Direitos humanos em debate num país quase todo vermelho
Foi há algumas semanas. "A nova PDVSA (a empresa nacional petrolífera) é vermelha, absolutamente vermelha, de alto a baixo. E quem não estiver à vontade com esta orientação, deixe o seu lugar a um bolivariano". Estas palavras do presidente da holding pública e ministro da Energia, Rafael Ramirez, fizeram sensação.
Mas que o seu presidente o assuma plenamente, é colocar à luz do dia a assunção pelo Governo das instituições que deveriam depender do Estado.
Ao apoiar o seu ministro, o Presidente Hugo Chávez espetou mais uma farpa: "O Exército também é vermelho, todo ele vermelho". No frontispício da Academia Militar, em Caracas, onde Chávez fez os seus estudos, pode-se agora ler que é o "Berço da Revolução Bolivariana".
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Vermelho, quase todo vermelho também, é o Conselho Nacional Eleitoral, árbitro do escrutínio de hoje e do qual quatro dos membros são próximos do Governo. Um deputado chavista, Luis Tascon, também publicou na Internet os nomes dos adversários que pediram a convocatória de um referendo "revogatório" do Presidente Chávez, em 2004. A lista impede que os seus signatários façam carreira na função pública.
Daí a falar de perseguição na Venezuela? A oposição não o evita. O candidato Manuel Rosales evoca mesmo "os prisioneiros políticos" do chavismo. "Políticos na prisão" por terem participado no golpe de estado ou na greve petrolífera. Os seus processos são constantemente adiados e o Tribunal Supremo de Justiça, que deve julgá-los e era dominado pela oposição por 11 votos contra nove, foi reforçado com 12 novos juízes e as decisões passaram a ser favoráveis ao Governo.
Objecto de polémica no Outono de 2004, a lei de "responsabilidade social da rádio e da televisão" tinha por fim acabar com a "ditadura mediática" num país onde os meios de comunicação social privada haviam substituído uma oposição exangue.
As injúrias aos funcionários e aos eleitos - uma constante na imprensa da oposição - são agora passíveis de 20 meses de prisão, 40 quando se trata do Presidente. O que fez reagir a ONG Human Rights Watch: "As pesadas sanções que estabelece a lei constituem um mecanismo de autocensura contra a imprensa e reforçam o arbitrário da parte das autoridades governamentais". Mas bem consciente da imagem desastrosa que daria a aplicação rigorosa da lei, o Governo evita-a e as televisões baixaram apenas o tom na sua campanha anti-Chávez. Longe de um qualquer Estado policial ou de um gulag tropical, a Venezuela enfrenta na realidade o seu velho demónio: o desaparecimento da linha entre Governo e Estado. O controlo do primeiro sobre o segundo era total no tempo dos partidos Acção Democrática e Copei, que estiveram no poder de 1958 a 1994. Duas formações vilipendiadas nos discursos de...Hugo Chávez.
François Meurisse, Caracas
Exclusivo PÚBLICO/Libération