12.12.06
eu não trouxe a espada
Caro CAA,
Você desafiou-me para um duelo.
Mas eu não trouxe a espada, pelo que lhe concedo desde já a vitória.
Posto isto, vamos ao que interessa.###
Em relação à função do Direito Administrativo, cito e subscrevo o comentário do sanhoso ao seu post: "O Direito Administrativo nasceu da vontade do Estado se furtar à aplicação do Direito comum. O problema é que continua a ser essa a sua única função". E acrescenta: "E, de facto, há poucos exemplos de fraude intelectual que se comparem à redacção do artigo 108º do CPA".
Eu acrescentaria apenas, para suportar a minha opinião, um frase retirada do manual de Direito Administrativo que formou gerações de administrativistas em Portugal: "Está, pois certa, a doutrina de Marcello Caetano segundo a qual, neste ponto, ´não importa tanto o que está legislado, como o que é executado, isto é, os termos em que os preceitos legislativos são entendidos, acatados e aplicados na prática quotidiana (...)´". (Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. I, Coimbra: Almedina, 1988, p. 143) . Como é o Estado que executa nesta área, a lei não interessa para nada; a lei é aquilo que o Estado quer.
Quanto à questão do Direito Administrativo avant la lettre, corremos aqui o risco de nos envolvermos numa discussão acerca do sentido das palavras, como é tão ao gosto dos intelectuais portugueses. Porque, para tomar as suas palavras à la lettre, a verdade é que o Direito Administrativo só nasceu em Portugal no século XX, com Marcello Caetano, considerado o pai desse ramo do Direito.
Aquilo que é posterior à revolução liberal é o movimento de codificação do Direito, não o Direito. Quanto ao Direito Administrativo, há quem trace a sua origem ao cardeal Richelieu, no século XVII. Ora, o Marquês de Pombal (certos historiadores afirmam que ele ambicionava ser o Richelieu português), viveu no século XVIII e foi o autor de uma reforma administrativa no país (v.g., finanças públicas, universidade) - e uma reforma administrativa faz-se com leis administrativas, não com leis penais ou cíveis.
Finalmente, o Marquês de Pombal a quem eu chamei facínora. Fiquei um pouco incomodado com a sua reacção. Teria eu sido injusto?. Então, fui à procura de uma fonte que tinha a obrigação de ser isenta - a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. E ela contém de facto uma grande entrada de 13 páginas dedicada ao Marquês de Pombal, a qual termina assim: "Como caracterizou o marquês uma imensa aversão aos jesuítas, e os democratas portugueses essa mesma aversão têm tido, resulta que se viu transformado em caudilho e símbolo da liberdade o mais violento déspota da nossa história." (vol. 22, p. 355)