25.2.07

Autoridade


O Vasco Pulido Valente, depois de denunciar hoje no Público o "liberalismo diletante e teórico, que por aí anda (...)", conclui: "Os velhos vícios portugueses não se curam com exortações. Se por acaso são curáveis, são curáveis com uma boa dose de liberdade e responsabilidade (...)".
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O apelo à responsabilidade - porque é, na realidade, de um apelo que se trata - é uma exortação. E a fórmula da "liberdade e responsabilidade" é um diletantismo: tomem lá a fórmula que eu vos dou e agora apliquem-na.##
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Nós reconhecemos liberdade às pessoas para que elas cumpram as suas responsabilidades. O problema é que muitas delas utilizam a liberdade, não para cumprirem as suas responsabilidades, mas para as evadirem e, se puderem, para as passar para cima dos outros - e o crescimento do Estado-Providência, que é a fonte das maiores dificuldades da sociedade portuguesa actual, está aí para servir de testemunho.
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A solução não está, portanto, na fórmula "liberdade e responsabilidade" porque essa é, na realidade, não a solução, mas a causa de todos os problemas. Todos querem a liberdade, mas muito poucos querem a segunda parte da equação- a responsabilidade. A questão está em como assegurar que cada homem assume a sua responsabilidade de viver.
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Num post recente, em resposta a uma solicitação de um comentador, enumerei dez factores que, na minha opinião, tinham feito do regime do Estado Novo um período de grande progresso económico e social. Esses dez factores poderiam existir sob um regime ditatorial - como foi o regime de Salazar - ou sob um regime democrático, e eu ainda alimento a esperança, embora cada vez menor, que possam existir sob um regime democrático.
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Entre esses dez factores, indiquei o sentido de Estado dos governantes, bem como o respeito que as instituições do Estado recebiam da generalidade da população. Salientei, também, o facto de o Estado Novo ser uma pessoa de bem nas suas relações económicas e contratuais, e a forma como o seu exemplo tinha passado a toda a população sob a forma de uma verdadeira cultura.
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Nessa enumeração, evitei sempre utilizar uma palavra que eu sabia ser impopular, mas que resumiria muito do que então escrevi - autoridade. Utilizo-a agora. O Estado Novo foi um Estado forte, ainda que pequeno, e sob ele Portugal prosperou como em poucos períodos da sua história, porque transpirava autoridade, a começar pela própria pessoa de Salazar.
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Como procurei argumentar noutro post, o ideal de uma sociedade liberal é aquele em que todas as pessoas cumprem as suas responsabilidades para com os outros e para consigo próprias. Como não é difícil imaginar, esta sociedade seria imensamente próspera do ponto de vista económico, teria poucas desigualdades sociais e seria abundantemente pacífica.
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Mas enquanto não atingimos esse ideal - o de que todas as pessoas cumpram as suas obrigações para com os outros e para consigo próprias -, aquilo de que nós precisamos não é de mais liberdade e de mais exortações à responsabilidade, como sugere o VPV. Aquilo de que nós mais precisamos é desse meio - a mais importante tecnologia - que permite realizar a liberdade: a autoridade. E para não parecer diletante, eu tenho de confessar que não sei como restaurar o valor da autoridade na nossa sociedade democrática.