26.5.04

"Mães de Bragança" - a saga continua!

Acabei de ver na repetição do jornal da noite da SIC, emitido naquela outra SIC'que nunca sei bem como se chama (SIC Gold? talvez), uma peça que reavivou a velha e saloia questão bragantina que, sob a pimbística designação de "Mães de Bragança", agitou os espaços noticiosos do país, há cerca de 4 ou 5 meses atrás.

Recorde-se a matéria de facto (tal como foi sendo divulgada pela imprensa, chegando mesmo a ser debatida numa das mais surrealistas e inimagináveis "mesas redondas" ao serão, alguma vez oferecida no espaço televisivo nacional):

Na velha, pequena e fechada Bragança, em pleno coração transmontano (se bem que a escassos 20 KM da raia espanhola e a pouco mais de 60, em boa estrada, de Zamora), um belo dia, começou a florescer um novo negócio que contrastou com os hábitos duros e contidos da generalidade da população.... Bom, dado o sucesso rápido de tais actividades comerciais, talvez não tenha, afinal, contrastado assim lá muito, pelo menos com a generalidade da população masculina! Mas, voltemos aos factos: o novo negócio era o dos bares de "alterne" e a nóvel e insólita actividade, naquelas bandas, era a das respectivas "alternadeiras".
O negócio florescia, sobretudo, à custa do "efeito novidade". Mais de uma centena de jovens e belas mulheres, maioritariamente brasileiras e sul-americanas, invadiram a pacatez da cidade, aquecendo as suas noites, tradicionalmente frias e escura. Bom, até talvez nem fossem tão belas como isso (pelo menos, todas); porém, o tal "efeito novidade" deve ter ajudado a ampliar, aos olhos da população masculina, o contraste provocado pelo colorido tropical em terra de tão agreste clima!
O certo é que, rapidamente, o mercado mostrou a sua dinâmica: às tradicionais três casas de "alterne" do centro da cidade, rezam as crónicas que, em função da pressão crescente da procura, acrescentaram-se, um pouco por toda a região, inúmeros novos bares. Até em Vinhais, terra de uma beleza rara, mas contida e frugal (bem ao jeito dos ambientes de Miguel Torga), marcada pelo velho e, agora, já pouco movimentado, Seminário, nasceu e floresceu uma das mais afamadas casas de "alterne" do nordeste transmontano.

A reacção das senhoras da terra também não se fez esperar muito. Cansadas de verem os maridos abandonarem sistematicamente o aconchego dos lares, nas noites frias de Bragança, sujeitando-se aos mais que prováveis resfriados, curas e subsequentes recaídas, começaram a organizar-se, criando um verdadeiro movimento feminino de reacção, uma espécie de "contra-ataque" de amazonas da terra, contra as invasoras estrangeiras, tropicais (apesar de tudo, da História e da proximidade a Zamora, não se tratava de Castela). E começaram a apelar e a fundamentar a respectiva acção reivindicativa na moral tradicional e nos "bons costumes".
O tom foi subindo e chegou-se mesmo a reivindicar a "protecção da família como princípio fundamental, constitucionalmente protegido". As várias reportagens dos telejornais iam-nos dando conta de alguns argumentos (fundados e respeitáveis) e de outros menos sólidos e mais inverosímeis: as velhas estórias (muito frequentes no imaginário tradicional daquela região) de mulheres que faziam feitiços aos homens, manipulando as suas vontades e desviando-os, assim, inconscientemente e sem culpa do próprio "desviado", do lar conjugal!
Algumas senhoras de Bragança, organizadas no dito movimento "Mães de Bragança", começaram a usar (e bem, a avaliar pelo impacte noticioso) as técnicas da reivindicação e das manifestações político-partidárias. E pressionaram as autoridades locais - pelo menos, o Governo Civil - para agirem. Queriam por fim àquela pouca vergonha tropical em terras frias transmontanas; queriam, sobretudo, recuperar a estabilidade familiar e enxotar as tentações que, qual ímans, atraíam como autómatos os respectivos maridos e levavam-os a desleixarem os filhos em casa, nas noites escuras de Bragança.

A polícia lá pôs termo ao negócio, fechando as ditas casa de "alterne" e prendendo (pelo que percebi da peça televisiva) os proprietários, detectando, finalmente, a prática de vários crimes (o principal dos quais de lenocínio), mas, bem entendido, á boa maneira nacional, só depois de a imprensa ter mostrado reiteradamente o escândalo de Bragança.

Bom, agora, alguns meses passados o que é que os jornalistas verificaram?
Primeiro: a actividade passou-se, de armas e bagagens, para o lado de lá da fronteira. É certo que, em Bragança, os ditos bares fecharam, porém, como os "maridos de Bragança" dispõem de automóveis, passaram, agora, a deslocar-se cerca de vinte e poucos quilómetros e, à noite, continuam a frequentar a e conviver (leia-se, a gastar o dinheiro dos orçamentos familiares), do lado de lá, ou seja, em Espanha.
Segundo: o movimento de pessoas de fora - para desespero dos comerciantes entrevistados - desapareceu, voltando Bragança à velha e tradicional pacatez de antigamente.
Queixava-se um vendedor de telemóveis que o negócio decaiu, pelo menos, 25 a 30%. Os taxistas da praça, com azedume, faziam notar que enquanto há pouco tempo atrás não paravam e permaneciam estacionados na praça apenas dois ou três de entre eles, agora têm a dita praça cheia de carros parados. Uma cabeleireira local dizia que, "naqueles tempos", chegava a atender 20 clientes por dia, enquanto que, actualmente, nem por semana! E, em tempos de crise, a falta de movimento na cidade (sobretudo, depois de um período de relativas "vacas gordas") é sentida de forma particularmente aguda!

Os jornalistas da SIC percorreram os tais vinte e poucos quilómetros que, em estado de autómatos e sem vontade, os "maridos de Bragança", pelos vistos, agora fazem á noite (potenciando, naquele estado de inconsciência, a sinistralidade rodoviária que, só por acasos da sorte é que ainda não disparou em flecha!) e pararam numa pequena localidade castelhana, absolutamente rural, denominada Alcanices.
Lá deram com o primeiro bar de "alterne" transfronteiriço, pós - era Bragantina. Falaram com pessoas, com nuestros hermanos que - espanto! - ao contrário das "Mães de Bragança", só têm a dizer bem das novas e guapas jovens sul-americanas que lhes invadiram a terra! Mais ainda - provavelmente ofuscados pelo vil metal que fugiu de Bragança - dizem que são bem vindas, que dão movimento á terra, que se notam (porque a terra é pequena) e dão alegria e colorido a Alcanices, precisamente porque são jovens e guapas!
Concerteza que as ditas "alternadeiras" também já deram a volta à cabeça aos nossos vizinhos espanhóis; já os "enfeitiçaram". Só é estranho que tenham sido também mulheres (provavelmente, "mães castelhanas" de Alcanices) a dizerem isto, aos repórteres da SIC!!!

Moral da história: de Espanha, pelo menos, não devem vir bons casamentos...