29.9.04

QUID JURIS, VALETE?

Há dias fomos inundados com as resplandecentes notícias que um menino de origem portuguesa residente na Suiça tinha sido objecto de uma cura classificada de milagrosa.
Foi apenas necessário um mero instante para que a responsabilidade do prodígio fosse atribuída pela entidade com posição dominante no mercado relevante dos milagres e do sobrenatural em geral: obviamente, que toda aquela maravilha tinha derivado de uma intervenção directa dos pastorinhos de Fátima - nem era preciso nenhum Sherlok Holmes para achar outra solução! -, assim, abrindo as portas para a tão almejada (e indubitavelmente merecida) santificação dos citados milagreiros.

Pressenti, então, a alegria no coração dos crentes, o anúncio da paz e da serenidade para todo o mundo já que, através dos pastorinhos pré-canonizados, Fátima transformava-se na beatífica cura dos conflitos da humanidade.

Mas, inopinadamente, surgem notícias que a central de Roma não anda demasiado satisfeita com a gestão do Santuário de Fátima. Problemas vários de gestão administrativa e financeira e a questão da abertura do mercado à concorrência, parecem ter aportado alguns escolhos na santa relação entre a central e a sua importante sucursal do distrito de Leiria.

Embora confiante que os citados pastorinhos estarão atentos e que a sua mediação não tardará, quis satisfazer a minha curiosidade em saber a interpretação do Valete acerca do conflito entre o Vaticano e os responsáveis pelo Santuário de Fátima.
Constatei que este ainda se encontra em estado de negação - isso não aconteceu, é invenção e tudo está em paz na indústria dos milagres e da fabricação amartelada de santos.

Mas restam algumas dúvidas - se para além dos ditames do dever de sujeição hierárquica da sua organização, o João Noronha concorda com o entusiástico extravasar ecuménico que caracteriza o Santuário nos últimos tempos?
Se a moda multiculturalista com adaptações religiosas tão cara aos ensinamentos de (S.??) Boaventura Sousa Santos (que nome abençoado!) está ou não de acordo com o severo posicionamento conservador e quase-ortodoxo que o Valete parece seguir de há um ano a esta parte?
Por último, se o conflito se vier a revelar verdadeiro, quem deverá ceder a quem - a central ou a sucursal? Centralismo ou regionalismo?