9.9.05

Nem Kerry, nem Bush

A esquerda europeia tem os seus clichés, alguns respeitáveis, outros particularmente risíveis.

Aquando das eleições norte-americanas, que segui com interesse, constatei que a nossa belle gauche sofre de amores pelos democratas; o rival republicano, Bush, esse, é o alvo de todas as críticas, uma espécie de ódio de estimação que ajuda a alimentar o sentimento de superioridade do «Velho» Continente.

Ora, a grande crítica apontada a Bush pela esquerda europeia reside no facto deste ter apoiado a invasão do Iraque, e de seguir uma política «imperialista» e «unilateralista», e de defender os «lobies» do armamento e do petróleo.

Fenómeno curioso, porque se há matéria onde existe sintonia no panorama político norte-americano é precisamente ao nível do rumo da política externa.

Kerry apoiou a invasão do Iraque. Limitou-se apenas a afirmar que, caso fosse ele o Presidente, teria tentado «envolver os principais parceiros europeus» na criação de uma força multinacional mais alargada. Kerry tão pouco é a favor de uma dimimuição do esforço financeiro dos EUA no armamento.

As diferenças essenciais entre Republicanos e Democratas situavam-se, aquando das eleições, em questões de política económica, de política interna e algumas matérias de costumes (com o gay issue à cabeça); este último aspecto, onde o próprio Kerry oscilou, condenou-o irreversívelmente, ao ponto de ter ficado conhecido como «o Candidato Incoerente».

Em qualquer caso, a agenda política norte-americana está tão afastada da europeia - tão longe daquilo que é o ideário da nossa esquerda e, até, da nossa direita - que, com franqueza, ver uma certa Europa venerar os democratas, faz-me lembrar aquelas paixões onde, no meio de muito galanteio, até um nível quase rastejante, no final, o amor e tanto esforço não são correspondidos.

Eu, da minha parte, não me sinto compelido a gostar nem Bush nem de Kerry. Aliás, nem sequer me revejo nos republicanos ou nos democratas. Pessoalmente, não fulanizo a forma como vejo a América. Que tem muito mais para nos dar, a nós, europeus, do que a sua guerrilha partidária.

Rodrigo Adão da Fonseca