10.7.04

O SISTEMA

A actual crise política demonstrou à evidência a necessidade de debate e subsequente reforma do sistema político.
Já há alguns contributos, como o JPH,Filipe Moura e André Abrantes

Desde o início (1976), o sistema semi-presidencialista revelou-se fonte de conflitos. O que só poderia acontecer com o modelo então desenhado: uma dupla legitimidade popular do Parlamento e do PR. Este sistema partiu do princípio da dificuldade ou mesmo quase impossibilidade de desenho de maiorias absolutas no Parlamento. Daí a então visão do papel intervencionista, mediador e vigilante do PR. Acontece que os cidadãos e os partidos foram procurando soluções que vencessem essa menoridade do Parlamento e desenharam soluções estáveis, de legislatura . Primeiro com a AD, depois com Cavaco e agora com Durão.
Esses momentos de estabilidade parlamentar provocaram por seu turno instabilidade no outro orgão eleito, o PR. Uma vezes tentado a usar a sua legitimidade política (Eanes e Soares) ou numa perspectiva mais conservadora e parlamentarista, deixando este funcionar por si (Sampaio, até agora). No entanto, como ontem se ouviu, até este PR (e julgo que tal decorre do próprio desenho constitucional do cargo), não pôde deixar de interferir com a legitimidade própria do Parlamento ao estabelecer condições que se inserem nunma visão intervencionista e de legitimidade própria e directa do PR.

A existência da dupla legitimidade parlamento/presidente será sempre fonte de conflitos. Agravados sempre que exista uma maioria parlamentar, pois nesses casos, como se viu, instituiu-se um governamentalismo no qual os líderes partidários ´como candidatos a primeiro-ministro, assumem, informalmente, uma legitimidade igual à do PR, embora formalmente seja inferior á do próprio parlamento uma vez que o seu poder dele deriva.

Chegados a este ponto, creio ser a altura de seriamente se reflectir e optar claramente por um dos sistemas puros: parlamentar ou presidencialista (como aliás já por mais de uma vez se defendeu neste blog e respectivas pré-origens).

O sistema presidencialista nunca poderia ser o francês, no qual continua a existir a dupla legitimidade, permitindo essa aberração que é a co-habitação: uma maioria parlamentar diferente da que elegeu o PR. tendo este igualmente poderes executivos.

O sistema presidencialista a ter em conta deveria ser aquele em que o PR é eleito directamente e a quem é confiado o poder executivo, sendo totalmente independente do orgão legislativo, o Parlamento. Nenhum dos dois poderes poderia anular ou interferir com o outro.

No sistema parlamentar, o governo emana directamente do Parlamento e responde apenas perante este. O Chefe de Estado é uma figura protocolar com poder apenas para assinar leis e marcar a data das eleições.
Naturalmente em tal sistema apenas poderia vigorar a eleição uninominal dos deputados como forma de expressarem directamente a vontade dos eleitores e de por estes serem responsabilizados e avaliados. Se se mantivesse o actual iníquo sistema de eleição em lista, teríamos não só a presidencialização da figura do primeiro-ministro como não haveria qualquer forma de controle sobre o mesmo, ao manter-se o actual sistema de deputados paus-mandados.

Obviamente, tendo em consideração a tradicional cultura portuguesa de adoração de figuras paternalistas/caudilhistas que tanto mal e abuso originaram ao longo de 8 séculos, prefiro de longe o sistema parlamentar puro.