Sete horas, ainda de noite. Bateram à porta. Sem medo, ainda meio estremunhado, abro. Três vultos. O primeiro diz:
- "Polícia Judiciária de Leiria. Temos um mandado de busca da sua residência".
Franqueio a porta. Entram dois agentes e um procurador-adjunto. Mostram-me o mandado de busca domiciliária, assinado por um juiz, às minhas residências (sic) e veículos (o meu carro e outro que vendi há oito anos).
Contam-me depois que, à mesma hora, dois agentes batem à porta da casa da minha mãe, septuagenária. Perguntam-lhe se ela é minha mãe e identificam-se. Minha mãe informa que aquela não é a minha residência desde há 11 anos, mas os agentes prosseguem. Efectuam uma busca a todas as divisões da casa, inclusivé as casas de banho. Vêem um computador velho, sem ligação à Internet, no quarto de hóspedes e hesitam. Telefonam para alguém e acabam por o levar. Esses dois agentes juntam-se, depois, aos outros e ao procurador-adjunto em minha casa.
Pedem-me documentação relacionada com o processo da Casa Pia. Reúno alguns papéis e vou abrir o computador para lhes mostrar as pastas onde guardo o que edito. Fecham-no de imediato e justificam-se com a existência de comandos que permitem a formatação do disco rígido... Dizem que têm ordens para apreender o computador (o corpo do delito?...) - não apenas o disco rígido. No computador, instrumento do meu trabalho de professor, vai a minha tese de doutoramento, lições, exames, notas, documentos profissionais e pessoais, correspondência...
Respeitam a intimidade do meu quarto onde minha mulher se arranja, bem como do quarto dos meus filhos, que, entretanto, surgem preocupados. Creio que as crianças nunca mais se irão esquecer deste episódio. No entanto, os agentes e o procurador adjunto têm uma atitude cordial e parecem muito profissionais. Fazem o serviço que lhes foi cometido.
Pretendem conhecer a origem de alguns papéis. Respondo que foram coisas que me surgiram. O procurador-adjunto solicita-me, após ler os meus direitos e deveres processuais que assine um documento de constituição como arguido e outro com o termo de identidade e residência.
São-me imputados factos susceptíveis de integrar a prática do crime de desobediência simples, p. e p. pelos artigos 348.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, ex vi do disposto no artigo 88.º, n.º 2, alínea a) e 3, do Código de Processo Penal. Sou ouvido esta sexta-feira no tribunal.
Aconselhado, comprei outro computador. Espero que não mo levem...
Cumpro a lei. Escrevo sobre esta questão do Estado, em defesa do meu País e da democracia.
28.10.04
Autor do Blog Do Portugal Profundo visitado pela PJ
Cópia de um post no Portugal Profundo: