13.1.07

até à razia total


Quando, recentemente, o Rui Albuquerque, numa série de posts bem argumentados, relançou o tema da regionalização, eu dirigi-me a ele, numa caixa de comentários, para lhe dizer que, se estava à espera que o tema tivesse algumas consequências práticas, estava, na realidade, a perder o seu tempo.###

Primeiro, porque a democracia, tal como é entendida em Portugal, coloca a igualdade à frente da liberdade, e a igualdade consegue-se com mais centralização, não com a descentralização que a regionalização necessariamente traria consigo. Portanto, a democracia é centralizadora, não descentralizadora.

Segundo, porque eu próprio me tinha envolvido durante anos numa batalha junto da opinião pública pela regionalização e tinha-a perdido. E essa batalha teve precisamente como ponto decisivo o dia em que Portugal aderiu ao Mecanismo das Taxas de Câmbio do Sistema Monetário Europeu (SME), que era o embrião da futura moeda única - o euro. Foi em Abril de 1992.

Numa série de artigos que então publiquei na imprensa, alguns dos quais estão reunidos nos meus livros Abcissas (Porto: Areal Editores, 1993) e Cataláxia (Porto: Vida Económica, 1993), eu analisei os custos da adesão. Num desses artigos, com o título Os Custos estão a Norte, escrevi que o desemprego, as falências e a emigração seriam os principais custos da adesão do escudo ao SME; previ que as indústrias têxteis, do vestuário e do calçado seriam as principais vítimas e que a região Norte, a grande distância de todas as outras, seria a região mais afectada e que ela voltaria a ser a fonte de um novo êxodo migratório que teria como destino o estrangeiro e a região de Lisboa; e concluí que a adesão representava a, prazo, um impulso considerável à centralização da actividade económica na região de Lisboa, em detrimento, sobretudo, da região Norte.

Não me enganei, embora na altura tivesse sido considerado extravagante, porque terei sido talvez o único economista a contestar a adesão do escudo ao SME e à futura moeda única. Passados 15 anos os resultados estão à vista. A região Norte atravessa uma profunda crise económica. O Porto é o distrito do país com a maior percentagem de pessoas a viver da segurança social e a cidade do Porto, segundo um estudo recente, a menos competitiva de todas as cidades portuguesas. Alguns símbolos da cidade estão a desaparecer rapidamente, o mais recente o célebre Restaurante D. Manuel, que fechou as portas há um mês. Outrora a capital empresarial do país, o Porto oferece hoje um aspecto desolador, frequentemente degradado e pobre, falho de oportunidades e iniciativas. O panorama não é diferente em outras terras do Norte do país.

Ao Norte restam hoje apenas duas instituições conhecidas a nível nacional. Uma está agora a ser o objecto de um virulento ataque por parte do poder central; a outra, tenho quase a certeza, não vai conseguir os seus intentos de comprar a Portugal Telecom. É a centralização que previ em 1992 - até à razia total.