21.2.06

Colectivismos penais

A deputada Ana Drago quer que a violação do segredo de justiça por jornalistas resulte em sanções penais (penas de multa) para ?as empresas jornalísticas? e não, como sucede actualmente, em penas que recaem sobre os próprios autores do crime (admitindo que o crime possa ser praticado por estranhos ao processo, como são os jornalistas enquanto tais, o que não é pacífico entre a doutrina penal).
A Lei de Imprensa prevê, actualmente, a co-responsabilização penal e civil do director, subdirector ou editor que não se tenha oposto à prática de um crime através da imprensa (incluindo, eventualmente, o crime de violação de segredo de justiça). E bem o faz, pois estes têm efectiva possibilidade de controlar aquilo que é publicado.
?A empresa jornalística? (ou a respectiva administração), porém, apenas nomeia e destitui o Director. Para além deste controlo indirecto, nenhum peso tem naquilo que é ou não publicado. E ainda bem que assim é, também.
Se a proposta da deputada do BE viesse a ser acolhida, naturalmente que a administração da ?empresa jornalística? passaria a querer controlar previamente aquilo que é ou não publicado, por ser essa a única forma de evitar a responsabilização penal da ?empresa?. A admissibilidade de tal controlo seria, aliás, a única forma de imputar à ?empresa? qualquer espécie de ?culpa? pela publicação de matéria objecto de segredo. E a culpa, ainda que ténue, tem sido pressuposto indispensável à aplicação de qualquer pena.
É verdade que o artigo 29.º da Lei de Imprensa prevê a responsabilização, em certos casos, da empresa jornalística pelo material publicado («No caso de escrito ou imagem inseridos numa publicação periódica com conhecimento e sem oposição do director ou seu substituto legal, as empresas jornalísticas são solidariamente responsáveis com o autor pelos danos que tiverem causado.»). Mas trata-se aqui de responsabilidade civil (pelos danos causados a terceiros). Há uma substancial diferença entre as duas situações. Aqui (responsabilidade civil) a co-responsabilização sempre se poderá justificar com o interesse da vítima numa posição mais confortável, designadamente nos casos em que o jornalista não tenha ?eira nem beira?. Acolá de nada serve à vítima (quem é ela, aliás, na violação do segredo de justiça?) haver mais um arguido. Ao jornalista também não e à liberdade de imprensa ainda menos.