28.6.04

ENTENDAMO-NOS!

1. Sempre votei nos partidos da direita. Ou seja, no CDS, no PSD, nas AD?s, e nos candidatos presidenciais provenientes deste espaço político. Embora não me reveja na democracia-cristã e muito menos na social-democracia, quando voto (e votei quase sempre) sou um eleitor disciplinado dos partidos do centro-direita.

2. Não simpatizo com o PS. Como, por simples dedução se poderá concluir. Muito menos com qualquer ideal socialista. Nunca votei PS, nem estive próximo de semelhante tentação. Quando o governo do Engº Guterres caiu e a direita subiu ao poder, fiquei satisfeito, porque pensei que as coisas poderiam melhorar.

3. Tenho em boa conta o Dr. Santana. Quer pessoal quer politicamente. Ele faz parte de um raro número de políticos que não esconde a sua vida privada e vive-a, no seu pleníssimo direito, como bem entende. Se se deita cedo ou tarde, sózinho ou acompanhado, se vai a discotecas ou não, se gosta muito ou pouco de mulheres, a política nada tem que ver com isso. E, sobretudo, não dissimula, nem engana ninguém. Com ele, a máxima «vícios privados, públicas virtudes» não terá nunca aplicação. Politicamente, considero-o um homem corajoso, que gosta de ir à luta. Que arrisca e ganha. É bom.

Dito isto, entendamo-nos no seguinte:

1. Uma eleição legislativa é um contrato social que envolve duas partes: os eleitores e os eleitos. Estes pedem votos em troca de compromissos assumidos. Aqueles votam em quem mais confiam. Trata-se de uma relação quase pessoal, de confiança recíproca. No sistema político português, onde cada vez mais se vota com o sentido de eleger o primeiro-ministro, trata-se de uma relação contratual entre o candidato a essas funções e os seus eleitores;
2. Ao renunciar ao cumprimento integral desse contrato, o Dr. Durão Barroso há-de ter ponderado, pelo menos, dois aspectos: o seu interesse pessoal e o interesse nacional. Quanto ao primeiro, não há comentários a fazer. É assunto que lhe pertence por inteiro, a si e à sua consciência. Quanto ao interesse nacional há, pelo menos, uma evidente conclusão a tirar: o primeiro-ministro português considera mais importante o interesse supranacional comunitário do que os interesses nacionais portugueses. Terá, eventualmente, razão, dada a globalização em que vivemos e o alto grau de integração comunitária em que nos encontramos. Mas é bom que isto fique claro: para Barroso, a Europa está primeiro. Senão, como é evidente, deixar-se-ia ficar por cá.
3. É, também, bom que se compreenda que, ao invés do que por aí se diz, Barroso não irá representar Portugal na Comissão Europeia, nem defenderá lá os seus interesses. A Comissão é, por excelência, a instituição supranacional da União Europeia, o que quer dizer, usando linguagem de leigos, que quem lá está defende os interesses comuns e não os dos Estados a que pertencem. O Presidente da Comissão, mais do que todos, deve representar esse espírito, e não é raro assistirmos a decisões suas contrárias aos interesses do seu país.
4. São igualmente legais e constitucionais quer a nomeação de novo primeiro-ministro indicado pela maioria parlamentar, quer a dissolução da Assembleia da República. O Presidente da República poderá optar livremente por qualquer das duas sem fugir à Constituição.
5. Mas, nem tudo o que é legal e constitucional tem de ser, forçosamente, legítimo. A natureza do sistema político em vigor, e a realidade dos factos, levam-me a crer que o Chefe de Estado entenderá mais legítima uma solução que permita aos portugueses pronunciarem-se, a muito curto prazo, sobre o futuro do país. Isto quer dizer, que deverá convocar eleições legislativas antecipadas.
6. Não acredito que o Dr. Santana Lopes, dada a sua natureza, aceite ser o Dr. Balsemão do Dr. Barroso, ou seja, aceite receber o poder sem o disputar. No PSD e no país. Menos ainda, quando o seu nome começa, cada minuto que passa, a dividir em vez de juntar. O Dr. Lopes sabe que, se aceitar o poder deste modo, ficará refém do Presidente da República, e que se arrisca a cair nas próximas eleições autárquicas. Irremediavelmente e sem recuperação possível.
7. Era o que mais faltava que, no fim disto tudo, caso o PS volte ao poder (o que me parece bem provável), se responsabilizem os eleitores e não quem faltou aos compromissos que assumiu. Quaisquer que sejam as razões, trata-se sempre de uma decisão individual, da responsabilidade completa de quem a toma. A política, como a vida, tem destas coisas.