FA, no Quinto dos Impérios, referencia o meu post, concordando em parte com a análise aí feita, discordando «no essencial», por considerar «que é um erro pensar que foram só esses "povos" a votar não à Constituição Europeia». Acrescenta, ainda, que na sua opinião, «o problema (?) é que o próprio Tratado Constitucional é ele mesmo uma "Torre de Babel", a construção desenfreada de um edifício (neste caso jurídico-político) que corre o risco de se desmoronar porque lhe falta a essência (divina?) do suporte cívico».
Caro FA, a tua opinião é legítima, mas ainda assim, terás de convir que eu não retirei ao «Não» a importância que ele merece, e nem sequer o circunscrevi à França e à Holanda; aliás, no meu post salvaguardo que o «Não» tem várias motivações; assim admiti que haverá eleitores que, na ponderação do «Não», terão atendido ao conteúdo do TCE; ressalvo, ainda, que muitos terão votado «Não» por sentirem que a integração europeia estará a ser feita, na sua óptica, de uma forma pouco transparente. Com esta última afirmação, penso que irei ao encontro daquilo que referes ser um certo défice de «suporte cívico». Afirmo ainda que o facto da França, Holanda e Reino Unido terem votado «Não» fere de «morte» este TCE; eu entendo que as raízes do «Não» se estendem a todos os que, na Europa, recusam mais avanços.
Dizes que o TCE será uma Torre de Babel; parece-me bem, pois de facto a Europa não se entende em relação a este documento.
Agora, a matriz do meu post não é tanto o Tratado em si, nem o tal «edifício jurídico-político» (aspecto importante mas que não explorei minimamente) porque, para lá de todas as motivações do «Não», o que estas recusas reflectem é a incapacidade que a Europa demonstra de trilhar um caminho comum. Apesar das várias motivações que suportaram o «Não», na minha óptica, mais do que uma oposição às inovações técnico-jurídicas constantes no TCE, o que está a travar a Construção Europeia são os medos de alguns povos da Europa, a letargia e o envelhecimento, a tentativa de salvaguardar Utopias Socialistas e Proteccionistas.
Por isso penso que é importante, neste momento, que os portugueses tenham consciência que a União Europeia, hoje, representa já, para os cidadãos, um espaço de liberdade que não existiria caso estivéssemos «orgulhosamente sós». O tal «edifício jurídico político» que comparas à Torre de Babel, tem sido, a par do espírito empreendedor de alguns, a alavanca do país e fonte de algum optimismo e esperança. E o que digo não é retórica. A União Europeia é, nos nossos dias, uma comunidade política, com influência positiva sobre o nosso quotidiano; senão vejamos: Portugal vive inquieto com o défice das suas contas públicas; agora, alguém acredita que estaríamos tão preocupados com o défice, se não existisse uma entidade em Bruxelas a tutelar o nosso Estado? Alguém ignora que as medidas a tomar contra o défice seriam provavelmente outras (de desvalorização da moeda), se ainda existisse um escudo livre? E será que em Portugal alguém acha que é possível que as decisões a vinte e cinco tenham de ser tomadas por unanimidade? E que a Presidência da UE pode ser efectiva rodando de seis em seis meses? Ou que a Europa pode ter vinte e cinco faces no exercício da sua política externa? Será que as propostas que constam do TCE são assim tão irreais? Por isso, o que se está a referendar é uma maior integração e flexibilidade políticas, e não um «Sim» ou «Não» à Europa.
Paulo Rangel, na segunda-feira, nas Tertúlias do Comercial, respondia, com a clareza que o caracteriza, aos que «dizem que a UE padece de um défice democrático: o que acontece é a inversa, protege até os cidadãos contra a tirania dos seus Estados e defende os valores da democracia e da pluralidade».
E isto não é música celestial, embora o nome e «algum lirismo» do post possam merecer essa crítica. Veja-se, na linha do que aqui tem sido dito, o post de hoje do Miguel n'O Insurgente (mas que grande blog tem demonstrado ser), a propósito da decisão da Comissão Europeia de avançar com uma queixa contra o Estado Português, dada a violação das regras da concorrência no mercado dos serviços de Telecomunicações, face ao favorecimento da PT na exploração da Rede Fixa (via Dinheiro Digital).
O projecto de construção de uma União Política não se reduz a um texto constitucional. A Construção Europeia também tem os seus pecados. Mas, quem não os tem? Por isso é fundamental - para lá do ruído dos tambores e dos apitos - saber o que queremos. Não nos deixando influenciar por todo o circo mediático que se instalou em torno do «Sim» e, sobretudo, do «Não».
Rodrigo Adão da Fonseca