14.10.04

A regulação reduz o pluralismo

Escreve Vital Moreira:

No entanto, o pluralismo interno também se deve considerar imperativo para os meios de comunicação privados como as televisões de sinal aberto, visto que utilizam um bem público (o espectro hertziano) mediante uma licença pública, desde logo porque o seu número é muito limitado e não existe liberdade de criação de novas estações.


1. Primeiro temos que perceber porque é que não existe liberdade para criar mais canais. Trata-se de uma limitação física do espaço radioelectrico, ou de uma limitação política à existência de novos canais?

2. Creio que se trata de uma limitação política. Tanto quanto julgo saber, a tecnologia actual permite mais um canal, o tão falado canal regional.

3. Mesmo que não permita, a frequência do canal 2 poderia ser redistribuída por uma dezena de canais regionais. Estes canais regionais poderiam passar simultaneamente no cabo, permitindo-lhes um alcance nacional.

4.O pluralismo possível num sistema de canais regionais é muito superior ao pluralismo possível com um canal nacional. Logo, os limites ao pluralismo são políticos e não físicos.

5. Mas esta já é uma questão do passado. A Televisão Digital pemitirá em breve a existência de pelo menos 20 canais nacionais. Se alguns destes canais forem alocados a canais regionais, o número de canais possíveis pode chegar aos 50 ou aos 100.

6. 20 canais são mais que suficientes para garantir o pluralismo dentro do sistema de canal aberto.

7. Mas o pluralismo tem vindo também a ser garantido por outros meios de comunicação como a internet, a rádio, o satélite e a TV-Cabo. Poucas são hoje as pessoas realmente interessadas que não têm acesso a meios de comunicação alternativos.

8. Actualmente já se fala na transmissão de sinal de TV pela rede de cobre, o que permitiria o alargamento significativo das zonas com TV-cabo.

9. Os desafios que se colocam à nossa frente não são técnicos mas políticos.

10. O estado e muitos dos especialistas continuarão, por razões políticas, a defender as soluções do passado.

11. Vital Moreira defende, como não podia deixar de ser, o controlo público das televisões privadas através de um regulador.

12. O que, mesmo sem mais canais de televisão, é uma solução que prejudica o pluralismo.

13. Nós já temos 2 televisões públicas altamente condicionadas que, em assuntos políticos, tendem a reflectir as posições do governo, ou, na melhor das hipóteses, a composição da Assembleia da República, e não as preferências do público.

14. Isto acontece porque os reguladores e as regras de regulação tendem a reflectir as preferências de quem os escolhe. Neste caso, a Assembleia da República.

15. Ora, os órgãos de comunicação social privados tendem a ser anti-poder, porque reflectem as preferências de quem lá trabalha e, muito importante, as preferências das audiências.

16. Se as regras aplicáveis aos canais públicos passarem a ser aplicadas aos privados, teremos mais do mesmo cinzentismo. As televisões privadas deixarão de ser controladas pelas audiências (ou seja, pela maioria dos telespectadores que tornam económica a emissão de televisão em canal aberto) e passarão a ser controladas pelos mesmos reguladores que já controlam as televisões públicas. O pluralismo diminui.

17. Num sistema em que o regulador é forte, dificilmente poderemos ter Miguel Sousa Tavares, Marcelo Rebelo de Sousa ou António Barreto na televisão porque eles não são representativos de nenhum grupo de dimensão significativa. Representam-se a sí próprios e às suas ideias.

18. Um programa político numa televisão regulada não tem espaço para independentes. Tem que ter um representante do PSD, outro do PS, outro do PCP, outro do PP e outro do BE.

19. E, claro, toda esta ênfase na regulação acabará por ser mais um incentivo para os poderes públicos criarem escassez artificial limitando politicamente o acesso aos media. Para que serve uma autoridade reguladora num sistema com 100 ou 200 canais de televisão?

20. Em resumo:uma televisão livre é melhor do que uma televisão regulada porque uma televisão livre tenderá a ser controlada pelas preferências do público enquanto que uma televisão regulada tenderá a ser controlada pelos políticos.