8.1.07

As estranhas prioridades dos nossos representantes políticos

De cada vez que Cavaco faz um discurso de circunstância, não há analista ou responsável político que não procure tresler linhas ou imaginárias entrelinhas; por cada causa dita fracturante que o BE agite, é ver os líderes partidários a agendarem-na de imediato, com alguns bovinamente a reboque, outros em tímida e quase penitente discordância; se trinta "artistas" sem palco nem plateia okupam o Rivoli, um simples caso de polícia transforma-se num estridente facto político nacional, a justificar a intervenção da própria ministra da cultura; as confissões de alcova de uma amante ressabiada, transformadas em best-seller, mobilizam toda a ilustre magistratura e a nossa "justiceira-mor" para uma guerra sem quartel contra a compra de árbitros, como se sabe o principal e porventura único factor de corrupção em Portugal. A tudo isto o cidadão comum assiste com um misto de indiferença e chacota, privilegiando Floribelas e outras telenovelas a temas ora maçudos, ora caricatos, que pouco ou nada o afectam.###
Entretanto, no final do ano morrem pescadores à beira da praia, mostrando a total incapacidade do Estado em cumprir a sua principal missão, a de garantir a segurança dos cidadãos. A marinha reconhece haver deficiência de meios, mas a culpa morrerá solteira sem que ninguém saiba por onde anda o ministro da defesa.

No início do ano, a empresa de transportes públicos do Porto (STCP) implementa uma mudança radical de rotas, eliminando bastantes linhas, criando outras, renumerando quase todas. Pouca ou deficiente comunicação prévia sobre as alterações e uma degradação generalizada do nível de serviço - um grande número de utilizadores passaram a ter de fazer 2 ou mais transbordos, os próprios motoristas eram incapazes de dar informações, não conhecendo sequer as paragens das novas linhas - criaram um enorme sentimento de revolta por toda a Área Metropolitana do Porto. Perante esta situação, da responsabilidade de uma Empresa Pública monopolista dependente de Mário Lino, os responsáveis políticos assobiam ostensivamente para o ar. Com as notáveis excepções dos presidentes das Juntas de Freguesia de Rio Tinto e de Lordelo do Ouro, não se tem visto autarca, deputado ou ministro que tenha manifestado a mínima preocupação e disponibilidade em resolver um problema que afecta seguramente centenas de milhares de pessoas.

Com tamanha inversão de prioridades, o país político e o país real distanciam-se cada vez mais. E mais se acentua o défice de representatividade.