É supostamente consensual e politicamente correcta e dá pelo nome de limitação de mandatos. A lógica que lhe subjaz é a mesma que aqui denunciei e que António Barreto há dias muito bem explicitou no Público: o centralismo dos directórios partidários.
Neste País, quando se constata que as Instituições não funcionam, geralmente por deficiências inerentes ao próprio sistema, não se altera este introduzindo-lhe maior simplificação e transparência mas, em nome destes nobres princípios e de outros como o da "renovação" da classe política, aumenta-se-lhe a complexidade com mais regulamentos.
A questão de fundo é tão só esta: faz sentido limitar o leque de escolhas dos eleitores vedando, de forma administrativa, a possibilidade de alguns serem eleitos? E tem lógica meter no mesmo saco os executivos camarários, directamente eleitos, com o primeiro ministro e os presidentes dos governos regionais que emanam das respectivas Assembleias?
O nosso sistema tem, em teoria, mecanismos de controlo que permitem derrubar executivos camarários, regionais ou central pela aprovação de moções de censura nos respectivos parlamentos. O executivo derrubado pode depois recandidatar-se e vencer de forma ainda mais destacada como aconteceu com Cavaco em 1987, mas isso só mostra que pode haver divergências entre o povo e os seus representantes. Todos os "dinossauros" e "populistas" que se vão eternizando e contra os quais se pretende agora regulamentar têm vindo a ser sucessivamente sufragados pelo respectivo eleitorado. Pretende-se agora corrigir as "más escolhas" deste, impedindo que as repita em nome de objectivos inatacáveis como o controlo da corrupção - onde pára a justiça? - ou o desejável rejuvenescimento da classe política. A diferença entre uma tal postura e o que Vasco Gonçalves e Rosa Coutinho defenderam há 30 anos a propósito das eleições constituintes, reside apenas na clareza e na frontalidade, com clara vantagem para estes dois "camaradas". Em qualquer dos casos, a mensagem é idêntica: o povo é sempre estúpido e deixá-lo escolher pode tornar-se perigoso.
A presidência americana será porventura o único caso em que minimamente se possa compreender - mas nunca aceitar - a limitação dos mandatos. Neste sistema, o presidente, detentor de legitimidade eleitoral, não pode ser demitido pelo Congresso, salvo em condições muito especiais e judiciais. Em Portugal, pretende impor-se a limitação de mandatos a órgãos que não são directamente eleitos, casos do primeiro ministro e dos presidentes dos governos regionais, e numa altura em que se prepara uma alteração da lei eleitoral autárquica em que os executivos camarários passarão a sair dos eleitos para as assembleias Municipais. Maior confusão e promiscuidade entre diferentes poderes é difícil, mas é algo adaptado a um melhor controleirismo por parte dos aparelhos partidários. Pior ainda, estamos perante uma legislação feita para ser contra alguém, concretamente contra Jardim, como o PS já não consegue disfarçar.
Parafraseando o CN, precisamos de menos política e mais representação civil onde os lideres são naturais, enquadrados na adesão voluntária a códigos comuns decididos por residentes e proprietários e não por uma massa anónima de votos que em aparência parece legitimar que o centralismo democrático decida sobre tudo o que ocorre debaixo do sol e da lua. Isto não acontece enquanto não se instituírem primárias a todos os níveis, algo de que as nomenklaturas partidárias não querem ouvir falar.