Ontem, fui assistir in loco às «Noites à Direita». Café Nicola cheio, a denotar uma boa organização.
Destaco, para começar, o facto de resultar da intervenção de António Pires de Lima uma óbvia a consternação - sincera ou táctica, isso pouco importa - com o resultado da última experiência governativa. APL deixou também bem claro que as «Noites à Direita» procuram criar as bases para que, numa futura governação, exista «uma alternativa» ao Partido Socialista, alternativa essa que incorpore um ideário liberal.
As «Noites à Direita» pretendem ser um espaço de debate plural: plural, no sentido em que os seus dinamizadores incluem pessoas com filiação partidária, ou próximas do CDS-PP, como António Pires de Lima, Paulo Mascarenhas ou Filipa Correia Pinto, mas também pessoas que não estão ligadas a qualquer partido político, como Luciano Amaral, Rui Ramos, Leonardo Mathias, Pedro Lomba; plural, também, no sentido em que não se defende uma corrente de pensamento único, procurando acomodar «vários liberalismos», defendem alguns dos seus promotores. Diz ainda APL que pretende incluir no leque de promotores pessoas com outras filiações e afinidades partidárias, nomeadamente do campo do PSD.
Segui com atenção as várias intervenções - sendo particularmente feliz a do «provocador» de serviço Vicente Jorge Silva, aquele que melhor sintetizou as oportunidades e as fragilidades de um pensamento liberal em Portugal - bem como as sessões de perguntas e respostas.
As «Noites à Direita» são uma plataforma de adesão ao Liberalismo. Mas ainda não são liberais. Existe uma vontade de construir um pensamento de matriz liberal, cujos contornos ainda não estão bem definidos. Há, claramente, ainda, um certo défice de consistência ideológica. Não digo que umas «Noites à Direita» tenham de ser prelecções maçadoras sobre Smith, Hayek ou Strauss. Nem que o Liberalismo seja uma doutrina de pensamento único. Ocorre porém, que uma tertúlia, já de si, tem a tendência para «descambar» na teorização do lugar comum; ora, o liberalismo não pode ser uma coisa tão aberta, onde caibam todas as ideias e as suas próprias contradições. Todavia, é bem evidente o esforço no sentido de conseguir melhorar o debate, e isso só pode acontecer se houver uma plateia qualificada que o enriqueça.
Existe ainda um risco - bem identificado por Vicente Jorge Silva - de numa nova direita se diluirem liberalismos e conservadorismos, aspecto reforçado pelo facto de uma parte significativa da plateia ser, estruturalmente, conservadora, e que poderá ter sido a razão pela qual as Noites, inicialmente «Liberais», passaram a ser, posteriormente, «à Direita».
Este é o arranque de uma dinâmica que não sei se terá capacidade de se impor. Para que possa ter sucesso, ela terá de ser mais abrangente; a assistência era demasiado homogénea, e francamente cognotada com uma corrente do CDS-PP, apesar de existirem, também, algumas pessoas independentes e com algum peso político e cívico. É, também, visivelmente, uma plataforma que procura criar algum substrato ideológico, mas que tem um forte suporte em pessoas que, na sua maioria, estão mais vocacionadas, digamos, para a política «no plano da acção». Aspecto, aliás, que não considero negativo. Não se podem criticar os partidos por não se abrirem à sociedade civil e procurarem aí renovar o seu ideário, e depois criticar os seus agentes de tacticismo sempre que isso ocorre.
Da minha parte, o meu posicionamento é o habitual. Como disse aqui ainda esta semana, eu não tenho feitio para a «não inscrição». Não tendo eu preocupações partidárias, e estando até pragmaticamente (no sentido que lhe é dado de uma forma muito feliz por Luciano Amaral, não sei em que contexto) mais próximo do PSD, entendo ser essencial participar, debater, com civismo e espírito construtivo, nos locais onde existam pessoas interessadas em fazê-lo.
Dando a minha contribuição para o debate.
Não que me pareça que o modelo «tertuliano» seja apto a criar uma certa consistência ideológica - que, afinal, serão o objectivo das «Noites à Direita»; elas, contudo, patrocinam o despertar das consciências, alertam para os problemas, alimentam a curiosidade; no caso daqueles que já andamos nisto há algum tempo, permitem - quando essa é a vontade - criar um certo espírito de coesão, proximidade e confiança recíproca que os meios mais modernos de comunicação desvirtuam. Foi interessante, à margem do debate, conhecer algumas das pessoas qie diariamente leio (e dizem que me lêem), observadores, como eu, e alguns dos dinamizadores.
Finalmente, quero deixar bem claro que estou a começar a ficar especialmente incomodado com a forma pouco elevada como várias pessoas têm encarado o epifenómeno da «bolha liberal». Acusações recíprocas, juízos de intenção, recriminações em série, para lá daquilo que é saudável, protagonizadas por pessoas crescidas, todas elas com responsabilidades, fazem-me compreender porque razão em Portugal existe uma tão grande degradação da discussão política. Percorrendo vários blogues, fico desiludido. Não vou apontar o dedo, pois todos sabem do que é que eu estou a falar. Meus caros: em Portugal, o Liberalismo vale menos do que um terreno no meio do deserto sem água, e estão todos a degladiar-se por um punhado de areia. Existe espaço para discussão, nas «Noites à Direita», no «Café Blasfémias», nos vários blogues, na comunicação social, onde valha a pena discutir. Discutir ideiais.
Mas façam-no de uma forma que dignifique uma corrente de pensamento que, acima de tudo, consagra a Liberdade.
Rodrigo Adão da Fonseca