A grande discussão e o que mais levanta dúvidas, receios e susceptibilidades quanto ao futuro da União Europeia, diz respeito ao processo de decisão.
Compreende-se. Tal matéria, como por muitos já foi demonstrado, poderá colocar em causa a capacidade de os Estados conseguirem defender os seus interesses num conjunto de Estados onde a formação de maiorias e minorias de bloqueio de forma antagónica. Em alguns casos os grandes Estados não estarão dispostos a terem de suportar financeira e politicamente, políticas que lhes sejam contrárias. E os pequenos Estados não aceitarão hipotecar as suas hipóteses de uma forma definitiva, sem hipóteses de defenderem os seus interesses contra maiorias impossíveis de serem bloqueadas.
Contudo, este dilema não é original e já foi resolvido pela teoria política há 215 anos.
Leia-se:
“Já dei a entender que, quando se desejou estabelecer a Constituição federal, foram postos em presença dois interesses opostos que deram por sua vez origem a dois pareceres diferentes.
Uns desejavam que a União fosse uma Liga de estados independentes, uma espécie de Congresso em que os representantes dos diferentes povos discutissem alguns temas de interesse comum.
Outros queriam reunir todos os habitantes das antigas colónias num único e mesmo povo e atribuir-lhe um governo que, apesar de possuir uma esfera de actuação limitada, pudesse contudo agir, dentro desses limites, enquanto único e exclusivo representante da nação. As consequências práticas destas duas teorias eram muito diversas.
Ou seja, caso se organizasse uma liga e não um governo nacional, caberia à maioria dos Estados, e não á maioria dos habitantes da União, fazer a lei, pois cada Estado, grande ou pequeno, conservaria então o seu carácter de potência independente e entraria na União em pé de igualdade perfeita com os restantes.
Se, pelo contrário, se considerasse que os habitantes dos Estados Unidos formavam um único e mesmo povo, seria natural que só a maioria dos cidadãos da União fizesse a lei.
Compreende-se que os pequenos Estados não pudessem consentir na aplicação desta última doutrina sem abdicarem completamente da sua existência no que à soberania federal dizia respeito, pois, de potências co-reguladoras passariam a fracções insignificantes de um grande povo. O primeiro sistema ter-lhes-ia concedido um poder excessivo; o segundo anulava-os.
Neste estado de coisas, aconteceu o que acontece quase sempre quando os interesses se opõem aos raciocínios: vergaram-se as regras da lógica. Os legisladores adoptaram o meio termo que conciliava a força dos dois sistemas teoricamente inconciliáveis.
O princípio da soberania dos Estados triunfou na formação do Senado e o dogma da soberania nacional na composição da Câmara dos Representantes".
Alexis de Tocqueville, “Da Democracia na América”
Interessante observar como no século XVIII, os constituintes apenas tinham presente aqueles dois modelos.
No entanto a Europa de raiz totalitária, conseguiu engendrar uma “terceira via” não-democrática, pela qual os Estados não são soberanos, uma vez que se sujeitam a aceitar decisões nas quais o poder de cada Estado é desigual e, por outro lado, tão pouco se respeita o princípio demográfico, mediante o qual a maioria dos cidadãos deveria assumir o controle político.
Tentam-se cozer "originalmente" os dois princípios, criando formulas matemáticas absurdas e desvirtuando completamente os dois princípios de soberania e de democracia. Criam-se realidades e soluções virtuais, apenas ao sabor das circunstâncias de curto prazo. Que não se duvide: no dia quem que alguma decisão tocar interesses “vitais” de alguém poderoso, muda-se a lei. E isso é o contrário da democracia e o princípio da tirania da força.
Já aconteceu com o PEC....