19.5.06

Proprietários, mas pouco

A nova lei do arrendamento, como se sabe, vai permitir aos arrendatários comprarem os imóveis que habitam, por um preço fixado administrativamente, mesmo contra a vontade do proprietário, verificados certos pressupostos.
Porém, o arrendatário, assim transformado em proprietário, não vai ter vida fácil, já que ficará, de acordo com o projecto de Decreto-Lei que aprova o «Regime Jurídico das Obras em Prédios Arrendados», sujeito a obrigações severas durante 20 longos anos, obrigações que se transmitem aos novos proprietários e que, por isso, tornarão muito difícil a venda dos prédios assim comprados. Ao congelamento das rendas, poderá seguir-se o congelamento da compra e venda das casas «expropriadas aos senhorios».
###
O arrendatário que comprar a casa ao senhorio nas situações previstas na lei:
  • Terá de iniciar obras para colocar o prédio num estado de conservação, pelo menos, médio num prazo de 120 dias;
  • Terá de manter esse estado de conservação durante 20 anos;
  • Fica limitado quanto às obras de alteração que nele pode fazer (terá de manter as «condições de ocupação análogas às anteriores para todos os ocupantes do prédio», o que quer que seja que isto significa);
  • Se vender ou doar o prédio ou se morrer, os donatários, compradores ou sucessores, respectivamente, ficam obrigados ao cumprimento dos mesmos deveres até se completarem os tais 20 anos.
Se alguma destas pessoas violar algum daqueles deveres, sujeita-se a que o antigo senhorio readquira o prédio (pelo preço que tinha antes recebido). Mas o incentivo do antigo senhorio para o fazer não será grande, já que, neste caso, será ele (ou quem lhe adquirir o imóvel) o onerado com aqueles deveres, durante mais vinte anos.
E a cereja em cima do bolo: se o antigo senhorio comprar o prédio ao abrigo da lei e violar alguma daquelas obrigações, perderá o prédio a favor do município(*). À expropriação sem justa indemnização, pode seguir-se o confisco puro e simples.
(*) Nota técnica: provavelmente, há um lapso no n.º 4 do artigo 37.º do Projecto, que se refere à "obrigação prevista no artigo anterior", quando deveria querer referir-se apenas à "obrigação prevista no n.º 1 do artigo anterior" (iniciar obras no prazo de 120 dias), o que, a verificar-se, limita a perda a favor do município aos casos de não realização de obras. A existência de tal lapso resulta de modo mais ou menos evidente do n.º 4 desse mesmo artigo 37.º.