22.9.05
CARTAS AMERICANAS III
Meu Caro CAA,
Estou em falta para contigo, que há dias que te não escrevo nem te dou conta do estado da Pátria, o que, com os ciclópicos acontecimentos desta última semana e a estonteante velocidade com que as coisas sucedem em Portugal, é falha grave.
Digamos que desde a última carta, a Pátria submergiu ao encanto e ao charme femininos, numa torrente avassaladora de irrecusável feminilidade. Seja para que lado nos viremos, há sempre uma mulher, várias mulheres, homens parecidos com mulheres, outros que querem ser mulheres e se disfarçam de mulheres, e alguns que até já são mais mulheres do que homens.
Na Forças Armadas, por exemplo, quem põe e dispõe são elas: fazem manifestações, expõem reivindicações, dão entrevistas, enfim, pintam a manta de todas as cores possíveis e imaginárias. Imagina lá tu que, tendo o Governo proibido os maridos de sair dos quartéis em manifestação de desagrado, foram elas que avançaram, resolutas e impenitentes. Perante este verdadeiro 25 de Abril de saias, esta genuína «perturbação da ordem das Forças Armadas», o Governo, coitado, numa afirmação de máscula soberania, lá foi dizendo que se os maridos das ditas Senhoras desfilassem ao lado delas sofreriam consequências terríveis, como se fosse possível a um poder democrático impedir que as mulheres se fizessem acompanhar dos maridos, ou que homens fardados se obrigassem a prescindir da companhia de Senhoras. Nonsense, meu caro.
Também a televisão, espelho fiel da Pátria, repercutiu esta onda de imensa sensibilidade feminina. Finalmente, estreou o estupendo «Esquadrão G», um programa onde alguns homens que queriam ser mulheres ensinam outros homens que gostam de ser homens a sê-lo. Estranho? Porquê? Muito mais esquisito é vermos uma dúzia de sujeitos a serem depilados e travestidos em directo, com direito a lindas perucas, mini-saias, saltos altos e maquilhagem de qualidade. É o «Srª Dª Lady», novo programa da Sílvia Alberto e do sr. Herman José, que, também esta semana, estreou na SIC. O nome é magnífico! Que bela homenagem ao espírito marialva nacional, tão bem representado naquela música do eterno Marco Paulo (outro híper-sensvel): «uma lady na mesa, ...».
Mas o encanto e a graça femininas não seriam os mesmos sem o episódio com que encerramos a semana em grande: o regresso apoteótico da Drª Fátima Felgueiras, dois anos depois do exílio político a que se viu forçada, com direito a directos televisivos, conferência de imprensa, candidatura à Câmara, sondagens triunfais e ataques de ciúmes em directo na SIC do candidato do PS ao mesmo município. O que a Drª Fátima fez por todos nós, não tem qualificação! Graças a ela e ao bom povo que a adora («é Deus no Céu e a Drª Fátima na terra», como bem dizia uma manifestante) a bananização do continente está, finalmente, em altos e irreversíveis patamares.
Perante este cenário tão agradável, vê lá se voltas mas é quanto antes, para a Pátria que te viu nascer, onde cresceste e te fizeste homem, e deixa lá esses cowboys, que segundo ouvi dizer, andam cheios de vícios e de maus hábitos.