes foi usurpada pelo estado.

Institui-se uma forma de democracia ilimitada em que os políticos negoceiam com os eleitores que recursos serão transferidos de quem para quem. Os políticos bem sucedidos são aqueles que conseguem descobrir quais os grupos menos sensíveis aos impostos e quais os grupos mais sensíveis às promessas para depois tirarem aos primeiros para darem aos segundos. Este é um defeito inerente às democracias ilimitadas e não tem nada a ver com as qualidades individuais desta ou daquela pessoa. Devemos esperar que numa sociedade diversificada existam políticos de todas as cores e feitios. Mas também devemos esperar que numa democracia ilimitada, os políticos que chegam ao poder e que o queiram conservar não sejam nem liberais nem que, na remota hipótese de o serem, queiram implementar políticas liberais. E mesmo, na hipótese ainda mais remota de as quererem implementar, não devemos esperar que implementem o liberalismo, mas, devido à própria natureza do estado e da política mediática, devemos antes esperar que implementem um conjunto desgarrado de receitas ditas liberais que fazem mais mal que bem.